O caso de 998 fósseis do período Cretáceo contrabandeados no Brasil e apreendidos na França teve um desfecho na terça-feira (24). Após um acordo entre o Ministério Público Federal (MPF) e a justiça francesa, uma cerimônia na cidade portuária francesa Le Havre marcou a repatriação dos fósseis brasileiros, que foram comercializados de forma ilegal para a França. O material voltará ao Brasil e deve ficar no Museu de Paleontologia da Universidade Regional do Cariri (Urca).
Tudo começou em 2013, quando os bens foram apreendidos por agentes franceses. Na época, o MPF abriu inquérito para apurar venda ilegal de fóssil pela internet. De acordo com o MPF, o material inclui 34 caixas contendo 345 pedras de animais fossilizados e 648 pequenos quadrados de animais e plantas em formato de fóssil, todos oriundos da Chapada do Araripe, no Cariri cearense.
O secretário de Cooperação Internacional do MPF, Hindemburgo Chateaubriand, participou da solenidade e destacou que, ao longo de quase uma década de investigação, diante da importância e da complexidade do caso, várias instituições e autoridades brasileiras e francesas se envolveram nas diligências para solucionar a questão. Rafael Rayol, procurador da República em Juazeiro do Norte (CE), também participou da cerimônia na França. Ele atuou nas investigações do caso, que culminou, em 2019, na condenação de brasileiros pelo crime de contrabando. O processo envolvendo estrangeiros ainda está em andamento em virtude da necessidade de expedição de cartas rogatórias aos respectivos países.
Na solenidade de terça-feira, professores universitários e paleontólogos brasileiros e franceses participaram da entrega do material. Na atividade, foi conferido o material que data do período Cretáceo, período de tempo correspondente de 145 a 65 milhões de anos. Também compuseram a comitiva brasileira que acompanhou os trabalhos em Le Havre o ministro da Cidadania, Ronaldo Vieira Bento, o embaixador do Brasil em Paris, Luiz Fernando Serra, a encarregada de negócios do Brasil perante a Unesco, Regiane de Melo, o vice-reitor da Universidade Regional do Cariri, Carlos Kleber Nascimento de Oliveira.
Já inventariados, os bens serão devidamente preparados para envio de avião diretamente ao Aeroporto de Fortaleza e depois serão transportados até o Museu de Paleontologia da Urca. Estima-se prazo de 30 dias para que seja concluída a logística de transporte. A Urca é responsável pela gestão do Geopark Araripe, museu de paleontologia que reúne importante acervo de registros geológicos do período Cretáceo presentes na região. O museu é reconhecido pela Unesco como o primeiro geoparque das Américas.
Acordo internacional
O pedido para devolução dos fósseis foi feito à França no fim de 2019 por Rayol, por meio da Secretaria de Cooperação Internacional do Ministério Público Federal (SCI/MPF). A solicitação foi amparada por laudos paleontológicos que certificaram a origem brasileira dos fósseis. A sentença que determinou a repatriação foi proferida pela Corte de Apelação de Lyon em fevereiro de 2020. Trata-se da primeira decisão definitiva do Judiciário francês em relação a pedidos de repatriação de fósseis feitos pelo MPF ao país europeu.
Há outros dois casos em tramitação que envolvem um esqueleto quase completo de pterossauro da espécie Anhanguera com quase quatro metros de envergadura e outros 45 fósseis, que incluem tartarugas marinhas, aracnídeos, peixes, répteis, insetos e plantas, alguns com milhões de anos. Esse material está avaliado em quase 600 mil euros (R$ 4 milhões, aproximadamente, pelo câmbio atual) – dada a raridade, o interesse científico e a qualidade de preservação.
No fim de 2019, o procurador e integrantes da SCI/MPF participaram de reuniões com autoridades do MP e do Judiciário da Alemanha, França, Itália e Suíça para discutir a repatriação de fósseis brasileiros enviados ilegalmente para diversos países do bloco europeu.
São milhares de exemplares retirados sem autorização do território da Chapada do Araripe. Os encontros foram realizados na sede da Agência Europeia de Cooperação Jurídica Internacional (Eurojust) em Haia, Holanda.
– Esperamos que todo esse material já apreendido e à disposição da Justiça também seja devolvido à sociedade brasileira, para que possa servir a fins científicos e museológicos – concluiu Rayol.