Há 25 anos, numa manhã de domingo, o Brasil perdeu um de seus maiores ídolos do esporte. Ayrton Senna, então com 34 anos, morreu ao bater sua Williams numa curva do circuito de San Marino.
Em sua carreira na Fórmula-1, o brasileiro surpreendeu o mundo pelas atuações de gala, mesmo em condições adversas e correndo com carros inferiores ao dos adversários da época.
Relembre os momentos mais marcantes da carreira do piloto:
Do berço ao kart
Ayrton Senna ganhou o primeiro kart aos quatro anos de idade. Foi o seu pai quem construiu. A primeira competição foi em uma corrida amistosa nas ruas de Campinas (SP), aos nove anos. No sorteio, garantiu a primeira pole. De 1974 a 1980, ganhou vários títulos, dentre eles paulista, brasileiro e sul-americano. Por duas vezes, foi vice-campeão mundial.
O primeiro rival
Foi no kart que Senna enfrentou seu grande adversário nas pistas: o britânico Terry Fullerton, que foi campeão do mundo. Para Ayrton, foi o maior e melhor rival. "Ele era muito experiente, rápido e consistente, um piloto completo. Era competição pura, automobilismo puro. Sem política nem dinheiro envolvido. Aprendi muito com ele"
A ascensão
Campeão da Fórmula Ford 1600, Ayrton quase desistiu da carreira para, pressionado pelo pai, tocar os negócios da família. Mas voltou às pistas. Em 1982, foi campeão inglês e europeu da Fórmula 2000.
No ano seguinte, na Fórmula-3, bateu todos os recordes. Venceu com pole e volta mais rápida as nove primeiras corridas do ano. Fez Silverstone ser apelidada de "Silvastone", em referência ao seu sobrenome. Estava pronto para um desafio maior: a Fórmula-1.
O primeiro teste
A primeira vez de Senna no cockpit de um carro de Fórmula-1 foi em 19 de julho de 1983, em Donington Park. Frank Williams o convidou para dar uma volta no carro de sua equipe. Ayrton ouviu as instruções e partiu. Deu uma volta para sentir o carro. E logo depois voou, a ponto de bater o recorde da pista. "Ficamos perplexos", disse Frank.
A estreia
Novato, Senna precisava começar de baixo. Assinou com a Toleman, após testar com Williams, Brabham e McLaren. Marcou seu primeiro ponto na segunda corrida. Era 7 de abril de 1984 em Kyalami, na África do Sul. O desgaste para garantir o resultado foi tamanho que precisou ser retirado do carro e levado ao hospital, com espasmos musculares. Passou, então, a focar na preparação física, com auxílio de Nuno Cobra.
Show em Mônaco
Nas ruas estreitas de Mônaco, uma pilotagem arrojada e debaixo de chuva apresentou Ayrton ao mundo. Largou em 13º e fez ultrapassagens em série. Era segundo e diminuía a diferença para o líder, Alain Prost, da McLaren.
Mas o diretor de prova interrompeu a corrida — especula-se que para favorecer o francês, que ficou com a vitória e apenas metade dos pontos, já que a prova foi suspensa. Em segundo, Ayrton conquistou seu primeiro pódio. No fim do ano, Prost perderia o título mundial para o companheiro Niki Lauda por meio ponto.
O gostinho da primeira vez
Após terminar a temporada de 1984 em nono lugar, com 13 pontos, Senna assinou com a Lotus. Em 21 de abril de 1985, no circuito de Estoril, em Portugal, fez a primeira pole e garantiu a primeira vitória, na chuva. Ele venceria outra vez na Bélgica, também em pista molhada, fechando o ano com sete poles, seis pódios e um honroso quarto lugar no campeonato.
Dobradinha e rivalidade com Piquet
Em 1986, ainda na Lotus, Senna liderou o campeonato pela primeira vez. Tinha como estratégia não trocar pneus para compensar a diferença para as Williams e McLarens. Fez oito poles (metade das possíveis) e venceu duas vezes, na Espanha (Jerez de la Frontera) e nos Estados Unidos (Detroit).
