O governo do Estado e o Cpers/Sindicato realizam reunião na manhã desta terça-feira em um cenário marcado por problemas demais e soluções de menos. Em greve por tempo indeterminado, decretada na sexta-feira, os professores sentarão à mesa de negociação com possibilidades remotas de receber qualquer proposta financeira: o Piratini já antecipou que não oferecerá reajuste por não ter condições de pagá-lo.
Ao mesmo tempo em que precisa lidar com o movimento dos docentes, o governo enfrenta uma mobilização inédita de estudantes insatisfeitos, que ocupam, desde a semana passada, pelo menos cinco escolas. Para complicar o quadro, não há sequer certeza de que o Rio Grande do Sul tenha hoje um secretário de Educação. O titular, Vieira da Cunha, saiu de férias em plena crise, e há rumores de que não volte. Estaria em vias de deixar o governo para ser candidato à prefeitura de Porto Alegre pelo seu partido, o PDT. ZH entrou em contato com a Casa Civil ontem à tarde, para pedir uma manifestação oficial sobre a questão, mas não obteve retorno.
– Estamos encarando esse momento com grande preocupação, visto que não temos secretário da Educação atuando e que o momento econômico e político é complicado. As pessoas que decidem olham para o que está acontecendo nas escolas e lamentam, mas continuam sentadas no sofá sem fazer nada, porque não têm filho na escola pública, e o problema não os atinge diretamente – critica Berenice da Costa, presidente da Federação das Associações e Círculos de Pais e Mestres do Rio Grande do Sul.
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Responsável por tocar a Secretaria da Educação enquanto o titular não volta ou um novo secretário não é definido, o interino Luis Antônio Alcoba de Freitas antecipa que o foco da reunião de hoje entre governo e sindicato devem ser os itens da pauta que não envolvam reajuste salarial. Essa posição é rechaçada pelo Cpers.
– É inaceitável. Não tem como simplesmente voltarmos sem nada e sem uma luz para o futuro. Nossa expectativa é de que vamos apresentar nossa pauta e iniciar um processo de diálogo e de negociação verdadeiro. Vamos insistir que precisamos de reajuste e que o governo tem de fazer um esforço – afirma Helenir Aguiar Schürer, presidente do sindicato.
Freitas reconhece que a greve teve alguma adesão na Capital, na Região Metropolitana e em algumas cidades grandes do Interior, como Rio Grande, Pelotas e Passo Fundo, mas afirma que teria sido quase inexistente nos municípios pequenos. Cpers promete para hoje um balanço do primeiro dia de paralisação.
Além do fim do parcelamento de salários e do reajuste de 13,1% nos vencimentos, o sindicato também reivindica cumprimento da lei do piso – que hoje estaria 69,44% defasado, de acordo com o Cpers –, IPE com pleno atendimento e sem aumento de descontos, o fim do fechamento de turmas e escolas e a disponibilidade de merenda para todos os alunos.
Enquanto a negociação com os professores parece ser garantia de dias difíceis pela frente, Freitas tem percorrido as escolas ocupadas para conversar com alunos e professores, na esperança de desatar o nó da onda de ocupações. Segundo ele, a secretaria está empenhada em atender às reivindicações apresentadas, de forma a demover os alunos da mobilização que tem impedido a realização de aulas.
Uma iniciativa desse tipo parece ter ocorrido no Colégio Paula Soares, de Porto Alegre. A vice-diretora da tarde, Rudileia Baré Neves, conta que um engenheiro foi enviado à escola ontem para verificar problemas no telhado, que teriam causado alagamento depois da chuva no fim de semana.
– A partir da luta dos estudantes, o governo se mostrou sensível. O problema no telhado se estende por anos e várias solicitações foram feitas, sem atendimento. Agora, parece que teve atendimento – afirma a vice-diretora.
Círculos de pais e mestres estão preocupados com ocupações
Rudileia conta que ontem chegou a haver um momento de tensão, com ânimos acirrados, envolvendo pais que não conseguiram deixar os filhos na escola e não tinham para onde encaminhá-los, mas diz apoiar a mobilização dos estudantes. Ela relata, por exemplo, que os ocupantes descobriram ontem que o corrimão de uma escadaria do colégio estava dando choques elétricos. Depois, soube-se dos alunos pequenos que as descargas eram coisa antiga.
– Eu me forjei na luta e apoio o movimento, que é legítimo. Jamais poderia me colocar contra – diz ela.
Para Ana Maria de Souza, diretora do Colégio Protásio Alves, também da Capital, greve dos professores é algo que já faz parte da rotina das escolas gaúchas, mas o levante dos alunos é um fenômeno "novo para todos". O Protásio Alves vive uma situação ímpar: por causa de estragos em temporal ocorrido no final de janeiro, só conseguiu iniciar as aulas no fim de março. Mal começou, o ano letivo acabou interrompido pela ocupação.
– O movimento dos alunos é importante, porque nos dá um certo apoio, mas é diferente do nosso movimento – afirma Ana Maria.
O próprio secretário interino da Educação considera justificável o descontentamento dos alunos, mas Berenice da Costa, representantes dos Círculos de Pais e Mestres, ataca o movimento. Entende que as ocupações são um reflexo dentro da escola do momento de efervescência política nacional.
– Os jovens estão sendo influenciados pelo descontrole social. E nós, adultos, perdemos a mão. Isso vai virar um modismo irresponsável. É um absurdo alunos serem impedidos de entrar na escola para ter aulas. Espero que o governo e o Cpers fechem algum acordo e que não deixem entrar aqui no Estado esse tipo de movimento com alunos na rua, passando a noite na escola – afirma.