Eleito no final de maio, Claudio Bier falou na tarde desta quinta-feira (18) pela primeira vez na condição de presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs). Ele assume o mandato até 2027, em meio aos desafios para reconstrução do Estado após a tragédia climática.
A relevância do tema é tamanha que esse será um dos quatro pilares instituídos pela diretoria que toma posse nesta noite, junto com competitividade, inovação e retenção de talentos.
Diante dos fatos recentes, o presidente da Fiergs afirmou em coletiva que o Estado terá de buscar um regime tributário e de incentivos semelhantes aos aplicados na Zona Franca de Manaus. Bier citou, para justificar a proposta, a conjuntura climática desfavorável e os gargalos que afastam o RS do centro do país e comprometem os custos produtivos.
— O Mercosul micou e o Estado ficou mal localizado. Perde em competitividade para SP, RJ e MG, que têm vantagens logísticas. Por isso, uma de nossas bandeiras será pensar em um princípio de Zona Franca para o nosso Estado. Percebi, em viagem recente, por exemplo, que leva-se o mesmo tempo para chegar a Brasília saindo de Porto Alegre ou da capital do Pará. São dois extremos e temos que buscar benefícios também semelhantes aos existentes no Norte e no Nordeste, onde os bancos públicos têm incentivos e oferecem melhores condições — declarou.
Com trajetória de décadas no setor de máquinas e equipamentos, tendo presidido o Simers por 23 anos, o dirigente assume a função e inova com a criação de um cargo inédito. Trata-se do CEO, que será Paulo Herrmann.
Ex-diretor da John Deere, Herrmann reforça a presença dos segmentos industriais ligados ao agronegócio na gestão da entidade. E, logo na primeira manifestação, ambos antecipam que pautas como irrigação e infraestrutura devem ter destaque a partir de agora.
Presença reforçada do agro
Ao traduzir o gargalo em números, Herrmann lembra que nos últimos 5 anos, em razão da estiagem, o Rio Grande do Sul perdeu R$ 65 bilhões decorrentes da quebra das safras. Em contrapartida, comenta que em igual período, os planos safras destinaram somente R$ 11 bilhões para o setor no país inteiro.
— Vale lembrar que estamos em cima do Aquífero Guarani, o segundo maior do planeta e não temos falta de água, o que temos é má distribuição de chuvas e dos reservatórios. E há, no destaque dado ao tema da irrigação, um equívoco de direcionamento dos recursos — avaliou o futuro CEO da Fiergs.
Nesse aspecto, Bier também reforça que resoluções nesse sentido seriam capazes de dar impulso extra a alguns segmentos industriais. Ele exemplifica com a falta de autossuficiência gaúcha na produção de milho.
A necessidade de comprar essa matéria-prima em outros Estados, diz, acaba por limitar o fortalecimento da indústria de processamento de proteína animal, que depende do insumo para alimentação das matrizes.
— Sem irrigação, produzimos em média cem sacas de milho por hectare. Com sistemas de irrigação poderíamos elevar para 250 sacas por hectare. Isso é matéria-prima que falta ao setor e valores que deixam de brotar na economia — complementa, ao demostrar o papel que o tema deverá ganhar ao longo da gestão.
Alguns temas em destaque na coletiva
Crédito, juro e câmbio
- Na avaliação do novo presidente Claudio Bier, o país precisa de uma taxa de juro "mais educada". Apesar de defender que a Selic deveria estar em patamar menos elevado do que os atuais 10,50% ao ano, argumenta que o Banco Central deve manter a autonomia até para que possa agir de maneira mais técnica, inclusive em aspectos que envolvem o câmbio. Para ele, deve haver um ambiente de maior estabilidade para as oscilações da moeda norte-americana.
Relações com o governo
- De acordo com o presidente da Fiergs, as relações com o governo federal serão regidas pela lógica de "um apoio crítico". No momento, ele identifica aspectos mais críticos, sobretudo em razão da necessidade de aumentar a efetividade dos repasses prometidos pelo governo federal para as empresas afetadas pela enchente. Entre os pontos em evidência, estão inconsistências identificadas por ele no acesso e nos critérios dos programas em andamento.
Reconstrução do Estado
- Em meio a necessidade de recuperar empresas, manter empregos e reerguer a infraestrutura do Rio Grande do Sul após a enchente, Claudio Bier responde de pronto que "para retomar os níveis de competitividade da indústria gaúcha serão necessários no mínimo cinco anos". A projeção do presidente da Fiergs é acompanhada de uma ressalva: "Isso se o agro ajudar e não tivermos perdas de safra".
Infraestrutura e logística
- O tema é tratado como fundamental. O entendimento é de que, apesar da posição periférica com relação aos Estados do Centro-Oeste, e da perda de competitividade dos produtos, o Rio Grande do Sul guarda alguns trunfos que precisam ser potencializados. É o caso do Porto de Rio Grande, algo que não existe no Mato Grosso e no Mato Grosso do Sul e favorece as exportações gaúchas.
Custos de produção
- Além da reconstrução de estradas e melhorias na malha de transporte rodoviário, o acompanhamento do andamento do gasoduto de Vaca Muerta, que começa na Argentina, e do Gasbol, que opera entre o país e a Bolívia são aspectos que podem ajudar na competitividade. Segundo Bier, "o gás é fundamental, porque deixamos de produzir mais ou produzimos com mais custos" em razão de questões ligadas ao abastecimento.