Aos poucos, escolas no Brasil e no mundo estão retomando as atividades e dando início ao ano letivo de 2021, após um difícil – e, para muitos, aparentemente interminável – 2020.
Na maior parte dos Estados brasileiros, as aulas, total ou parcialmente presenciais, no ensino público e privado, estão previstas para começar até março. Com a pandemia, os desafios são muitos, assim como as formas de atender os alunos, já que as aulas poderão ser presenciais, remotas ou mesmo em um modelo híbrido, mesclando as duas modalidades. As orientações variam de local para local.
Em resolução de dezembro de 2020, o Conselho Nacional de Educação (CNE) garante a autonomia de cada localidade. Mas as escolas devem, pelo menos no Ensino Fundamental e no Ensino Médio, cumprir a carga horária mínima de 800 horas anuais. Pode-se também aumentar os dias letivos e a carga horária do ano letivo de 2021 para cumprir, de modo contínuo, os objetivos de aprendizagem e desenvolvimento previstos em 2020.
— As escolas podem, então, desenvolver um replanejamento, flexibilizando a proposta curricular, de modo que alunos tenham a possibilidade de fazer a recuperação da aprendizagem e, depois, as escolas iniciam o cumprimento do currículo previsto para 2021 — explica a presidente do CNE, Maria Helena Guimarães.
Segundo Maria Helena, a recomendação é que os estudantes não sejam reprovados no ano letivo de 2020, pois isso pode fazer com que mais alunos desistam de estudar e abandonem as escolas. Como será difícil cumprir à risca todo o conteúdo previsto para 2020 e para 2021, as escolas podem rever a proposta curricular e selecionar os conteúdos, competências e habilidades que são essenciais para desenvolverem com os alunos
Importância do ensino presencial
O ano que passou ainda reflete uma série de desafios. Citando preocupação com as desigualdades que afetam estudantes vulneráveis e influenciam na reprovação, na distorção idade-série e no abandono escolar, o chefe de educação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) no Brasil, Ítalo Dutra, alerta que as crianças que deixaram de ter aulas presenciais e não participaram de atividades remotas perderam o vínculo com a escola e precisam ser trazidas de volta ao ambiente de ensino.
— Precisamos ir atrás desses 5,5 milhões de crianças e adolescentes e garantir que tenham acesso à escola já, imediatamente. E, nesse contexto, trabalhar para que a gente faça uma reabertura segura das escolas, onde as condições epidemiológicas permitirem, abrindo e fechando se houver piora ou melhora, mas a gente não pode deixar que milhões de crianças e adolescentes no país não tenham acesso à educação — afirma Dutra.
Precisamos ir atrás desses 5,5 milhões de crianças e adolescentes e garantir que tenham acesso à escola já, imediatamente. E, nesse contexto, trabalhar para que a gente faça uma reabertura segura das escolas
ÍTALO DUTRA
Chefe de educação do Unicef no Brasil
O retorno, principalmente para as atividades presenciais, tem gerado manifestações. No Rio de Janeiro, por exemplo, professores da rede pública estadual e da rede municipal da capital carioca aprovaram greve contra o retorno às atividades de forma presencial em meio à pandemia.
Mas especialistas em educação afirmam que, quase 11 meses depois do início da pandemia, Estados e prefeituras deveriam estar mais bem preparados para essa volta às escolas, algo fundamental especialmente para as famílias mais pobres.
— A gente já teria que ter em todas as redes de ensino do Brasil o planejamento pronto, a formação de professores, a avaliação dos alunos, os protocolos todos já registrados e com a formação dos profissionais para poder executá-los. Então, estamos atrasados. O Brasil é um dos países que mais permaneceram com escolas fechadas e, infelizmente, agora, no começo de 2021, a gente tem ainda famílias perdidas, secretarias estaduais e municipais sem um comunicado claro para as famílias, para os alunos, para a população brasileira — diz a presidente-executiva do Todos pela Educação, Priscila Cruz.
O que é jornalismo de soluções, presente nesta reportagem?
É uma prática jornalística que abre espaço para o debate de saídas para problemas relevantes, com diferentes visões e aprofundamento dos temas. A ideia é, mais do que apresentar o assunto, focar na resolução das questões, visando ao desenvolvimento da sociedade.
GZH destaca, aqui, algumas iniciativas no Brasil e no mundo voltadas a tornar possível um retorno seguro às aulas presenciais. Confira:
Brasil
Levantamento feito pela Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep) indica que não há previsão do retorno às atividades ou do modelo a ser adotado nas aulas na Bahia e em Rondônia. O Amazonas, que chegou a retomar as atividades presenciais em 2020, também não tem definição, por conta do agravamento da pandemia naquele Estado.
Mato Grosso e Acre decidiram retomar as aulas em fevereiro de forma remota, seja pela internet ou por meio de apostilas. Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Espírito Santo, Maranhão e Ceará ainda não definiram o modelo a ser adotado, mas começam as aulas entre fevereiro e março. Os demais Estados deverão adotar um modelo híbrido de ensino.
Na rede particular, segundo o presidente da Fenep, Ademar Batista Pereira, há uma grande diversidade. Cada escola, levando em consideração o local onde está inserida, o nível de contaminação de cada cidade, os professores, os estudantes e as famílias, deve decidir a melhor forma de retomar as atividades.
