A história de vida de Luiz Filipe Machado, 20 anos, é como uma virada no placar aos 49 minutos do segundo tempo em um golaço de falta. Relacionado pela primeira vez para uma partida do time profissional do Grêmio no último dia 24, contra o São Paulo, na Arena, devido à suspensão de Ramiro, o santa-mariense ainda faz parte do grupo chamado de transição – espécie de time B.
É ambidestro e tem 1m75cm. Descreve-se como um volante de bom toque de bola e que arrisca chutes ao gol. Inspira-se no capitão Maicon e no espanhol Sergio Busquets, do Barcelona. De cabeça erguida, como atuam as suas referências no futebol, ele driblou uma infância bastante difícil, na Vila Lídia, bairro Noal, região de Santa Maria reconhecida muito mais pelo tráfico de drogas e pela violência do que pelos seus talentos.
– É preciso ter a cabeça no lugar. Quase desisti do futebol. Mas, apesar da dificuldade, tive fé. Muitos dos meus amigos, hoje, estão mortos ou presos – conta um sereno e humilde Filipe, que, no time da Capital, é conhecido como Machado, mesmo sobrenome do técnico Roger.
Tem três pais. O biológico atuou como jogador profissional. Clóvis Machado, hoje com 38 anos, também volante, jogou no Atlético-PR, quando foi embora e nunca mais voltou. Foi em 2003 que Filipe viu o pai pela última vez. Tinha 7 anos. Criado pelos avós (Isaias da Rosa e Cleone da Rosa) até os 13 anos, tem na figura do avô materno o seu verdadeiro pai.
– Ele (avô) me carregava na garupa da Vila Lídia até a AABB (mais de 5 quilômetros) para os treinos. Quando chovia, eu carregava o guarda-chuva na garupa dele. Tudo o que eu precisava para treinar foi ele quem conseguiu pedindo para as pessoas. Se eu não desisti do futebol, e hoje estou aqui, é por causa dele – lembra Filipe, que perdeu o avô quando tinha 13 anos.
Após a morte do avô, Filipe foi morar com a mãe, Eliziane da Rosa, que não tinha condições de criar o filho na infância, e com o padrasto, Juliano Santos, o seu "pai do coração". A casa da mãe ficava a 50 metros da casa dos avós.
– Meu padrasto trabalhava como lixeiro. Ele e minha mãe já comeram comida do lixo – recorda Filipe, que, na contramão do destino de muitos outros, é o espelho para outros quatro irmãos mais novos.
Na Baixada, o reencontro com amigos do Inter-SM
Além da escolinha na AABB, Filipe passou pelo Novo Horizonte, onde permaneceu por cinco temporadas, e por categorias de base em projetos sociais no campo do 2 de Novembro (com os times do futebol amador do Ituano e do Sport e numa escolinha que mantinha convênio com o Grêmio), ao lado da Vila Lídia. Viajou ao Paraná, mas retornou para atuar no Inter-SM, até que assinou o seu primeiro contrato no Desportivo Brasil, time da cidade de Porto Feliz, no interior paulista.
Disputou a Copa São Paulo de Futebol Júnior em 2014. Chamou a atenção do Grêmio e foi levado a Porto Alegre. Na última terça-feira, foi titular do Grêmio no Brasileirão Sub-20 em partida contra o Fluminense, no Rio de Janeiro. No entanto, os gaúchos acabaram eliminados.
De folga desde a quinta-feira, Filipe aproveitou o final de semana para visitar familiares e amigos em Santa Maria. Na tarde de sexta, ele foi ao treino do time sub-19 do Inter-SM, que se prepara para a competição estadual da categoria e joga amistoso neste sábado na Baixada. No Estádio Presidente Vargas, reencontrou ex-companheiros e amigos, como os meias Julio e Thiaguinho, que, assim como ele, sonham chegar a um grande clube do futebol brasileiro.
– Quero estar no profissional ainda este ano. Sei que falta pouco para eu me afirmar – concluiu Filipe, que conta com o suporte dos empresários Tadeu Cruz, filho do técnico Milton Cruz, de São Paulo, e Walter Cirne, de Porto Alegre.
Na semana passada, além de ser relacionado para a partida e ficar no banco de reservas contra o São Paulo, Filipe renovou contrato com o Grêmio até o final de 2018.
FICHA TÉCNICA
Nome – Luiz Filipe Machado
Idade – 20 anos
Altura – 1m75cm
Posição – Volante
Característica – Ambidestro
Onde nasceu – Santa Maria