Recém-escolhido, ao lado de Jane Tutikian, para seguir à frente da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) na gestão 2020/2024, após uma consulta à comunidade acadêmica para a reitoria encerrada na noite de segunda-feira (13), Rui Vicente Oppermann celebra a conquista ao mesmo tempo em que sabe que há muito para fazer.
Reitor na atual gestão (2016-2020) e vice na gestão de Carlos Alexandre Netto (2008-2016), Oppermann espera por relações mais amistosas com o Ministério da Educação (MEC), que acaba de ter anunciado um novo ministro – Milton Ribeiro, pastor da Igreja Presbiteriana em Santos (SP) – e prevê ações importantes para a continuidade do ensino em meio à pandemia.
A decisão da comunidade acadêmica, contudo, não é, necessariamente, a que valerá para definir quem vai assumir a reitoria. A consulta acadêmica, realizado pela primeira vez de forma online, é apenas um dos passos rumo a essa definição, que passa ainda pelo Conselho Universitário (Consun), órgão máximo da universidade, que formaliza a lista tríplice na ordem que definiu a comunidade acadêmica e a envia para o Ministério da Educação. É do governo federal a prerrogativa de nomear o reitor.
Por tradição, o vencedor da consulta à comunidade é sempre nomeado pelo ministro como reitor da UFRGS, embora possam ser escolhidos outros dois nomes da lista. A reunião do Consun, para formalização da lista tríplice, ocorrerá na próxima sexta (17).
A seguir, confira o que Oppermann pensa sobre o futuro da UFRGS, a realidade do ensino durante a pandemia e como será a relação com o novo ministro da Educação.
Confira a entrevista:
O que representa a vitória nessa consulta acadêmica?
Nós temos um projeto que não é um político-partidário, mas uma visão de universidade, que vem sendo construída já há muito tempo. A reitoria não pode se identificar com alas ou com movimentos, mas tem a grande responsabilidade de manter a universidade como um espaço aberto para a expressão de toda a coletividade. Isso, hoje em dia, em uma sociedade polarizada como a nossa, está cada vez mais difícil. A autonomia da universidade, seu espaço de construção do contraditório, é uma opção necessária. Todas as universidades que acabaram sendo levadas para um ou outro extremo acabam perdendo sua autonomia e sua capacidade, perante a sociedade, de ter essa autoridade que a UFRGS tem: ela não é uma visão só, mas várias visões.
Houve uma vocação expressiva, 15.725 votos, mais que o dobro de votantes da consulta de 2016. A que se pode atribuir isso?
Isso não é um fenômeno só da UFRGS: outras universidades que estão fazendo eleições virtuais estão observando um aumento expressivo. Eu acredito que, muito provavelmente, isso se deu porque antes havia urnas presenciais, e a pessoa tinha que se locomover. A gente tinha certeza que ia aumentar o número, especialmente entre os estudantes, que era a categoria com menor participação nas eleições anteriores. E isso traz uma reflexão importante para o pós-pandemia: sim, a virtualidade é um canal essencial de comunicação dentro da universidade, que não pode ser perdido.
A pandemia também mostrou a importância de uma adaptação rápida, que é especialmente difícil no ensino público. Como a UFRGS vai se preparar para um segundo semestre ainda marcado pelo coronavírus?
Na quarta-feira da semana que vem (22), vamos discutir a proposta do chamado Ensino Remoto Emergencial (ERE), que tem uma abordagem emergencial baseada em diferentes modalidades de ensino virtual. Isso tem alguns pressupostos importantes. O primeiro deles é que tanto os professores quanto os alunos tenham possibilidade de estar conectados. Estamos com um edital de auxílio emergencial para alunos beneficiários, para que possam adquirir um tablet ou adaptar o que eles têm, para ter acesso à internet.