— Depende da escola, do espaço físico da escola. Cada uma tem o seu plano de retorno. A rede privada é muito diversa, tem escola grande, escola pequena. Então, pode ter um espaço maior e pode vir com todos os alunos, se conseguir fazer o distanciamento. Depende muito do projeto de retorno que a escola fará — diz.
A entidade preparou um plano estratégico de retomada das atividades, com uma série de orientações de segurança.
— A gente aprendeu que a doença não vai embora tão cedo e que a gente precisa aprender a conviver com ela, a ter um projeto de vida apesar da pandemia, apesar do coronavírus — defende Pereira. — A gente aprendeu muita coisa, aprendeu que pode ser feita muita coisa a distância, mas também aprendeu que o ensino presencial para crianças e jovens é determinante para o aprendizado — acrescenta.
Rio Grande do Sul
O governo Eduardo Leite avalia tornar obrigatória a presença de estudantes nas aulas de escolas públicas e privadas de ensinos Fundamental, Médio e Superior do Rio Grande do Sul em 2021. O pedido foi levado pelo Sindicato do Ensino Privado (Sinepe) e é estudado pelo Gabinete de Crise do Palácio Piratini, grupo formado por representantes de várias secretarias.
Caso a medida seja aprovada, a presença será obrigatória, mas não diária, uma vez que o Estado manterá o ensino híbrido, modelo que ganhou força na pandemia para evitar aglomerações.
As turmas seriam divididas pela metade e cada grupo se revezaria em sala de aula a cada semana ou intervalo de dias definido pela escola. A lotação seria, portanto, de no máximo 50% da sala de aula, com distanciamento entre as cadeiras.
Quem ficar em casa nos dias de período remoto receberá atividades para realizar a distância, enquanto os colegas estarão na escola. Em seguida, as turmas se invertem: quem estudava em casa irá para a escola e quem estava na aula presencial ficará no remoto.
A presença seria exigida para todos, exceto estudantes e professores que fazem parte dos grupos de risco para a covid-19. No ano passado, pais podiam optar, mesmo com filhos saudáveis, se os levariam à escola ou se os manteriam no ensino 100% remoto
Rio de Janeiro
A volta às aulas nas escolas do município do Rio de Janeiro foi marcada para segunda-feira (8), inicialmente em modelo remoto. Os estudantes vão receber materiais didáticos impressos e atividades para desenvolver em casa. Os estudantes e professores receberão, por meio do Programa Conect@dos, um pacote de dados com 1 giga para acessar a internet e acompanhar as aulas.
Todo o sistema será operado na plataforma de ensino remoto Rio Educa, criada pela prefeitura. Os conteúdos poderão ser vistos também pela TV por meio do canal municipal MultiRio. Com o retorno remoto, a Secretaria de Educação vai fazer duas semanas de acolhimento socioemocional, para dialogar com responsáveis pelas crianças e adolescentes e com os profissionais de educação.
O planejamento da prefeitura do Rio prevê o retorno das aulas presenciais em 24 de fevereiro. O horário, segundo o secretário de Educação, ainda será reduzido, entre 10h e 15h. O uso de máscara será obrigatório, exceto para crianças de até três anos de idade. Haverá distanciamento de 1,5 metro, horário escalonado de entrada, saída e de recreio, higienização frequente das mãos, refeições nas salas de aula e bebedouros adaptados para encher copos ou garrafas, sempre higienizando as mãos antes. Os estudantes e profissionais de educação incluídos em grupos de risco não vão participar das atividades presenciais.
São Paulo
A volta às aulas na rede pública estadual de São Paulo também ficou para 8 de fevereiro. A decisão sobre o retorno das aulas caberá a cada um dos 645 prefeitos do Estado. Eles podem, por exemplo, adiar ainda mais o reinício das aulas. Além disso, foi suspensa a obrigatoriedade da presença dos alunos nas salas de aula enquanto o Estado estiver nas fases 1-Vermelha ou 2-Laranja, as mais restritivas do Plano São Paulo.
Mas o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou, por meio de liminar, a suspensão da volta das aulas presenciais em escolas públicas (estaduais e municipais) e privadas em cidades que estejam nas fases vermelha e laranja do Plano SP de retomada econômica durante a pandemia.
Os protocolos para a retomada vão ser mantidos. Por meio de um decreto publicado em dezembro, as escolas de educação básica (da Educação Infantil ao Ensino Médio) poderão receber até 35% dos alunos matriculados, mesmo que estejam localizadas em regiões da Fase 1-Vermelha do Plano São Paulo, onde só os serviços considerados essenciais podem funcionar.
Outros países
França
Os alunos retornaram às escolas francesas em junho. De lá para cá, casos de covid-19 entre estudantes fizeram colégios fecharem. O governo sustenta, porém, que as contaminações aconteceram fora do ambiente escolar.
Irlanda
A capital irlandesa, Dublin, já teve dois lockdowns. Em março, as escolas foram fechadas. Já em outubro, permaneceram abertas. Outros lugares, como bares e restaurantes, só podiam funcionar para entrega.
Itália
As escolas reabriram em setembro na Itália. Em novembro, as instituições de Ensino Médio foram fechadas. Esses alunos voltaram às aulas em janeiro, mas 50% do conteúdo será dado a distância.
Reino Unido
Para conter a segunda onda da pandemia, o Reino Unido chegou a fechar bares, mas não escolas. Na Inglaterra, mesmo com o início da vacinação, Londres voltou a fechar hotéis, restaurantes e teatros. Já as escolas podem ficar abertas.