É um clássico, mas a legenda não chega a ser dispensável. "Feitiço do tempo" é o nome do filme. Bill Murray, um jornalista reclamão, é pautado para cobrir o tradicional "Dia da Marmota". Altas confusões ocorrem e Bill acaba preso naquele mesmo dia. Ele dorme e acorda no mesmo dia, repetidamente. Todos os dias são o Dia da Marmota e o jornalista precisa conviver com isso até que a repetição à exaustão faça com que ele mude as suas atitudes.
Como filme, é das coisas mais divertidas já filmadas na Terra. Como roteiro futebolístico da vida real, é digno de fazer qualquer um que vista vermelho enlouquecer. Estamos, seja com Antônio Carlos Zago ou com Guto Ferreira eternamente presos no mesmo jogo que não acaba nunca. Todos os jogos do Inter são iguais. É o "Jogo da Marmota" a se repetir desde fevereiro.
A sequência de cenas eu garanto que o torcedor colorado conhece de cor, mas, como triste exercício, vamos ao passo a passo de um jogo do Internacional de 2017:
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1. Início de jogo avassalador: o Inter empilha chances. O volume de jogo nos minutos iniciais é algo de outro planeta. Começamos a torcer emocionados, felizes, contentes com o desempenho da equipe em campo. Pressionamos a saída adversária, roubamos a bola no nosso campo de ataque, martelamos o gol dos caras com fúria e disposição.
2. Gol: a pressão dá resultado. Saímos na frente do marcador antes ainda da metade do primeiro tempo. Um espetáculo. A massa vermelha em festa. A certeza de que "hoje sim vamos vencer com tranquilidade".
3. Quase gols: ainda em cima deles, continuamos a criar oportunidades. O desperdício começa a, lentamente, nos irritar. "Calma, Nico, não precisa chutar de qualquer jeito!", "Carlos, meu deus, pensa o jogo meu filho!", "Ah, se o Pottker estivesse centralizado para meter essa". Perdemos um total de 89 chances de gol durante a primeira metade da etapa inicial.
4. Parece que o jogo virou: lá pelos 30 minutos do primeiro tempo, as coisas começam a mudar. O adversário agora tem o controle do campo, passa a melhorar seus índices de posse de bola e obriga Danilo Fernandes a trabalhar com alguma competência para evitar o empate.
5. Pânico nosso de cada intervalo: já na saída dos times para os vestiários, o sentimento da torcida se transforma de "HOJE VAMOS AMASSAR ESSES CARAS!" para "meu deus, vai ser outro sufoco interminável este segundo tempo".
6. Não vemos a bola: o segundo tempo passa sem que o Inter sequer se apresente para o jogo. O adversário domina a partida com ampla margem. Não temos mais a bola, nem chances, nem pernas.
7. Gol deles (após jogada de linha de fundo/aérea): o gol dos caras não vem logo de saída, quando ainda teríamos chances de nos recuperar. O gol dos caras não vem lá no finalzinho do jogo, quando seria um balde de água fria veloz. O gol dos caras vem da metade para o final do segundo tempo. Justamente para fazer o nosso sofrimento ser maior, mais prolongado. Tudo o que há de alegre e contente no mundo vai desaperecendo aos poucos. A felicidade - junto com os pontos do jogo - vai se esvaindo como areia por entre os nossos dedos.
8. Fim de jogo: após mais um jogo sofrível, a raiva e o descontrole imperam.
E assim seguimos. Achamos que, ao religar a TV, ao voltar ao Beira-Rio, veremos um novo jogo. Que nada. Estamos presos tal qual Bill Murray. O "Jogo da Marmota" se repete. Mais uma vez. E outra. De novo.
Espero que um dia a gente consiga achar graça disso.
*ZHESPORTES