Por Amanda Munhoz e Rafael Diverio
Foi meia hora de loucura, intensidade, atrevimento, sangue quente e uma dose de azar. A estreia de Lucca pelo Inter, contra o Cruzeiro, foi tão empolgante para torcedores e analistas que se cogita até que possa ser titular neste domingo, quando o time enfrenta o Flamengo, no Maracanã. E isso que a vaga que abriu é de volante, com a lesão de Edenilson. O atacante, emprestado pelo Corinthians até o final do ano, em uma transação que envolveu a ida do centroavante Roger para São Paulo e uma compensação financeira aos gaúchos, apresentou características importantes diante de um Beira-Rio nervoso porque o gol não saía e transformou o chove-não molha do primeiro tempo em uma pressão de 15 escanteios e 15 finalizações do segundo.
Naqueles 30 minutos, Lucca arriscou de fora da área e carimbou o travessão. Em um bate-pronto, obrigou o goleiro Rafael a fazer um milagre. Tentou driblar três adversários. Conseguiu. Teve nove disputas. Ganhou seis. Levou cartão amarelo por discutir com o juiz depois de sofrer uma falta e pedir cartão ao agressor.
Na sexta-feira, o jogador recebeu GaúchaZH no CT Parque Gigante, depois do treino fechado. Obviamente, não revelou se vai ser titular contra o Flamengo. Mas não fugiu das perguntas. A primeira, é claro, foi: o Lucca joga sempre assim?
— É cedo ainda — respondeu, sorrindo. — A gente tem de pensar sempre em evoluir. No primeiro jogo, pude me movimentar bem. Foi legal, espero que continue assim. Minha característica é essa. Procuro definir a jogada o mais rápido que puder, acelerar o jogo, arriscar. Às vezes a gente acerta.
A personalidade ousada foi moldada em Tocantins, para onde se mudou um ano depois do nascimento, em Alto do Parnaíba, cidade do Maranhão. Começou a jogar bola no Palmas Futebol e Regatas, um clube próximo a sua casa. Passou pelas categorias de base e, aos 17 anos, assinou o primeiro contrato profissional. Pouco depois, conseguiu um contrato no Ituiutaba (hoje Boa). De lá, seguiu para o Criciúma, ficou cinco anos. Começou uma peregrinação: Chapecoense, Cruzeiro, novamente Criciúma, Corinthians, Ponte Preta, Corinthians e, agora, o Inter. Nessas idas e vindas do futebol, conheceu a mulher no interior catarinense, teve uma filha, comprou uma casa em Criciúma e, segundo ele, "a vida tomou um rumo". A família o acompanha nessa jornada atrás da bola, as duas estão em Porto Alegre, adaptando-se ao Rio Grande do Sul. Contam com a ajuda de Uendel e Pottker, dois amigos dos tempos de Ponte Preta para facilitar.
A curiosidade é que a chegada à Capital poderia ter sido muitos anos atrás. Lucca fez um teste nas categorias de base do Grêmio. Mas por aquelas coisas que acontecem com os guris, acabou dispensado.
— Disseram que eu era magrinho. Sempre fui um cara com porte físico menor, nunca tive essa tendência de ser muito forte. Sou assim. Se tem o lado ruim, o outro é que me deixa mais ágil. Faz parte, não tem problema. Optaram por outros jogadores. Isso acontece com todo mundo — comentou.
E poderia ter sido antes, em 2017. Lucca foi sondado pelo Inter, chegou a abrir negociação, tentou buscá-lo, mas o atacante conversou com o empresário e optou pela Ponte Preta. Se individualmente teve um ano bom, para o clube de Campinas, a temporada acabou com o rebaixamento. Em uma daquelas partidas na campanha do Brasileirão, um vídeo de Lucca motivando os companheiros viralizou. Aos gritos, pede que os colegas corram, esforcem-se, dividam, disputem.
— Costumo observar mais, conhecer as pessoas primeiro para depois poder falar alguma coisa. O que tem naquele vídeo aconteceu nauralmente, não planejei nada, não ensaiei nada. Vínhamos de um jogo difícil, enfrentaríamos o Corinthians e, se não vencêssemos, seria difícil de reverter a queda. Achei que poderia ajudar. As coisas foram saindo naturalmente, passar aos meus companheiros — explicou.
O perfil de liderança o acompanha e chegar a um clube que já tem alguns caciques no vestiário, como D'Alessandro, Danilo Fernandes, Rodrigo Dourado, Uendel, Cuesta e Pottker não preocupa. Segundo Lucca, há uma imagem externa de D'Alessandro ser um jogador esquentado, difícil de lidar.
— Vários amigos ligaram perguntando como era, porque assusta a forma como ele entra em campo. Que nada. É um cara tranquilo, de trato fácil. Dentro do campo, sim, se transforma. Mas para o nosso bem, pensando no Inter — revelou.
A força do grupo, segundo ele, pode render bons frutos dentro do Brasileirão, o único campeonato que restou ao time até dezembro. Uma situação semelhante à do Corinthians, campeão do ano passado, que, eliminado da Copa do Brasil, dedicou-se exclusivamente à competição nacional. Apesar da similaridade dos casos, Lucca evita comparações. Segundo ele, há diferenças nas filosofias dos treinadores e no perfil dos jogadores. Por isso, não quis projetar qual lugar o Inter pode ocupar ao final do torneio. Para ele, a experiência dos atletas vai ajudar a crescer.
O atacante não fugiu do assunto Gre-Nal. O clássico da quinta rodada, sábado, 12 de maio, na Arena, já habita o imaginário:
— Já me falaram que a semana antes do Gre-Nal é tensa. Rivalidade tem em todo lugar, e aqui é muito grande, mas temos de saber lidar com a situação. Entrar em campo da melhor maneira possível. É um jogo de esforço muito grande, em que o psicológico influencia muito.
Por isso mesmo, Lucca aguarda o clássico, sem desligar do Flamengo. Serão duas partidas com casa cheia, pressão e sacrifício. Inclusive na marcação. Por uma vaga no time, o jogador garante: pode perseguir o lateral adversário até a linha de fundo se Odair quiser. Tudo para transformar aquela meia hora em mais centenas de minutos pelo Inter.