Na Hungria, disputou com Nelson Piquet (Williams) a vitória. E levou uma ultrapassagem histórica, por fora, do então bicampeão. Foi a terceira dobradinha brasileira no ano (as outras foram no Brasil e na Alemanha), todas com Nelson à frente.
Despedida em amarelo
Na última temporada pela Lotus, em 1987, Senna correu pela primeira vez com motores Honda. Patrocinado pela Camel, o carro era todo amarelo. Com uma pole, duas vitórias e oito pódios, Ayrton foi terceiro no campeonato vencido por Piquet — com o qual se desentenderia no ano seguinte e daria início a uma rivalidade jamais resolvida.
A incrível McLaren
Em 1988, Ron Dennis formou um dream team na McLaren. O carro era o melhor do grid (venceria 15 das 16 corridas). O motor Honda era o mais forte e confiável. No cockpit, o bicampeão Alain Prost tinha ao lado a promessa Ayrton Senna. E o que parecia ser a mescla de juventude e experiência viraria uma rivalidade ferrenha pelo título.
Do erro de Mônaco à vitória em Silverstone
Após Prost vencer no Brasil e Senna em San Marino, a F-1 chegou a Mônaco. No treino, Ayrton voou: foi 1,4 segundo mais rápido do que o francês. Na corrida, disparou. Tinha um minuto de vantagem sobre Prost quando o chefe da equipe, Ron Dennis, mandou os pilotos tirarem o pé. E Senna se desconcentrou.
A 11 voltas para a bandeirada, bateu sozinho. Prost venceu. Senna foi para o hotel sem falar com ninguém. Aprenderia ali uma lição importante na carreira, vital para vitórias futuras como em Silverstone, o primeiro de quatro triunfos seguidos naquele campeonato.
Campeão, enfim
Era 30 de outubro de 1988. Senna e Prost dividiam a primeira fila, com o brasileiro na frente. Valia a taça.
Na largada, Ayrton teve problemas com a embreagem e caiu para 14º. Quando o motor funcionou, passou seis carros logo na primeira volta.
Na 24ª das 51 voltas, alcançou e deixou para trás Prost em Suzuka, no Japão. A ultrapassagem garantiu uma de suas vitórias mais espetaculares. E o inédito título mundial.
Polêmica com Prost
O duelo interno na McLaren ferveu em 1989. No Japão, Senna precisava vencer para adiar a decisão do título. No treino, fez a pole com quase dois segundos de vantagem para Prost. Na corrida, a disputa acirrada teve desfecho na 46ª volta. Os dois bateram quando Ayrton tentou ultrapassar o francês, que abandonou a corrida.
Ajudado por fiscais, Senna contornou a chicane, voltou à pista e venceu. Mas foi desclassificado. Saiu arrasado, apontando Prost como culpado pelo acidente e acusando o presidente da então FISA, Jean-Marie Balestre, de ter favorecido seu conterrâneo. Chegou a pensar em abandonar o esporte.
A vingança
A rivalidade árdua e o racha interno fizeram Prost trocar a McLaren pela Ferrari em 1990. Os dois disputaram o título e, de novo, o desfecho foi no Japão. Desta vez, Prost precisava vencer. Ayrton fez a pole, mas saiu do lado mais sujo da pista. Culpou Balestre, outra vez.
Na largada, Prost tracionou melhor e, na primeira curva, Senna atingiu o francês e virou bicampeão. Um ano depois, Ayrton admitiu ter batido de propósito no rival:
— O sistema ferrou comigo várias vezes. Aí eu disse para mim mesmo. Hoje, de jeito nenhum. Hoje é do meu jeito.
A primeira vitória em casa
Em 24 de março de 1991, Ayrton realizou o sonho de vencer no Brasil. Largou na pole e vinha liderando até sua McLaren ter problemas mecânicos. Nas últimas voltas, só tinha a sexta marcha. Mas conseguiu. Gritou e chorou após cruzar a bandeirada. Em seguida, empunhou a bandeira do Brasil até parar na reta oposta. O desgaste era tanto que não tinha mais força. No pódio, com muito esforço, conseguiu erguer a taça, para delírio da torcida em Interlagos.
