Na semana passada, vieram à tona redações escritas por participantes do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) em que os autores misturavam à argumentação trechos de uma receita de macarrão instantâneo e do hino de um clube de futebol. Também surgiram textos avaliados como nota mil - a máxima do Enem - que apresentavam erros de ortografia.
Para evitar que a polêmica gere uma preocupação aos vestibulandos das universidades federais do Rio Grande do Sul (UFRGS) e de Santa Maria (UFSM) - duas instituições que mantêm um processo seletivo próprio, independente do Enem - entenda como é feita a correção das dissertações em cada universidade e compare com os critérios do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão responsável pelo Enem.
Na UFRGS
> Cada redação é corrigida por duas pessoas, em dois momentos distintos. Pela manhã, um avaliador corrige a redação na modalidade analítica (em que se avalia o conteúdo, a estrutura e a expressão linguística), e, à tarde, outro avaliador, que desconhece a nota atribuída na modalidade analítica, corrige a redação na modalidade holística (em que se avalia a redação como um todo). Em média, cada um dos cerca de 160 corretores lê em torno de 30 redações por turno, atribuindo notas de 0 a 10.
> Se os escores atribuídos pelos avaliadores tiverem um distanciamento maior ou igual a 2,5 pontos, considera-se que houve discrepância na avaliação da redação. O texto é reavaliado por outro examinador.
> Problemas de ortografia e gramática geram descontos de 2 a 8 pontos. O candidato pode ter até dois erros de convenção ortográfica sem sofrer desconto algum.
> O candidato pode levar o rascunho da redação, mas a universidade não disponibiliza o acesso à correção.
> Avaliação analítica: verifica se o vestibulando é capaz de construir sua própria abordagem do tema a partir de um ponto de vista claro, consistente e autônomo.
> A avaliação holística orienta-se por três parâmetros: tema, modo composicional e adequação à norma culta.
> A nota final é representada pela soma dos escores das duas modalidades (analítica e holística) e expressada, por meio de conversão, por um escore entre 0 e 25 (número de questões da prova de língua portuguesa).
O que zera a prova
> Fuga ao tema
> Escrever texto não dissertativo
> Texto com menos de 30 linhas
Na UFSM
> A Comissão Permanente do Vestibular (Coperves) adota uma ficha de critérios com 10 itens, cada um vale um ponto. A avaliação é feita por 20 duplas, compostas por professores da Faculdade de Letras da própria universidade e por outros de diferentes instituições, aprovados em seleção pública.
> Dois avaliadores corrigem o texto e estabelecem uma nota. Havendo diferença - mesmo pequena, como um ponto - um terceiro avaliador pode ser chamado para equalizar o resultado.
> Em casos de tangenciamento, isto é, em que o assunto proposto não é integralmente tratado no texto, a nota é reduzida, mas não zerada. Candidatos com nota inferior a 3 são excluídos da disputa.
> É muito difícil alguém tirar a nota máxima. Em 2012, apenas um texto recebeu 10.
Alguns Critérios
> O parágrafo de introdução delimita com eficiência o tema proposto.
> Nos parágrafos de desenvolvimento, a unidade e a progressão temáticas na apresentação das ideias contribuem para a coerência textual.
> Os argumentos são fundamentados em exemplos e/ou evidências relevantes e suficientes.
> O fechamento textual resulta da exploração adequada dos argumentos que sustentam a tese.
> A seleção lexical no texto é variada e utilizada como um recurso expressivo.
> A ortografia, as relações de concordância, regência e colocação estão ajustadas ao padrão culto da escrita.
O que zera a nota
> Fuga ao tema ou grafia ilegível
> Produzir um texto que não tenha caráter dissertativo, com, no mínimo, 20 linhas e, no máximo, 25 linhas
No Enem
> A nota final da redação (de zero a mil) é feita com base na avaliação de dois corretores independentes, que avaliam cinco competências definidas no edital, que valem até 200 pontos cada.
> A nota total de cada avaliador corresponde à soma das notas atribuídas a cada competência. Caso não haja discrepância entre os dois corretores, a nota final é a média aritmética das duas notas totais.
> Discrepância é quando as duas notas totais diferem por mais de 200 pontos ou se a diferença das notas em uma das competências é superior a 80 pontos. Nesse caso, entra um terceiro corretor.
> Sem discrepância entre o terceiro corretor e pelo menos um dos outros dois, a nota é a média aritmética entre as duas notas mais parecidas. Se a discrepância se mantém, a redação é avaliada por uma banca de três corretores.
Por que não foram zeradas
> No caso das redações com a receita de miojo e com o hino do Palmeiras, os avaliadores consideraram que houve fuga parcial do tema, pois os outros parágrafos tratavam do assunto "imigração para o Brasil no século 21" e, por isso, não receberam nota zero. As regras preveem nota zero apenas para textos com fuga total do tema.
> A respeito das redações com erros de ortografia, consta, no Guia do Participante do Enem 2012, que redações com "desvios mais graves" não podem obter 200 pontos na competência 1 - demonstrar domínio da norma padrão da língua escrita. A lista de "desvios mais graves" cita "desvios graves de grafia e de acentuação", mas não exemplifica. Apresentar "pouquíssimos desvios gramaticais leves e de convenções da escrita", diz o documento, não são motivo para desconto.
MEC muda regras
De acordo com o Ministério da Educação (MEC), uma comissão de especialistas já participa de reuniões para discutir novos critérios de avaliação das redações. As normas teriam de ser definidas até junho para aparecerem no edital do próximo Enem.
Na sexta-feira, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, reforçou que, na próxima edição do exame, redações que apresentarem trechos "provocativos ou debochados" deverão ser zeradas. Também antecipou mudanças na correção de textos que receberem nota máxima. Segundo o ministro, as redações que tirarem nota mil serão reexaminadas por três professores doutores, que farão um "pente fino" no texto.
Em entrevista a Zero Hora, o presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) - órgão do MEC responsável pelo Enem -, Luiz Cláudio Costa, disse ser preciso "separar o joio do trigo", em referência à necessidade de aprimorar os critérios de pontuação para penalizar com nota zero os candidatos que fizerem uma "inserção por deboche" no texto.