Temos também todo um protocolo para a reentrada gradativa presencial. Tem cursos que precisam de laboratórios. Pega a Química, por exemplo. Não dá para você ter aula só remota. Ou a Veterinária, ou a Odontologia, ou a Farmácia. As próprias Engenharias. Esses cursos que requerem atividade presencial vão precisar ter isso. Para isso nós temos que ter protocolos de proteção da vida, da saúde. Foi o que a gente fez ao longo desses últimos dois meses. O que não podemos fazer é ficarmos parados sem ter aula.
A UFRGS chega a cogitar não ter aulas presenciais em 2021, como anunciou a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)?
É por isso que a gente faz a suspensão mês a mês. O panorama da pandemia muda muito de semana a semana. E temos uma expectativa de que a pandemia vai arrefecer a partir de agosto, setembro. A ponto de que, a partir dali, seja muito provável a gente ter atividades controladas. Então por que se precipitar e dizer: "nós não vamos ter atividades presenciais neste semestre"? Se daqui a pouco a pandemia diminuir de intensidade e isso for possível de fazer?
Se lá em setembro, outubro, as aulas práticas puderem ser retomadas, coisa boa. Porque eles (alunos e professores) vão poder encerrar esse semestre ainda no segundo semestre. E aí não atrasamos a vida de ninguém. Mais do que a pandemia já exigiu que a gente atrasasse.
Precisamos repensar a universidade, reinventar a UFRGS e colocá-la no século 21, como a gente dizia na campanha
RUI OPPERMANN
Escolhido pela comunidade universitária para reitor da UFRGS
Como serão esses próximos quatro anos de gestão na maior universidade do Rio Grande do Sul? O que continua, o que é preciso mudar?
Certamente tem uma questão, que é o desafio que nós nos colocamos, a comunidade entendeu e por isso mesmo nós ganhamos a eleição: nós vamos convocar uma estatuinte para a UFRGS. Vamos rever o nosso estatuto, que é de 1994 e não foi revisto desde então. E imagina o quanto nossa sociedade mudou em termos de democracia, inclusão, diversidade. A própria universidade, hoje, está, por conta das políticas e ações afirmativas, uma comunidade completamente diferente daquela de 1994. Precisamos repensar a universidade, reinventar a UFRGS e colocá-la no século 21, como a gente dizia na campanha.
Iremos buscar a ampla ação da presença da universidade no desenvolvimento tecnológico, inovação e empreendedorismo. E também (queremos) que a universidade seja socialmente referenciada para as comunidades que precisam, devido a suas dificuldades socioeconômicas. E é muito importante a internacionalização da universidade: queremos mais professores estrangeiros aqui, mais alunos estrangeiros. Queremos nos tornar uma universidade realmente internacional.
Qual sua expectativa para o que acontece agora, com o encaminhamento de uma lista tríplice ao governo?
Nós cumprimos o passo mais importante: a escolha da comunidade. Mas há outros passos bastante complexos, e a gente espera que continuem com esse mesmo tom de respeito ao que a maioria da comunidade escolheu. Nós vamos ter, sexta-feira (17), o Conselho Universitário, porque a eleição da lista tríplice se dá lá. Nós ganhamos uma consulta. Uma vez formada a lista tríplice, ela é enviada para o MEC, e lá será analisada sob o ponto de vista normativo, jurídico, de regramentos. Aí vem a expectativa que todos temos de que o primeiro da lista seja nomeado reitor. A gente sabe que o governo pode escolher qualquer um dos três nomes. Embora a gente ache isso estranho, isso é absolutamente legal. Só que escolher o primeiro da lista é respeitar a vontade da comunidade. Nós entendemos que existem sobradas razões para que sejamos nomeados como primeiros da lista em decorrência de tudo o que fizemos com a universidade nesses últimos anos.
E a expectativa para a relação com o novo ministro?
Por tudo o que a gente vê no histórico dele, é um homem de diálogo. E o que mais queremos no MEC neste momento é um ministro guiado pelo diálogo, ao contrário do anterior (Oppermann se refere a Weintraub, não a Carlos Alberto Decotelli que, apesar de nomeado, não chegou a tomar posse). Acho que todos os reitores estão esperando do ministro esse diálogo, e pelo que a gente sabe ele tem essa característica.