Uma portaria da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul (Seduc) que permitirá que estudantes da rede estadual com menos de 75% de frequência façam recuperação para avançar de ano foi tema do quadro “Mais Vozes”, dentro do programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, nesta quinta-feira (26). Publicado em 30 de dezembro, o documento estabelece que esses alunos, assim como aqueles que obtiverem nota inferior a 6,0, recebam materiais adicionais e façam uma prova ou um trabalho no início do ano. Até então, quem não tivesse esse percentual de presença era automaticamente reprovado.
Foram ouvidos a presidente do Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul (CEEd/RS), Fátima Ehlert; a diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Claudia Costin; o doutor em Educação e professor do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS), Gregório Grisa; e a presidente do Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (Cpers), Helenir Schürer.
Fátima explicou que uma das ações realizadas pela Seduc diz respeito ao ano letivo de 2022, abrindo a possibilidade para que os alunos que não alcançaram a média ou não tiveram a frequência mínima exigida tenham uma nova oportunidade. Eles terão a possibilidade de receber um plano de recuperação individualizado para, nas férias, fazer uma nova avaliação e, então, ter seu resultado final. Outra medida se refere a 2023 e regulamenta essa proposta, prevendo que as escolas a incluam dentro do seu regimento escolar, enfatizando a frequência igual ou superior a 75% e a média anual por componente curricular igual ou superior a seis pontos.
— Se chega ao final do ano com um número expressivo de alunos que não tiveram esse alcance para poderem progredir para o ano seguinte. Então, a Secretaria faz esse movimento de oportunizar aos alunos essa nova possibilidade — disse.
Claudia, por sua vez, destacou que o Rio Grande do Sul é o Estado que mais reprova no Brasil e que pesquisas em educação mostram que reprovar não melhora a aprendizagem dos alunos. Além disso, apontou que reprovações sucessivas levam ao abandono escolar e à distorção idade-série. Por isso, não enxerga a medida como um problema, mas sim o excesso de reprovação no Estado:
— Pernambuco é o Estado que tem o melhor Ensino Médio e eles têm uma reprovação baixíssima. Precisamos prestar atenção, como um Estado que tem um nível socioeconômico bem mais baixo consegue ter um Ensino Médio tão melhor do que o Rio Grande do Sul e sem reprovar. Vamos estudar outros modelos, não é possível continuarmos assim.
Já Grisa ressaltou que a previsão da realização de uma avaliação entre os períodos letivos mesmo para quem não alcançou a frequência de 75% está chancelada na legislação nacional e que, desde 1997, uma resolução do Conselho Estadual de Educação prevê atividades complementares compensatórias de infrequência, inclusive fora do período letivo. Na visão do professor, a portaria apenas possibilita uma nova avaliação entre os períodos letivos para esses alunos que antes eram automaticamente reprovados, o que é interessante no contexto atual, diante dos impactos da pandemia.
— O Rio Grande do Sul tem um índice muito alto de reprovação perto dos outros Estados. Há uma evidência sólida na educação que mostra que a reprovação nunca é interessante, os efeitos negativos da reprovação são muito maiores do que qualquer efeito positivo que ela possa ter. Acho que, em um contexto de crise econômica e de aumento da vulnerabilidade social, trata-se de uma medida que flexibiliza algo relevante do ponto de vista educativo — disse.
A presidente do Cpers, no entanto, afirmou que a instituição recebeu a proposta da Seduc com grande preocupação, principalmente porque fere a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), que aponta que somente o aluno que tiver 75% de presença na escola terá condições de aprendizagem e que, aqueles com menos do que isso, não poderão ser aprovados.
— A nossa preocupação com essa proposta é que pareça um desestímulo para o aluno frequentar a escola. Nós, que estamos na escola, sabemos a dificuldade que temos de ter o contato com a família, de que os alunos e a família se preocupem com a frequência. Abrindo esse precedente, com certeza a nossa educação vai cair substancialmente — alertou.