O fim da obrigatoriedade de empregados pagarem contribuição sindical, definida pela reforma trabalhista de 2017, tem levado os sindicatos no país a traçarem estratégias para garantir a arrecadação. Uma delas promete polêmica. Algumas entidades no Rio Grande do Sul estudam restringir os avanços das convenções coletivas – como reajustes, pagamentos de adicionais noturnos e auxílio-creche –, apenas aos empregados que sejam sindicalizados e paguem a taxa negocial. Os demais não seriam contemplados.
GaúchaZH apurou que pelo menos quatro grandes sindicatos no Estado consideram a restrição um "instrumento de justiça" porque beneficiaria quem efetivamente sustenta a organização da categoria e avaliam sua inclusão em futuras convenções. São eles: Sindicato dos Empregados do Comércio de Porto Alegre (Sindec), Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí (Sinmgra), Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Transporte de Porto Alegre (Stetpoa) e Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários Intermunicipais, Interestaduais, de Turismo e Fretamento do Estado (Sindirodosul).
– Há uma discussão enorme sobre essa possibilidade. Precisamos encontrar formas de sobreviver – resume José Ivori Oliveira Lima, assessor da diretoria do Sindirodosul.
O Sindec confirmou que estuda incluir a cláusula na próxima convenção, que vale para 2019 e 2020. "Não é justo somente uma parcela dos trabalhadores contribuírem, uma vez que os benefícios da negociação se estendem a todos comerciários", comunicou o sindicato em nota.
Para que essas propostas avancem, é preciso que sejam previstas nas convenções entre patrões e empregados _ ou seja, precisam ser aprovadas em assembleias da categoria. Nesses casos, os empregadores seriam obrigados a cumprir o acordo apenas junto aos funcionários sindicalizados e ficariam livres para decidir se esticariam as vantagens aos demais.
Questão é controversa no Judiciário
O Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS) informa que, apesar da movimentação dos sindicatos, ainda não há registro de convenções que prevejam tal restrição no Estado. O procurador Marcelo Goulart, vice-coordenador do Núcleo da Liberdade Sindical do MPT gaúcho, afirma que quaisquer cláusulas nesse sentido seriam uma infração constitucional, uma vez que a Constituição diz em seu artigo 8º que os sindicatos representam toda categoria e não pode haver discriminação entre quem contribui ou não.
– Os sindicatos não podem condicionar sua representação a um pagamento de valor. Isso seria, inclusive, falta de solidariedade social. Mas, caso venha a ocorrer, o MPT poderá entrar com uma ação para anular essa cláusula – afirma.
Goulart considera a ideia com pouco poder de eficácia, uma vez que os patrões dificilmente pagariam os reajustes apenas a um grupo de empregados, deixando os demais desamparados.
– O efeito talvez fosse inverso, afastaria ainda mais os trabalhadores dos sindicatos – avalia o procurador.
Advogada especializada em Direito Trabalhista, Carolina Mayer Spina tem visão diferente. Entende que a reforma trabalhista e o fim do pagamento compulsório trouxeram novo entendimento da lei:
– Antes, o entendimento dominante era de que seriam ilegais convenções ou acordos coletivos destinados apenas aos sindicalizados, porque a contribuição era descontada de todos. No momento em que o pagamento se tornou facultativo, abriu-se a porta para que esse procedimento fosse considerado legal.
Carolina afirma que há decisões em primeiro grau que corroboram a opção de sindicatos negociarem apenas em favor dos seus sindicalizados, e a tese pode ganhar força daqui por diante. Um dos casos mais notórios é de 2010, quando um juiz da 30ª Vara do Trabalho de São Paulo decidiu que um trabalhador de empresa de segurança patrimonial que não contribuía com o sindicato não poderia auferir das vantagens negociadas pelo órgão.
Orientação ao trabalhador
- Como se trata de direito coletivo, o Ministério Público do Trabalho recebe e apura as denúncias que envolvem convenções coletivas.
- Trabalhadores de uma categoria cujo sindicato determine que os benefícios sejam restringidos poderão reclamar diretamente ao MPT caso se sintam injustiçados.
- A denúncia deve ser aberta neste site do MPT.
- Os casos serão analisados. Uma das medidas possíveis é a anulação desta cláusula.