Consultor independente em gestão e marketing esportivo, Amir Somoggi estuda a fundo os movimentos do futebol brasileiro. E se assusta com o atraso de alguns clubes na forma de pensar o futebol. Entre eles, aponta o Inter. Vizinho do Allianz Parque, em São Paulo, Somoggi se impressiona com a onda verde que toma conta da região a cada jogo do Palmeiras. Embora o clube tenha dado um salto depois de passar pela Série B, o consultor avisa: a segunda divisão não faz bem para ninguém. A seguir, leia trechos da conversa por telefone que tivemos na tarde desta sexta-feira.
Qual o impacto de uma queda à Série B em um clube grande?
Quando se fala de rebaixamento, o exemplo que ficou marcado é o do Corinthians. Foi o primeiro de verdade que usou a experiência. Bateu no fundo e voltou mais forte. Houve um projeto que começou na queda. Depois veio o Ronaldo e o clube só deu saltos. Na época, o Corinthians fez campanha de marketing forte. Vendeu mais de 1 milhão de camisetas de algodão, a R$ 39, se não me engano, em que se liga: "Não vou te abandonar". Mas isso é coisa do passado. O rebaixamento já teve essa pegada de que faz o clube voltar mais forte. Hoje, se resume à desvalorização de tudo.
Qual o tamanho da perda para um clube desse porte?
É preciso analisar o rebaixamento pela perda esportiva. Ela impacta finanças através de bilheteria, redução no valor de patrocínios. Há contratos que preveem bônus em caso de conquistas e descontos na cota em caso de rebaixamento. A cota de TV não muda. O mais grave nisso tudo é que uma queda provoca desconexão com a torcida. O marketing nunca se torna tão essencial como numa hora dessas.
No caso de uma queda do Inter, você acredita que haverá uma baixa no quadro social?
Nada está perdido em clube de futebol. Mas olha o caso do colorado: se colocasse para escolher entre ser tri da América ou campeão brasileiro, eles escolheria a segunda opção. Imagina se o ano fecha com o clube entregando para ele o rebaixamento? Isso é o pior que pode acontecer na vida de um colorado. Ainda mais que o clube está no seleto grupo dos cinco que nunca caíram, com Santos, Flamengo, São Paulo e Cruzeiro. E isso deve causar, sim, reflexo no quadro social.
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Qual seria o tamanho desse estrago?
O Inter tem hoje mais de 100 mil sócios. Creio que desses 50 mil seguirão firmes. O clube precisa trabalhar para manter-se com, pelo menos, 80 mil. A receita não pode baixar mais do que 20%. O Coritiba, antes de cair, em seu auge, tinha 45 mil sócios. Na Série B, ficou com 15 mil. Isso é terrível para as finanças. O clube rebaixado tem queda de faturamento. Se previa R$ 300 milhões e tem queda de 15%, seriam R$ 45 milhões a menos. No melhor dos casos, esse clube tem perda de R$ 25 milhões.
Você acompanha o Inter, como faz com outros grandes da Série A. O que levou o clube a essa situação?
Numa conjuntura em que todos querem globalizar a marca, jogar Libertadores, não pode ser rebaixado. É o contrassenso, é muito triste. Sei que o Inter sofre problema de gestão. O modelo adotado em sua base está equivocado. O clube tem uma ótima captação, mas ela se exaure no modelo financeiro. Os jogadores são vendidos e uma pequena parte fica no clube, que se descapitaliza. A maioria comete esse erro, mas o Inter é o exemplo da vez. O clube está evoluído em algumas áreas administrativas, mas atrasado na forma de pensar o futebol.
A negociação de jogadores, um dos trunfos do clube, também fica afetada?
Em tese, os jogadores podem perder valor. Mas haverá uma debandada no grupo. Haverá necessidade de enxugar a folha e também o desejo do jogador de não atuar na Série B. Ele acaba saindo por menos do que estava previsto pelo clube. Ou seja, esse cenário é a má-gestão em seu extremo.
O que faz um clube grande entrar nessa espiral?
Sou apaixonado por futebol, estudo um pouco, mas o que vemos no Brasil está longe do que vemos em Portugal, Alemanha, Bélgica e Inglaterra. Aqui, os gastos são mal feitos. No caso do Inter, há um modelo antigo de gestão. Essa de queimar ídolos é prova da forma arcaica de pensar o futebol. Contratar técnico para ser para-raios da imprensa é ridículo. É questão orçamentária, de altos custos e baixa performance. Como o Inter não consegue ganhar um Brasileirão com um dos maiores orçamentos do Brasil? Está claro que a questão do time é psicológica. Os dirigentes, em seu modelo antiquado de administrar, tentaram de tudo e não deu certo. Como não estudaram, e agora não sabem o que fazer. Há uma falta de visão mínima. Eles (dirigentes) querem dominar tudo e não querem perder nada.
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