Tricampeonato no Japão
Em 1991, o duelo de Senna foi com a Williams de Nigel Mansell. Depois de começar o ano com vantagem, o time do britânico reduziu a diferença.
No Japão, um erro do Leão o fez abandonar a corrida na nona volta. Senna já era tricampeão.
Mesmo assim, atacou o companheiro Gerhard Berger e assumiu a ponta. Na última curva, após pedido do chefe Ron Dennis, freou para deixar o austríaco passar e vencer.
Rival "de outro mundo"
Foi impossível competir com a Williams e sua suspensão ativa em 1992. Com o carro mais lento, restou a Senna lutar por pódios. Foram três vitórias — uma delas em Mônaco, após disputa alucinante com o futuro campeão Mansell, que ficou várias voltas embutido na McLaren de Ayrton. O desempenho foi tão abaixo da rival que Senna definiu a Williams como "de outro mundo". E cogitou ficar um ano fora da F-1.
Um gesto para a história
Uma atitude solidária de Ayrton no GP da Bélgica de 1992 marcou sua carreira. No treino classificatório. Senna viu que Éric Comas, da Ligier, havia sofrido um acidente e, subitamente, parou o carro na pista e foi socorrer o francês. Primeiro a chegar ao local, o brasileiro desligou o motor para evitar risco de explosão. Mais tarde, Comas disse que Senna salvou sua vida.
A segunda vitória no Brasil
O ano de 1993 começou de forma fantástica para Senna. Apesar de a Williams ter a volta de Alain Prost e um carro muito superior — principalmente pelos dispositivos eletrônicos —, o brasileiro conseguiu uma improvável vitória em Interlagos.
Ajudado pela chuva, que mudou a história da prova e fez Prost abandonar a corrida, Ayrton segurou no braço e venceu. Em delírio, a torcida invadiu a pista para comemorar com ele, e Senna voltou aos boxes no safety car.
A melhor volta da história
Em 11 de abril de 1993, no circuito inglês de Donington Park, Senna completou aquela que é considerada a melhor volta da história da F-1. Largando em quarto com a McLaren, Ayrton caiu para quinto. Mas em poucas curvas, debaixo de uma chuva intermitente, passou todos os rivais e completou a primeira volta na liderança. Naquela corrida, Senna ainda fez a melhor volta da prova passando pelo boxe. E venceu, claro.
Rei de Mônaco e última vitória
Ayrton quebrou o recorde de seis vitórias em Mônaco em 1993, superando Graham Hill. Virou o Rei de Mônaco. Mas a Williams cresceu ao longo do campeonato e dominou. Apesar das cinco vitórias, Senna foi vice-campeão, atrás de Prost.
No derradeiro GP da Austrália, venceu pela última vez na carreira na despedida da McLaren. No ano seguinte, enfim ele guiaria pelo time que testou pela primeira vez um carro de Fórmula-1.
Rumo à Williams
Surpreendido com a velocidade e equilíbrio da Williams em 1992, Senna já havia tentado ir para o time britânico no ano seguinte. Mas foi impedido por Prost, cujo contrato vetava dividir a equipe com o brasileiro. A cláusula valia até o fim de 1993. E, após a Williams acertar com Ayrton, o francês foi dispensado e abandonou a carreira um ano antes do fim do contrato.
Carro rápido e difícil
A pré-temporada mostrou que a Williams FW16 tinha potencial, mas era difícil de dirigir. O motivo era a mudança no regulamento, que baniu sistemas eletrônicos como a suspensão ativa, o controle de tração e os freios ABS. Enquanto isso, Michael Schumacher emergia na Benetton como maior rival de Senna no começo do campeonato.
Estreia decepcionante
Repleta de expectativa, a primeira corrida com a Williams, em Interlagos, começou com Senna largando na pole. Ultrapassado por Schumacher após parar nos boxes, o brasileiro tentou recuperar a posição, mas rodou e saiu da corrida. No GP do Pacífico, disputado no Japão, Ayrton saiu na frente outra vez, mas foi atingido por trás por Mika Hakkinen (McLaren) e abandonou. Schumacher venceu de novo.
