Pelo menos sete dos 24 alunos que haviam sido desligados do curso de Medicina da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) no final do ano passado – após denúncia de fraude no sistema de cotas – já estão de volta à sala de aula. Por meio de liminar, eles conquistaram na Justiça o direito de reassumir suas vagas e a possibilidade de retornarem imediatamente ao curso, cujo ano letivo iniciou no dia 6 de fevereiro.
– Esses estudantes foram reintegrados imediatamente a partir do momento em que a universidade foi notificada. Mas a UFPel vai recorrer ao Tribunal Regional Federal (TRF) em relação a essas decisões. A universidade respeita e cumpre a decisão, mas ao mesmo tempo tem o dever de seguir com o trabalho da comissão criada para cuidar desses casos – afirma o professor e assessor da reitoria da universidade, Alexandre Gastal.
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A denúncia que colocou em dúvida a veracidade da autodeclaração de raça dos então cotistas, e que levou à criação de uma comissão, foi protocolada pelo Setorial de Negros e Negras da UFPel junto à reitoria da universidade em agosto do ano passado. Um grupo formado por 12 pessoas, entre professores da UFPel e vinculadas ao Movimento Negro, passaram a avaliar as declarações dos 31 alunos denunciados e as compararam, a pedido do Ministério Público (MP), com características fenotípicas de cada um deles. Em dezembro, concluíram que 24 deles não correspondiam aos critérios.
O advogado de cinco dos sete estudantes que tiveram liminares deferidas, Pablo Ledebuhr, explica que a principal alegação para o reingresso dos acadêmicos sob o sistema de cotas foi em relação aos critérios de inserção adotados pela universidade. Segundo Ledebuhr, o que constava no edital da universidade, no momento do ingresso dos alunos, era o critério de auto-declaração. E foi este o utilizado pelos acadêmicos:
– Após a abertura das investigações, a verificação dos cotistas passou a ser feita a partir do fenótipo dos alunos, e por isso a comissão concluiu que 24 deles não correspondiam aos critérios. Só que a universidade só adotou esse critério depois do pedido do MP. Quando os alunos ingressaram na universidade, o critério utilizado era o da auto-declaração, que foi o que estes acadêmicos adotaram. Não houve ilegalidade no ato deles, pois eles respeitaram o edital – explicou.
Foi com base neste ponto que a Justiça de Pelotas deferiu as liminares. No despacho, o juiz Cristiano Bauer Sica Diniz alega que " (...) a UFPel, ao tempo do ingresso do aluno pelo regime de cotas, não adotou um critério estritamente fenotípico para seleção dos candidatos autodeclarados negros. Ao optar pelo sistema de autodeclaração, sem apontar os aspectos que seriam considerados para definir se um candidato era ou não negro, a instituição deixou em aberto a possibilidade de que candidatos se auto identificassem como negros também em função de sua ancestralidade (...)".
Acadêmicos terão direito a recuperar aulas perdidas
Como o retorno dos estudantes que haviam sido desligados do curso começou a ocorrer duas semanas após o início do ano letivo, o reitor da UFPel, Pedro Rodrigues Curi Hallal, garantiu que a instituição irá se encarregar de recuperar, para esses alunos, as aulas perdidas.
– No momento em que recebemos uma deliberação judicial, ela não é só para que o aluno seja admitido novamente na sala de aula, mas para que tenha os mesmos direitos e deveres dos demais. Por isso, se houve perda de conteúdo, ela será reparada.
As decisões da Justiça favoráveis aos acadêmicos, que estavam entre o 1º e o 6º semestres do curso, fez com que a universidade suspendesse temporariamente a ideia de abrir um edital específico para preencher as 24 vagas que haviam ficado em aberto.
– Decidimos esperar para ver como e quando serão concluídos esses processos, e ver também quantos alunos, no total, tiveram os vínculos restabelecidos pelas liminares. Somente depois disso iremos debater sobre quando o edital será aberto – explicou Gastal.