A Justiça Federal rejeitou o pedido para anular a nomeação de Carlos Bulhões à reitoria da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O processo foi movido no ano passado por Rui Oppermann, ex-reitor, e Jane Tutikian, ex-vice-reitora da instituição. Eles formavam a chapa mais votada da lista tríplice, mas não foram escolhidos pelo presidente Jair Bolsonaro. Em nota conjunta, anunciaram que não vão recorrer da decisão.
Em sentença publicada na terça-feira (25), a juíza federal substituta Ana Maria Wickert Theisen, da 10ª Vara Federal de Porto Alegre, julgou improcedente a ação. Bulhões constava, ao lado de Patrícia Pranke, atual vice-reitora, em terceiro lugar na lista tríplice formulada pelo Conselho Universitário (Consun) - a chapa recebeu 3 dos 77 votos.
Oppermann e Jane estiveram à frente da instituição entre 2016 e 2020 e buscavam a reeleição. Receberam 45 dos 77 votos. Na ação movida contra a União, a dupla argumentou que a escolha pela chapa menos votada feria o princípio da autonomia universitária e que a lei havia sido interpretada de maneira inconstitucional por Bolsonaro - é o presidente da República que tem a atribuição de nomear os reitores de universidades públicas, podendo optar por qualquer um dos indicados.
Advogado do processo, Francis Bordas entende que a escolha por qualquer uma das chapas presentes na lista tríplice é inconstitucional porque baseada em lei de 1968, criada durante o período da ditadura militar - portanto, anterior à Constituição Federal, de 1988, que reforça a autonomia universitária.
A partir da Constituição, o comum era que os presidentes nomeassem a chapa mais votada, que estivesse no topo da lista tríplice, o que chancelaria os votos da comunidade acadêmica e dos conselhos universitários, tradição que se quebrou com Bolsonaro.
A juíza Ana Maria Wickert Theisen considerou que não houve atitude autoritária por parte do presidente. Ela apontou que, embora tivessem recebido menos votos, Bulhões e Patrícia foram indicados na lista tríplice, corroborada pelo Consun.
"Não encontro base fática ou legal para o argumento de que a escolha do segundo ou terceiros colocados na lista importa em autoritarismo ou violação ao princípio da gestão democrática. Afinal todos os componentes, ainda que em maior ou menor grau, receberam votos e tiveram suas candidaturas chanceladas pelo Conselho Universitário", escreve Ana Maria na sentença.
A decisão da juíza também vai ao encontro do Supremo Tribunal Federal (STF), que entendeu, em julgamento realizado no ano passado, que o presidente da República não é obrigado a escolher os nomes mais votados nas listas tríplices enviadas pelas instituições. Os ministros julgaram uma ação movida pelo Partido Verde (PV) que questionava a opção do presidente por 22 reitores que não constavam no topo das listas tríplices.
Em manifestação encaminhada nesta quinta-feira (27) à reportagem de GZH, Oppermann e Jane informaram que, embora caiba recurso, eles vão acatar a sentença da juíza. Argumentaram, no entanto, que a decisão é fundamentada "em leis anacrônicas, que têm sua origem no período da ditadura militar e, como outras da mesma natureza, não podem servir de referência para o momento democrático atual".
Na nota, Oppermann e Jane mencionam a abertura do processo junto ao Ministério da Educação pelo Conselho Universitário da UFRGS (Consun), que pediu a destituição de Carlos Bulhões e de Patrícia Pranke. O Ministério da Educação arquivou este pedido de destituição.
A UFRGS informou, por meio da assessoria, que não iria se manifestar sobre este processo, já que o caso não é um assunto da instituição, mas da atual gestão. Já a assessoria do gabinete do reitor disse que não tem nada a declarar.
A sentença da juíza Ana Maria Wickert Theisen fixou honorários que devem ser pagos aos advogados da União, no valor de R$ 1 mil, o que é de praxe em processos judiciais. Quem terá de pagar é a parte autora do processo.
Veja a íntegra da manifestação de Rui Oppermann e Jane Tutikian
"Acatamos a sentença da Juíza Ana Maria Wickert Theisen, da mesma forma que acatamos as recentes decisões do STF, fundamentadas em leis anacrônicas, que têm sua origem no período da ditadura militar e, como outras da mesma natureza, não podem servir de referência para o momento democrático atual. Entendemos que a autonomia universitária e a gestão democrática garantidas pela Constituição Federal deveriam ser norteadoras das decisões judiciais. Os retrocessos decorrentes de nomeações espúrias, onde não houve o respeito à vontade democrática das comunidades universitárias e dos Conselhos Universitários já podem ser percebidos.
Preferimos nos alinhar às decisões do Conselho Universitário da UFRGS que, de forma majoritária, recomendou a abertura de um processo de impedimento daqueles que hoje ocupam a Reitoria em desrespeito à vontade expressa pela UFRGS e seu Conselho maior."