Com perfil conciliador e técnico, Carlos Decotelli chega para comandar o Ministério da Educação como uma vitória de militares, na tentativa de buscar interlocução com os demais Poderes e a sociedade civil após a saída tumultuada de Abraham Weintraub.
O ex-ministro deixou o cargo após uma série de desgastes com o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso, onde se tornou desafeto do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Não à toa, Decotelli, o primeiro negro ministro do governo de Jair Bolsonaro, adotou tom conciliador nas primeiras palavras após ter a indicação confirmada pelo presidente.
— É o tom que eu sei fazer, vim para fazer o que eu sei fazer. O que eu sei fazer é sala de aula, é conversa, é gestão, é ajuste, é muito diálogo e construção de projetos a serem entregues para a educação. A minha prioridade será trabalho, trabalho, trabalho com gestão integrada — disse em entrevista à CNN Brasil.
Pessoas da área de educação avaliam que a nomeação de Decotelli, o terceiro ministro da Educação do governo Bolsonaro, pode significar um distensionamento nas relações e uma reconstrução de pontes derrubadas por Weintraub e pelo antecessor, Ricardo Vélez.
Sua escolha tem sido interpretada em Brasília como uma tentativa de diminuir a influência do escritor Olavo de Carvalho na pista.
— O fato de ter participado do governo de transição direciona seu posicionamento de alinhamento com a linha ideológica do governo como um todo (sem olavismo) — afirma Andressa Pellanda, coordenadora-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
Após passar para a reserva da Marinha, ele seguiu carreira na educação, sempre nos campos de administração e finanças. Passou parte de sua formação no exterior, realizando seu pós-doutorado na Alemanha e o doutorado na Universidade Nacional de Rosário, na Argentina.
O novo ministro foi professor da área de finanças na Fundação Dom Cabral e na Fundação Getúlio Vargas (FGV), além de ter lecionado e ter sido criador do curso de pós-graduação em finanças da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Na direção do FNDE, entre fevereiro e agosto de 2019, teve uma posição apagada e criticada por setores da sociedade civil ligados à educação. O fundo é responsável pela maioria das ações e programas relacionados à educação básica do país. No entanto, durante sua gestão, teve dificuldades até para levar adiante licitações para abastecer as atividades.
Decotelli chega ao MEC sob o aval da cúpula militar, em uma sugestão dos almirantes do governo. O almirante Flavio Rocha (Secretário de Assuntos Estrategicos) teve papel essencial na aproximação do novo ministro com o presidente.
Decotelli é considerado próximo do próprio Bolsonaro. Integrantes do governo ressaltam sua lealdade em todos os momentos, mesmo quando afastado da presidência do FNDE e quando o governo sofreu baixas consideráveis, como a saída do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro.
Ele deixou o FNDE no ano passado para dar a lugar a Rodrigo Sérgio Dias, indicado pelo chamado "centrão" na Câmara e o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), como fatura política pela aprovação da reforma da Previdência. Dias, porém, acabou sendo exonerado no fim de 2019.
Ao precisar ceder seu cargo no FNDE, Decotelli ganhou a promessa de uma secretaria no próprio MEC - a Secretaria de Modalidades Especializadas de Educação (Semesp), que lida com o direito à educação de pessoas com deficiências, população do campo e indígenas, por exemplo. Descontente com a situação, sem alarde, ele acabou deixando o MEC.