Do susto à morte
Uma atmosfera negativa tomou conta do GP de San Marino, em Ímola. Na sexta-feira, Rubens Barrichello voou com a Jordan e bateu violentamente em uma barreira de pneus. Quebrou o nariz e ficou fora da corrida. No sábado, o austríaco Roland Ratzenberger, da Simtek, perdeu o aerofólio traseiro e atingiu o muro. Foi a primeira morte em uma corrida de F-1 em 12 anos.
Ímola, 1º de maio
Na largada, J.J. Lehto deixou morrer o motor de sua Benetton. Pedro Lamy, da Lotus, atingiu sua traseira e provocou a entrada do safety car, que ficou na pista por cinco voltas. Na relargada, Senna manteve a liderança sobre Schumacher e cravou o melhor tempo da corrida. Abriu a sétima volta em vantagem. Até chegar à curva Tamburello, onde saiu da pista e morreu ao bater forte no muro.
As possíveis causas
Quebra da barra de direção: a Williams fez, a pedido de Senna, uma emenda para aumentar a coluna da barra em 1,8 centímetros. Uma fadiga a teria rompido, deixando o carro desgovernado. No julgamento do caso, em 1997, a tese foi rejeitada por falta de provas.
Falha do piloto: pressionado por Schumacher, que liderava o campeonato com 20 pontos de vantagem, Senna teria se desconcentrado e, ao errar o contorno da curva, acertou o muro.
Fatalidade: como as cinco voltas antes do acidente foram feitas com safety car, estima-se que a redução da pressão dos pneus, diante da baixa velocidade, teria feito o carro perder altura e tocar o fundo na pista, tirando as rodas do chão e deixando a Williams desgovernada.
Por que Senna morreu?
Apesar da batida em alta velocidade, o principal motivo foi o fato de a roda dianteira direita ter ficado presa entre a proteção e o carro, sendo arrancada do chassi junto com um braço da suspensão. A peça perfurou o capacete de Senna pela viseira (único local frágil da estrutura) e afundou parte de seu crânio.
Oficializada só no hospital, o médico Sid Watkins, que atendeu Senna, disse que ele morreu na pista. No cockpit da Williams, havia uma bandeira da Áustria, com a qual Ayrton pretendia, caso vencesse, homenagear Ratzenberger, morto um dia antes
Um funeral histórico
O corpo de Ayrton Senna chegou ao Brasil em 4 de maio e foi recebido com honras de chefe de Estado. Estima-se que mais de um milhão de pessoas foram às ruas para acompanhar o cortejo.
Filas se formaram no velório, em que o caixão estava coberto com a bandeira do Brasil e o capacete de Ayrton. Na corrida seguinte, em Mônaco, as duas primeiras posições no grid ficaram vazias e foram pintadas com as cores das bandeiras brasileira e austríaca.
Legado de segurança
Circuitos foram redesenhados e mudanças foram feitas nos carros após a morte de Senna. Dentre elas, a obrigatoriedade do uso de um cabo que amarra as rodas à estrutura do carro em caso de batida, o reforço na estrutura do cockpit, que ficou maior e com laterais elevadas, e a adoção do Hans (na foto, usado pelo bicampeão Fernando Alonso, em 2003), dispositivo que protege o pescoço e a cabeça em caso de impacto.
Legado social
Antes do acidente, Senna já atuava como empresário. Foi ele mesmo quem idealizou as marcas Senna e o personagem Senninha. Por ter em mente que um futuro melhor passava pela educação, lançou o embrião para o Instituto Ayrton Senna. Fundada em 1994, a organização capacita educadores e tem programas beneficiam milhões de alunos em todo o país.
Números na F-1
- 10 anos de carreira
- 3 títulos (1988, 1990 e 1991)
- 161 GPs
- 41 vitórias (13 na chuva)
- 80 pódios
- 65 poles
- 614 pontos