Se a distância percorrida pelos jogadores do Inter em cada partida da Série B fosse feita no mesmo sentido, seria possível que eles fossem do Beira-Rio até Nova Petrópolis. Em média, a equipe circula 100 quilômetros a cada 90 minutos de jogo. O número está dentro do padrão europeu de alto rendimento, o que, obviamente, não configura semelhança no desempenho. Mas ajuda a explicar alguns resultados recentes.
Veio de Guto Ferreira o alerta. Na última entrevista coletiva, o treinador colorado informou que o time vinha até correndo menos do que algumas rodadas atrás. Citou que a partida em que o time mais precisou se deslocar havia sido contra o Luverdense, quando a vitória por 1 a 0 ocorreu após um gol aos 48 minutos do segundo tempo.
De fato, os 110 quilômetros preenchidos pelos jogadores naquele dia contrasta com o 1 a 0 sobre o Brasil-Pel de segunda-feira, quando, mesmo com um homem a menos durante quase um tempo inteiro, circulou 92 quilômetros.
— É a prova de que os dados numéricos que o GPS nos oferece só têm valor se forem confrontados com algum aspecto qualitativo, como modelo de jogo, desempenho e outros aspectos subjetivos técnico-táticos. A performance do time é coletiva, o desempenho individual pode ser analisado com base em parâmetros físicos, nunca de maneira isolada, especialmente, tratando-se de um esporte coletivo, disputado em um ambiente de incertezas como é o futebol — explica o coordenador de performance do futebol do Inter, Elio Carravetta.
Essas informações são compiladas graças ao equipamento que atletas usam em treinos e jogos. É aquela malha vestida por baixo da camiseta. Lá, há um aparelho que mede distância percorrida, metragem em alta intensidade (acima de 24km/h), número de piques, entre outros.
— A simples ocupação de espaços é um dado frio. As ações de alto rendimento e a capacidade de repetir essas ações ajudam a ter um entendimento melhor. O que o dado dos quilômetros percorridos apresenta de fato é que a equipe está pronta fisicamente para vencer um jogo nos acréscimos, se precisar — analisa o preparador físico da Seleção Brasileira, Fábio Mahseredjian.
Portanto, mais do que destrinchar as informações do GPS pela questão puramente física, o ideal é incluir aspectos do jogo nesta avaliação. Como muitos clubes mantém esses dados em sigilo, utilizaremos os que são públicos, disponibilizados por competições como a Liga dos Campeões e o Campeonato Alemão.
Na Champions, Barcelona e Manchester City sobraram nas duas primeiras rodadas. Os dois venceram seus adversários tendo maior posse de bola e não sofreram gols contra Juventus e Sporting (no caso espanhol) e Feyenoord e Shakhtar (no caso inglês). Na Bundesliga, o Dortmund tem 19 pontos em sete jogos — seis vitórias e um empate. A comparação com o Inter, obviamente, não é pela qualidade. Mas pelos resultados, já que todos eles (repetimos, guardadas as óbvias proporções) lideram as competições que disputam.
E os dados apresentados trazem números contrastantes. Enquanto, para obter os 100% de aproveitamento, o Barcelona correu em média 93 quilômetros, o Manchester City, para chegar ao mesmo número, circulou 112 quilômetros. Ainda que o resultado final seja idêntico, há uma clara diferença de desempenho, estratégia de jogo e modelo.
— Esses dois casos são ótimos para analisar os times. Se pegarmos o Barcelona, temos a elite técnica do futebol mundial, com Messi, Suárez e Iniesta. Eles já carregam um entrosamento anterior, tanto que agora estão buscando adaptação sem o Neymar. Mas ainda são capazes de decidir o jogo em lances individuais combinados. Já o City, pela característica do (técnico Pep) Guardiola, pede uma movimentação mais intensa do meio para a frente — comenta o auxiliar técnico da Seleção, Cléber Xavier.
O homem de confiança de Tite apresenta uma informação importante. Normalmente, os times que correm mais são aqueles que não têm a bola ou os que estão em desvantagem no placar. Foi o caso de Inter x Luverdense, quando a vitória saiu no último lance. O gol cedo, diz Cléber Xavier, tranquiliza o time e possibilita executar melhor os movimentos.
No caso colorado, Guto Ferreira elogia a movimentação de seus comandados:
— O time tem corrido bem. Correr muito não é correr errado. Quando o adversário tem marcação baixa, você tem que se deslocar para abrir os espaços. Se tiver pouca mobilidade, o adversário tem mais facilidade para se fechar. O Manchester City, por exemplo, propõe muito jogo, tem alto índice de deslocamento. A Alemanha na Copa também. O Barcelona, por exemplo, hoje não é uma equipe tão móvel como era no tempo do Guardiola.
Treinadores consultados explicaram que o time ideal consegue o melhor desempenho com o menor esforço, até porque precisa de recuperação em curto espaço de tempo. Mas é importante ter preparo para vencer um jogo no final quando necessário.
— Só a repetição permite alcançar resultado com menos esforço. Guto, mais uma vez, provou isso. Mas no Brasil, a cultura de trocar técnico a cada três meses impede o entrosamento. Não temos paciência _ lamenta Cléber Xavier.