Uma briga entre dois estudantes do Ensino Médio do Colégio de Aplicação da Universidade Federação do Rio Grande do Sul (CAp UFRGS) gerou repercussão na escola e foi parar na polícia. Enquanto um aluno branco é investigado por injúria racial, o outro, negro, é suspeito de ter ameaçado o colega. Eles negam.
Os estudantes têm 16 e 17 anos e teriam desavenças. Segundo investigação da Polícia Civil, no dia 12 de maio, o aluno branco teria feito gestos em direção ao aluno negro imitando um macaco.
No dia 19, o Colégio de Aplicação abriu uma Comissão Disciplinar para ouvir os envolvidos.
Ao tomar depoimentos de 17 alunos e ouvir uma professora, a comissão concluiu que houve ato de injúria racial cometido pelo aluno branco. Ele negou, dizendo que fazia gesto de dúvida e surpresa em direção a um terceiro colega. Também informou que estava sendo ameaçado nas dependências da escola.
Ao mesmo tempo, os familiares dos dois estudantes procuraram a polícia. No dia 17 de maio, a família do aluno branco registrou ocorrência alegando que o adolescente era alvo de ameaças por parte do aluno negro e de outros colegas. A família do aluno negro, por sua vez, registrou queixa no dia 19 dizendo que ele havia sido vítima de injúria racial.
Os dois casos foram investigados na 3ª Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (3ª DPCA), cuja titular é a delegada Larissa Fajardo. Conforme a delegada, ao ouvir pessoas que presenciaram o momento em que o aluno branco gesticulou em direção ao estudante negro, foi constatado de que se tratava de ato de discriminação racial.
— Ficou comprovado que houve o gesto fazendo alusão a um macaco. Não tem explicação lógica para o gesto a não ser o cunho racista. Mas ele nega — diz a delegada.
O inquérito de injúria racial foi concluído no dia 30 de agosto e remetido ao Juizado da Infância e Juventude (JIJ). Em contato com a reportagem, a defesa do adolescente informou que a família, muito abalada, não iria se manifestar.
Ameaças ainda em investigação
Já a investigação envolvendo as ameaças direcionadas ao aluno branco ainda não foi concluída — apesar de a delegada ter chegado ao entendimento de que o aluno negro ameaçou o colega, ainda é necessário ouvir outros dois estudantes que também são investigados.
— Não concluímos esse procedimento porque precisamos identificar outros dois colegas que praticaram essas ameaças. Pela prova testemunhal colhida até aqui, parece evidente que houve, sim, ameaças por parte desse aluno que também foi vítima da injúria racial. Mas ele também nega — frisa.
A família do aluno negro publicou, no dia 13 de setembro, uma carta aberta pedindo o arquivamento do inquérito que acusa o adolescente de ameaças e reivindicando medidas para letramento racial e discussão antidiscriminatória na escola.
A mãe do jovem disse que a conduta do filho sempre foi intacta na escola, onde ele estuda há mais de 10 anos, e que, após ter sido vítima de injúria racial e apontado como autor de ameaças, está fazendo acompanhamento psicológico.
— Ele não queria mais ir na aula, seu rendimento escolar caiu. Agora, está sendo acusado de ameaças. É uma inversão de valores. A vítima se tornou um acusado — diz.
O Colégio de Aplicação informou, em parecer conclusivo do dia 5 de julho, que o ato de injúria racial vai contra o regimento geral da UFRGS, que diz que é falta gravíssima "praticar, induzir ou incitar, por qualquer meio, a discriminação ou preconceito de gênero, raça, cor, etnia, religião, orientação sexual ou procedência".
No entanto, considerou que a falta havia sido praticada por um aluno que ingressou em 2020 — portanto, não tinha participado das formações antirracistas da escola. Desse modo, a sanção deveria ser inclui-lo em "práticas pedagógicas com foco na educação para as relações étnico-raciais".
GZH entrou em contato diversas vezes com a direção do Colégio de Aplicação, sendo a primeira vez na sexta-feira (16), para entender que tipo de sanção havia sido aplicada ao aluno que cometeu o ato de injúria racial. Foi informada que o diretor Rafael Vasques Brandão estava em férias, e somente ele poderia falar sobre o assunto ao retornar do período de descanso, no início de outubro.
A reportagem não cita os nomes dos estudantes envolvidos para preservar a identidade de ambos, conforme previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).