O ano de 1976 havia sido mágico para o meia de toque refinado e de batida elegante na bola. Ao lado de Zico, Rondinelli e Luizinho – atacante que depois jogou no Inter –, Tadeu Ricci firmou-se como titular no time comandado pelo técnico gaúcho Carlos Froner. A equipe não chegou ao título Carioca, conquistado pelo Fluminense, mas o jogador esguio e de técnica apurada foi um dos destaques da competição. Terminado o campeonato pensou: já não era novo e aquela era a hora de fechar um grande contrato. Não foi assim. O plano se desfez com a chegada de outro treinador do Estado ao clube, Cláudio Coutinho.
Dias antes de começar a nova temporada com o Flamengo, Tadeu Ricci soube, por rádio corredor, que não seria aproveitado por Coutinho. Iria ser negociado. Sem entender as razões da decisão, o meia compareceu ao primeiro treino, esperou o momento certo para falar com o treinador e, indignado, cobrou:
– Chamei ele no canto e disse: “Você pode ser bom em estatística, números e teorias, mas de futebol não sabe nada” – criticou, virando as costas e indo embora, em uma atitude surpreendente para um jogador que sempre primou pelo equilíbrio.
Já em casa, ao lado da mulher, Marta, soube do interesse do Grêmio em contratá-lo. A cabeça ainda estava quente e Tadeu não pensava em trocar de cidade. Tudo mudou quando um padre amigo, Dom Fernando Guimarães, o aconselhou a pegar a bíblia e recomeçar sua caminhada em outro clube. O meia então reuniu-se com o responsável do futebol do Grêmio, Nelson Olmedo. Foi um dia inteiro de conversas até a concretização da transação.
Indicado pelo técnico Telê Santana, o número 8 chegou ao Estádio Olímpico com a missão de ser o pensador do time. Experiente, 29 anos, seria uma ponte entre o meio-campo e o ataque. Além disso, batia na bola com incrível precisão, especialmente perto da área. Mais: homem de fala mansa e formação religiosa, seria uma espécie de paizão, principalmente para os explosivos Iúra e Éder.
Tadeu Ricci caiu como uma luva no azeitado time montado por Telê. Seus lançamentos milimétricos buscavam os pés de Tarciso, André e Éder, o trio de ataque, e também os de Iúra.
Quando eu estava muito louco em campo, e isso acontecia bastante, o Tadeu falava algo, me acalmava.
Iúra
Sobre parceria com os companheiros
– Quando eu estava muito louco em campo, e isso acontecia bastante, o Tadeu falava algo, me acalmava. Nem sempre deu certo, mas ele tentava – diverte-se Iúra.
Uma história marcante do título de 1977 nunca saiu da mente de Tadeu. Os tempos eram duros para o Grêmio e sua torcida, pois o Inter era um timaço. Ganhava tudo naquela década. Havia uma sede de dar fim aos trunfos do clube do Beira-Rio. E naquele 25 de setembro uma ansiedade tomava conta dos corredores do Estádio Olímpico. Ao encontrar os jogadores almoçando no refeitório, o presidente Hélio Dourado chegou perto da mesa em que estavam Tadeu, Ancheta e Telê. Dourado, que ia ser pai a qualquer momento, questionou:
– Posso colocar o nome de Vitória se for menina?
– Fica tranquilo, presidente. Vai dar certo – afirmou Tadeu.
Deu mesmo. Tadeu teve participação decisiva na campanha e no gol de André, que culminou no título tricolor. Ao receber passe de Eurico, fez um corta-luz para Iúra receber e lançar André, que bateu desajeitado no ângulo:
– Tínhamos uma sintonia absurda, uma orquestra comandada com maestria pelo Telê. Tinha dois grande laterais, Eurico e Ladinho. E tinha o Ancheta...
Tadeu Ricci trava a voz rouca quando fala do zagueiro uruguaio. Para ele, um ícone.
– Falam, e com merecimento, do Figueroa. Mas o Ancheta jogava tanto quanto ele. É que o Figueroa ainda declamava Neruda, aí ele ganhava os holofotes – compara.
O ex-jogador, hoje com 71 anos, que atualmente vive em Ribeirão Preto, em São Paulo, assegura que sua passagem pelo Grêmio em 1977 – ele ficou até julho de 1978, saiu para casar e retornou em novembro daquele ano para disputar o Hexagonal final do Gauchão, vencido pelo Inter – foi o maior presente de sua carreira.
– Já pensou se o Coutinho (falecido em 1981) não tivesse me dispensado? – pergunta. – Os caminhos estavam traçados e eu gravei para sempre o Grêmio no coração.