O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou nesta quarta-feira (8), em evento de comemoração ao Dia Internacional da Mulher, medidas para assegurar direitos para as mulheres. Entre elas, um Projeto de Lei (PL) para promover a igualdade salarial entre homens e mulheres que exerçam a mesma função. A proposta será enviada ao Congresso nos próximos dias.
O texto prevê, conforme a ministra do Planejamento, Simone Tebet, multa de 10 vezes o maior salário pago na empresa em caso de descumprimento da paridade salarial e vale para empresas com, pelo menos, 20 funcionários. O PL também deve abrir a possibilidade de que a Justiça emita, em caráter de urgência, decisão para forçar a empresa a pagar o mesmo salário.
De acordo com a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, o projeto é estratégico e agora se tornará uma discussão do governo com o Congresso Nacional.
— Vamos articular para que ele seja aprovado na forma com que ele está sendo encaminhado. Além disso, foram anunciadas outras ações de enfrentamento à violência contra as mulheres. A igualdade e equidade se dão por nível de igualdade salarial, mas precisamos pensar como serão os cuidados. A questão da ascensão das mulheres também é estratégica e fundamental — sublinha a ministra.
Para o coordenador do PUCRS Data Social, André Salata, responsável pelo Levantamento Sobre Desigualdade de Gênero no Rio Grande do Sul que apontou desequilíbrio na equiparação da renda do trabalho entre gaúchas e gaúchos, as medidas anunciadas nesta quarta mostram o empenho do governo na causa das mulheres. Salata ainda destaca duas das ações como as mais importantes: os anúncios de construções de creches e de distribuição de bolsas científicas dedicadas a projetos conduzidos por pesquisadoras mulheres.
— Uma das razões para termos tamanha desigualdade econômica entre homens e mulheres é, justamente, o fato de as mulheres terem que se dividir entre maternidade, mercado de trabalho e trabalho doméstico. E o acesso à creche no Brasil para pessoas mais pobres é bastante limitado. Já o anúncio de bolsas científicas é importante para que que se reconheça, incentive e destaque o trabalho de mulheres que alcançam posições mais altas, no caso de cientistas. Servirá de inspiração para meninas que estão começando e decidindo o que pretendem ser no futuro — afirma Salata.
O professor na Unisinos Roger Raupp Rios, especialista na área de Direito de Igualdade e Não-Discriminação e desembargador do TRF4, ressalta que respostas à discriminação por gênero requerem um sistema amplo de enfrentamento. Nessa linha, segundo ele, as medidas divulgadas vão além do desafio relativo à igualdade salarial. Rios reforça também a necessidade de olhar para outras frentes para avançar.
— Exemplos disso são assumir uma atitude mais forte em relação ao assédio, prover melhores condições materiais de apoio ao exercício do direito ao trabalho e a participação na vida social, como se dá com as creches, atenção a necessidades específicas de saúde e bem-estar, como atenção no SUS e quanto à dignidade menstrual — reforça o professor.
Rios frisa também a importância do incentivo à participação no mundo das ciências, das letras e do cinema.
— Sem a possibilidade de desenvolver narrativas e histórias de vida com voz próprias, grupos discriminados se veem privados de meios essenciais para a construção de si e também para a produção de condições públicas que permitam igual oportunidade de estima social. Nesta linha, o conjunto das medidas se revela construtivo, abrangente e com real potencialidade de enfrentar discriminação; ainda que não esteja explicitamente noticiado, certamente tais medidas tem condições de também alcançar mulheres privadas de liberdade e mulheres migrantes, que se encontram especialmente vulneráveis em todos esses âmbitos — acrescenta.
A advogada Gabriela Souza, sócia da Escola Brasileira de Direitos das Mulheres, vê no pacote o início de mudanças urgentes e necessárias na defesa dos direitos humanos das mulheres e um reconhecimento de que o Estado brasileiro está em débito com as mulheres, por ser o quinto país mais violento no mundo para elas.
— Precisamos estar atentas para que as novas medidas sejam cumpridas e fiscalizarmos também. Mas, mais do que isso, avançarmos cada vez mais e entendermos que estes direitos lançados hoje são importantes, mas que ainda precisamos de maiores mobilizações, orçamento, incentivos e vontade política para conseguirmos sair deste vergonhoso ranking e proteger todas as mulheres — alerta Gabriela.
Confira as medidas anunciadas pelo governo nesta quarta (8):
Equiparação salarial
- Lula enviará para análise de deputados e senadores um projeto de lei para promover a igualdade salarial entre homens e mulheres que exerçam a mesma função, ponto já previsto na legislação atual. Segundo o governo, o texto prevê medidas para que empresas sejam mais transparentes e para fortalecer a fiscalização e o combate à discriminação salarial
Dignidade menstrual
- Anúncio de decreto com o compromisso de distribuição gratuita de absorventes no Sistema Único de Saúde (SUS)
Segurança
- Investimento de R$ 372 milhões na implantação de 40 unidades da Casa da Mulher Brasileira, com recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública
- Doação de 270 viaturas para a Patrulha Maria da Penha nos 26 estados e no Distrito Federal, dentro do Programa Mulher Viver sem Violência
Cota para mulheres vítimas de violência
- Anúncio de decreto que regulamenta a cota de 8% da mão de obra para mulheres vítimas de violência em contratações públicas na administração federal direta, autarquias e fundações
Dia Marielle Franco
- Criação do Dia Nacional Marielle Franco, lembrado a cada 14 de março, data em que a vereadora Marielle Franco, da cidade do Rio de Janeiro, e o motorista Anderson Gomes foram assassinados. A ação visa conscientizar contra a violência política de gênero e de raça
Trabalho sem violência e assédio
- Ratificação do primeiro tratado internacional a reconhecer o direito de todas as pessoas a um mundo de trabalho livre de violência e assédio, incluindo violência de gênero: a Convenção 190 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Entre outras medidas, a Convenção 190 amplia conceitos de assédio sexual e moral no trabalho
Assédio no serviço público
- Criação de uma política de enfrentamento ao assédio sexual e moral e discriminação na administração pública federal
Equidade no SUS
- Criação do Programa Nacional de Equidade de Gênero, Raça e Valorização das Trabalhadoras no Sistema Único de Saúde. A portaria foi publicada no Diário Oficial da União desta quarta (8)
Construção de creches
- Retomada das obras de 1.189 creches que estavam paralisadas
Formação
- Abertura de vagas em cursos e programas de educação profissional e tecnológica para 20 mil mulheres em situação de vulnerabilidade nos próximos dois anos
Bolsa Atleta
- Assinado decreto que determina a licença-maternidade para integrantes do programa. A medida garante o recebimento regular das parcelas do programa voltado para atletas de alto desempenho até que a beneficiária possa iniciar ou retomar a atividade esportiva
Financiamento do cinema
- Lançamento do edital Ruth de Souza de Audiovisual, que dará suporte a projetos inéditos de cineastas brasileiras para realização do primeiro longa-metragem. Serão R$ 10 milhões em investimentos
Premiação para escritoras
- Serão destinados R$ 2 milhões ao Prêmio Carolina Maria de Jesus para livros inéditos escritos por mulheres
Ciência e pesquisa
- Política Nacional de Inclusão, Permanência e Ascensão de Meninas e Mulheres na Ciência, Tecnologia e Inovação. O CNPq deverá disponibilizar R$ 100 milhões para financiar projetos de mulheres nas ciências exatas, engenharia e computação