Após quase dois anos das primeiras discussões, a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) aprovou, na manhã desta quinta-feira (12), o Código de Ética e Convivência, documento que estabelece normas mais rígidas a alunos dentro da instituição. Esta foi a terceira tentativa de análise da matéria neste ano por parte do Conselho Universitário (Consu). Nas outras vezes, o Diretório Central dos Estudantes (DCE) impediu com que as discussões acontecessem. A pressa do reitor Paulo Burmann pela aprovação ocorreu na esteira dos últimos acontecimentos: a incidência de manifestações racistas e de casos de estupro a partir de 2017.
— A universidade não poderia seguir com uma situação dessas sem uma resposta efetiva à comunidade acadêmica. Não se pode achar normal que casos de racismo e de estupro, ocorridos dentro da nossa federal, não tenham um tratamento severo. Se somos enérgicos e rígidos com os servidores, em casos de eventuais delitos, o mesmo, obviamente, deve se dar com alunos — sentenciou Burmann.
Com a aprovação da matéria, fica prevista a aplicação de um conjunto de medidas, como advertência, repreensão por escrito e suspensão das aulas por um prazo que pode variar de três dias a 90 dias, podendo chegar ao desligamento da instituição. Burmann afirma que a aplicação do código "representa em um avanço e que não há qualquer risco de criminalização do movimento estudantil":
_ Não houve nenhum voto contrário (à aprovação) e é bom que se diga que o que fica estabelecido é um conjunto de regras com direitos e deveres aos alunos. Não tem nada de cerceamento à liberdade do aluno ou qualquer tipo de proibição às manifestações. Não há nada de excepcional. Mas, infelizmente, um grupo minoritário e, bem verdade, um tanto barulhento de estudantes, quis tumultuar e espalhar inverdades.
A votação, que durou pouco mais de 30 minutos, teve a aprovação de todos os integrantes do Consu. Porém, o DCE da UFSM – que tem direito a voto – se absteve por entender que o processo "foi construído de forma arbitrária e, por isso, sem qualquer legitimidade". Para garantir a análise da matéria, nesta manhã, a reitoria solicitou a presença da Polícia Federal, que designou efetivo e quatro viaturas que acompanharam a reunião do Consu.
— Essa é uma questão que sempre nos preocupou porque ele (código) não foi construído com a participação do movimento estudantil. É bom deixar claro que essa aprovação por unanimidade, que é dita pelo reitor, não é verdadeira. Nós, o DCE, optamos por não votar. E justamente por entender que esse processo foi construído de cima para baixo, de forma arbitrária e sem qualquer participação do movimento estudantil, nós não votamos — diz a coordenadora de Assistência Estudantil do DCE, Paola Pfeifer.
Ela também afirma que as medidas que constam no Código Disciplinar, são punitivas, e não educativas:
— Já expusemos o nosso repúdio à forma como todo esse processo foi construído. E o reitor entendeu que deveria prevalecer a visão dele e não o dos estudantes. Somos expressamente contrários a este documento.
Segundo Paola, a gestão do reitor Burmann negou a participação de alunos na comissão que tratou da elaboração do documento que embasou o Código Disciplinar. Já o reitor Paulo Burmann afirma que foi garantida "voz e vez" ao DCE.
Sanções
Na minuta que constitui o Código Disciplinar, que conta com oito páginas, estão detalhadas as disposições gerais bem como as medidas a serem aplicadas em casos violação das regras de convívio dentro da universidade.
As infrações disciplinares estão classificadas em leves (com aplicação de advertência), médias (cabíveis de advertência ou repreensão), graves (com suspensão máxima de 45 dias) e, por fim, gravíssimas (podendo ser uma suspensão ou o desligamento da instituição).
O documento traz alguns exemplos para cada tipo de infração. Confira, abaixo, algumas situações:
Leves
- Não respeitar o horário de sossego público estabelecidos nas áreas da moradia estudantil, Hospital Universitário de Santa Maria (Husm) e Hospital Veterinário.
- Apresentar-se publicamente em estado de embriaguez ou sob efeito de substâncias entorpecentes de modo que ponha em perigo a segurança própria ou alheia.
Médias
- Danificar a coisa pública ou alheia.
- Comunicar a ocorrência de infração ou irregularidade que se saiba ser inexistente ou que não se tenha verificado.
Graves
- Vender drogas ou substâncias entorpecentes nas dependências dentro da universidade.
- Destruir, inutilizar, furtar ou receptar coisa pública ou alheia.
Gravíssimas
- Destruir ou inutilizar o patrimônio histórico, cultural, científico da universidade.
- Praticar violência que resulte lesão corporal, grave, gravíssima ou morte.
- Praticar estupro ou atentando violento ao pudor.
- Induzir, incitar ou praticar a discriminação ou preconceito de sexo, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
- Manifestar expressões de cunho racista ou injúria racial.
Racismo e estupros
A universidade apura, por meio de acompanhamento interno, o caso de um aluno suspeito de ter estuprado uma jovem dentro da Casa do Estudante (CEU), no campus da UFSM. Além disso, no ano passado, a instituição contabilizou manifestações de ódio a estudantes negros.