– Nunca vi algo assim. Parece magia, algo do mal.
A frase é de José de La Cruz Benítez Santa Cruz, goleiro do Inter nos anos 70 e 80, e cuja carreira foi prematuramente encerrada em um amistoso no Alegrete, em dezembro de 1983. Campeão brasileiro com o Inter, em 1979, e tricampeão gaúcho, de 81 a 83, Benítez jogou 12 anos como goleiro profissional. E jamais viu situação parecida como a de Antônio Carlos Zago que, em um prazo de 26 dias, perdeu três goleiros, terá de disputar uma final de campeonato com um camisa 1 quase improvisado e precisará chamar um zagueiro para cobrar cada tiro de meta.
Afinal, Marcelo Lomba tem uma séria lesão muscular na coxa direita, que o impede de correr, enquanto que o antigo titular, Danilo Fernandes, passou por uma cirurgia há quatro semanas e ainda se recupera da operação para a consolidação do quinto osso metatarsiano (dedinho) do pé esquerdo.
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Ainda que o Inter sonhe com Danilo Fernandes voltando a campo neste domingo, para a decisão com o Novo Hamburgo, o goleiro terá mínima condição de jogo, uma vez que o prazo para a sua recuperação era de 60 dias – e ele voltaria a campo em apenas 33 dias, quase um milagre.
– Independente de quem o Inter mandar a campo na final, a situação será dramática. Lomba mostra dificuldades até para caminhar, enquanto que Danilo está destreinado. Não queria estar em uma situação como essa. Torço pelo Inter, mas essa final será dramática – comenta Benítez, 65 anos.
Ex-goleiro da seleção paraguaia, Benítez recorda que foi pelo Inter que precisou atuar com os dedos quebrados. Duas vezes. na primeira, quebrou o dedo mínimo da mão esquerda em um amistoso com o Atlético de Madrid. O Inter havia conquistado o Troféu Joam Gamper contra Barcelona, Colônia e Manchester City, e seguiu em gira pela Espanha. Do empate em 1 a 1 com o Atlético, resultou na fratura. Naquele mesmo ano, um Flamengo e Inter, no Maracanã, fez com que Benítez quebrasse o dedinho da mão direita, após dividida com Zico, no empate em 1 a 1, pelo Brasileirão.
– Naquele tempo, a gente colocava um ferrinho no dedo, um esparadrapo por cima, calçava as luvas de novo, e ia para o jogo. Essas duas lesões ocorrem no primeiro tempo. Terminei o jogo morrendo de dor, mas permaneci em campo – recorda Benítez. – Não acredito que o Inter aposte agora em um jogador de linha para o gol. Se um especialista já tem dificuldades para fazer algumas defesas, imagine um zagueiro, que não está acostumado a jogar ali. Mas o futebol sempre apresenta surpresas – acrescenta.
Ademir Maria, hoje com 60 anos de idade, viu a história da dupla Gre-Nal de perto. Do banco de reservas. No Inter, foi suplente de Taffarel e, no Grêmio, de Danrlei. Nos tempos de Olímpico, Ademir Maria passou por uma situação parecida com a atual do Inter, porém, um tanto menos dramática, por não ser uma final de campeonato. Em 1993, o Grêmio perdeu os goleiros Émerson, Eduardo Heuser e Ademir Maria, todos lesionados, e viu surgir no time de Luiz Felipe Scolari um quarto, chamado das categorias de base, com o nome de Danrlei.
– Assumi como titular do Grêmio em fevereiro de 1993, quando o Émerson quebrou a perna (em uma dividida com o atacante Melancia, da seleção de Capão da Canoa, durante amistoso). Mas o Grêmio acabou contratando o Eduardo Heuser, e voltei para a reserva. Depois, o Eduardo se machucou em Pelotas e ficou um bom tempo fora. Fomos para uma série de amistoso na Europa e, lá, sofri uma lesão no ombro. De repente, estávamos sem três goleiros, foi quando Danrlei assumiu como titular e o Murilo, o quinto goleiro, foi chamado para compor o grupo – conta Ademir.
Após 22 anos de carreira profissional, Ademir Maria entende que o Inter terá apena suma opção para a final contra o Novo Hamburgo: a superação de seus goleiros e uma atuação histórica da defesa.
– É uma final de campeonato, que vale o hepta. Há muito em jogo e o Inter terá um goleiro sem condições de jogo, independente de quem for o escalado. Assim, a zaga precisará ser perfeita, inclusive pelo alto, terá de assumir tudo no jogo e, sobretudo, precisará evitar chutes de fora da área – ensina Ademir Maria.
A condição do goleiro do Inter para a decisão deste domingo será mantida em segredo ao longo da semana.
– Danilo Fernandes se colocou à disposição, como já fez ano passado. É um guerreiro, quer jogar lesionado mesmo – revelou o preparador de goleiros do Inter, Daniel Pavan.
Keiller, o terceiro goleiro do Inter a se lesionar no mês, não sofreu fratura no cotovelo esquerdo. A contusão, ocorrida quase ao final do 2 a 2 com o Novo Hamburgo, ainda merece cuidados e uma cirurgia não está descartada.
O goleiro segue sem previsão de retorno do futebol. Assim, o Inter se prepara para um domingo dramático, e que até poderá transformar um goleiro em lenda.
*ZHESPORTES