Domingo de Gre-Nal não é nenhuma novidade. Está incorporado aos hábitos dominicais dos porto-alegrenses como o chimarrão no parque, o passeio pelo Brique, o churrasco com a família. O domingo que passou, no entanto, foi excepcional: talvez tenha nascido no Gre-Nal 404 uma nova tradição gaúcha - a convivência pacífica entre torcedores rivais, que vibram lado a lado na mesma área dos estádios.
A iniciativa do Internacional de promover uma torcida mista no Beira-Rio no jogo de ontem foi recebida no começo com incredulidade e até contrariedade, de quem viu na proposta pouco mais do que uma boa intenção ou mesmo apenas uma esperta jogada marqueteira. Às vésperas da partida, porém, a expectativa mudou de tom: a chance de adversários clubísticos finalmente sentarem juntos na arquibancada começou a soar simpática e inclusive empolgante.
Pois tudo saiu ainda melhor do que a encomenda: os 2 mil torcedores da torcida mista - metade colorada, metade gremista - foram para casa sem ver gol, mas assistiram a uma partida disputada por ambas as equipes, que eletrizou o público dos dois lados. No entanto, o show quem deu mesmo foram os torcedores: a área mista estava lotada de casais, famílias e grupos de amigos que não deixaram de torcer pelo seu time, reclamar da arbitragem e provocar o coirmão - tudo como em um jogo comum, com a diferença de que gremistas e colorados estavam ombro com ombro. E nem por isso houve brigas.
- Não há mais espaço para uma rivalidade acirrada assim no futebol moderno. É só esporte - ponderava o administrador de empresas colorado Lucas Antônio, 28 anos, que proporcionou à namorada gremista Fernanda Martiny, 27, sua primeira visita ao Beira-Rio.
Era só puxar assunto com qualquer vizinho de cadeira para ouvir uma história bacana de companheirismo e paixão pelo futebol. O técnico em informática colorado Daniel Bohn, 39 anos, convidou o cunhado André Ozzone, 38, para acompanhá-lo nesse domingo histórico.
- Nunca deixei de acreditar que isso um dia iria acontecer. A gente é civilizado fora do estádio, por que não pode ser dentro também? - questionou o DJ gremista Ozzone, mostrando orgulhoso no celular a foto do filho Vicente, pequeno tricolor que completava três anos justamente naquele dia histórico.
Foi bonito testemunhar ao vivo o clima de quase euforia que contagiou a galera junta e misturada. Se nos últimos dias a internet foi invadida pela bizarra polêmica a respeito das cores de um vestido, na torcida mista não havia dúvidas: todo mundo só enxergava azul e vermelho.
- Tem que aprender a conviver juntos. Já tinha vindo ao Beira-Rio infiltrada, com uma camiseta neutra. Mas assim é muito melhor - defendeu faceira a relações públicas gremista Dienyffer Perin, 27 anos, que pôde vestir-se de azul graças ao convite do marido colorado, o empresário Diego Cividini, 28.
Essa certeza de que um outro mundo é possível no futebol também é compartilhada por Cividini - que levou também ao estádio o cunhado gremista e a irmã colorada:
- Vou ao Gre-Nal desde que tinha cinco anos, com meu pai, e a gente via brigas acontecerem de vez em quando no caminho. Hoje, cheguei no Beira-Rio com minha família, cada um vestindo uma camisa diferente, e não tivemos nenhum problema.
Cartolas de outros Estados brasileiros e até do Exterior estavam de olho na torcida mista pioneira deste domingo, entusiasmados com a possibilidade de reproduzir o exemplo gaúcho em seus estádios. Fizemos bonito no Gre-Nal da paz e inauguramos uma nova maneira de engrandecer o futebol. Isso é uma baita façanha nossa - e que sirva de modelo a toda terra.
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