Com alta de cerca de 17% neste ano, o dólar apresentou uma guinada nos últimos meses. Adiamento do corte de juro nos Estados Unidos, desconfiança sobre o cumprimento da meta fiscal no Brasil e acirramento entre Lula e o Banco Central estão entre os principais fatores que explicam a valorização da moeda americana. Nesta terça-feira (2), o dólar se aproximou dos R$ 5,70, e fechou o dia cotado em R$ 5,66.
O economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating, Alex Agostini, afirma que, além dos fatores externos, sinais de menor rigor do governo federal no controle de gastos e ataques à autoridade monetária preocupam investidores. Isso acaba impactando na desvalorização do real, segundo o economista:
— O investidor não paga para ver. Ele não faz apostas. Ele faz investimento. O mercado de capitais no Brasil não é um cassino, ele é um ambiente de investimento com retorno. Se ele ver que o risco está aumentando, ele tira o dinheiro antes.
Ajuste fiscal
Decisões recentes e falas de integrantes do governo federal no campo fiscal aumentaram o mau humor do mercado econômico. Em abril, o governo mudou a meta fiscal de 2025 para um superávit primário de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) para déficit zero. Na prática, o objetivo perseguido passou de meio ponto percentual para um resultado primário de equilíbrio.
Além disso, afirmações recentes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva questionando a necessidade de corte de gastos causaram insatisfação. O controle fiscal em xeque causa uma preocupação para o futuro, repercutindo em investimentos no país e na desvalorização do real frente ao dólar.
Embate político
As rusgas entre Lula e o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, também estão entre os ingredientes que afetam o câmbio. Críticas mais contundentes do presidente à autoridade monetária criam um ambiente de desconfiança sobre a autonomia do BC na próxima gestão. Isso aumenta a insegurança no mercado, com os investidores mais cautelosos. Um dos movimentos nesse sentido é o aumento na compra de dólares como ativo de proteção, que afeta a oferta da moeda americana.
— A fala do presidente tem peso e tem sido o principal motivo de desvalorização do real. Ele está indo por um caminho que é uma postura de medidas heterodoxas, que é gastar mais no momento que você não tem condição de gastar. Que é trocar, ter uma ingerência no Banco Central, que precisa ser uma autarquia extremamente técnica — afirma o economista-chefe da Austin Rating.
Juro nos EUA
O juro básico nos Estados Unidos segue inalterado desde julho do ano passado, estacionado na faixa de 5,25% a 5,50%. A persistência da taxa nesse patamar, o mais alto desde 2001, também afeta o valor do dólar no Brasil.
Juro alto em economias mais consolidadas, como é o caso dos EUA, atrai investidores para esses países. Isso ocorre porque os agentes colocam mais dinheiro em economias estáveis e com menos riscos de oscilações. Esse movimento provoca a saída de capitais de países emergentes, como o Brasil. Com menos dólares no Brasil, a valorização da moeda frente ao real tende a ser maior.
Incertezas sobre a eleição nos EUA, que também respingam no aumento dos rendimentos dos títulos do Tesouro americano, também estão entre os fatores que fortalecem o dólar.