A parada nos jogos do Brasileirão pelas convocações para a Seleção Brasileira não serviu para acalmar o ambiente do Grêmio. A saída de Maicon e o violento protesto feito por torcedores na reapresentação do elenco foram os novos capítulos da conturbada temporada tricolor. Em meio aos problemas do time de Luiz Felipe Scolari, o aspecto mental do grupo de jogadores tem sido um desafio a mais na missão de deixar a zona de rebaixamento.
Recuperar a parte anímica do grupo foi uma preocupação demonstrada por Felipão desde seu retorno à Arena, no começo de julho. Os casos de descontrole de Diego Souza e Maicon — fato que pesou na antecipação de sua saída do clube — na derrota para o Corinthians mostraram que o problema persiste. Entre reclamações com a arbitragem e análises das dificuldades técnicas, o treinador reconheceu ainda no sábado que a parte mental tem prejudicado a equipe em campo.
— Não é possível que tenhamos só o aspecto emocional, temos que trabalhar tudo, mas em alguns momentos, alguns lances, ficam estranhos. É claro que o emocional é importante e temos que trabalhar para fazer com que os jogadores entendam que não dá para agir assim. Temos que acreditar mais em nós — disse Felipão após a derrota para o Corinthians.
Para o psicólogo do esporte Lucas Rosito, o elenco do Grêmio enfrenta uma dificuldade natural para reagir à mudança de perspectiva, de um grupo que almejava grandes conquistas para ter a disputa contra o rebaixamento como a meta da temporada.
— Esse mesmo elenco já deu resposta em outro momento. O Grêmio teve um ambiente que favoreceu e agora não está ajudando. Além disso, o desafio mudou. O Grêmio iniciou o ano com uma perspectiva boa e agora se encontra com um outro desafio. O grupo sente essa mudança e interfere na performance. Em temporadas recentes e até no começo dessa, o desafio era complexo, mas de conquistas, de mérito. Agora é igualmente complexo, mas de pouco mérito. Ou seja, o Grêmio tem muito mais a perder que ganhar. Terminar o Brasileirão sem ter sido rebaixado não será um mérito, mas apenas evitar uma grande perda — aponta.
Direção e reação
Nessa busca por reação, o também psicólogo do esporte Maurício Pinto Marques afirma que clube precisa mostrar maior firmeza nas suas decisões. Ele cita a forma como aconteceu a rescisão de Maicon, sem o esclarecimento detalhado, como um fator que contribui para essa quebra de confiança com a torcida, mas que também chega ao vestiário.
— A própria saída do Renato já não havia sido clara. A primeira manifestação dele sobre a saída acabou sendo em um programa de televisão. A saída do Maicon foi informada primeiro pela imprensa e depois o clube publicou nota que não explicou bem. A ausência de liderança não passa confiança para a torcida e afeta os jogadores. Quando o grupo e o entorno estão coesos, os vínculos são reforçados. Essa é a grande função da diretoria e da comissão técnica. Eles trabalham durante a semana para o jogador se sentir seguro e dar tudo o que pode sabendo que está respaldado. Os jogadores são a ponta exposta para a torcida — afirma Marques, que vê a violência do protesto da torcida como mais um motivo de preocupação:
— Esse tipo de ato tem efeito negativo. O atleta passa a evitar até no momento de lazer ter situações de vida social, fica com medo pelos familiares. O impacto é sempre negativo. Não há respaldo na literatura nem na prática de algo positivo por uma pressão violenta.
Com a experiência de ter construído uma carreira vencedora, mas também convivido em elencos que passaram por dificuldade, o ex-capitão gremista Mauro Galvão reforça a necessidade de o clube definir o caminho que será seguido sem deixar dúvidas para os jogadores. Além disso, ele salienta a importância de fechar o elenco sem possibilidade de novas vendas ou dispensas de atletas.
— O bom é ter um grupo definido. O Grêmio está ainda em fase de uma transição de uma equipe que funcionava de um jeito para um outro modo de jogar com o Felipão. É preciso ter um norte e seguir. É importante definir quem está na barca e quem não está. Ter jogador que pode ser negociado ou dispensado não é bom nesse momento — analisou.
A formação de um time de futebol depende de aspectos técnicos, táticos e também mentais. O Grêmio precisará trabalhar bem essas três forças para sair da situação incômoda que se colocou no Brasileirão e poder projetar um 2022 com ambições maiores.