O relatório do grupo de trabalho (GT) – que avaliou por quatro meses duas propostas de emendas à constituição (PECs), a 110 e a 45, ambas de 2019, com o objetivo de elaborar um novo texto-base para a reforma tributária – foi apresentado na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (6). Assinado por Agnaldo Ribeiro (PP-PB), o documento com as indicações foi lido por volta das 16h.
Agora intensificam-se as tratativas para formatar um substitutivo ao texto com previsão de ir ao plenário da casa até o dia 20 de julho. Durante a apresentação, Ribeiro declarou que a reforma deverá ser votada ainda este mês. O coordenador do GT, Reginaldo Lopes (PT-MG), explicou a GZH: é esse o texto que dará as diretrizes, os consensos, as convergências e os pontos que ainda necessitam e são mais passíveis de serem “construídos " dentro do contexto político.
Ele informa que não se trata ainda de um projeto substitutivo, ou seja, aquele que, de acordo com o regimento interno da Casa, precisa ser votado quando sofre alterações consistentes. A opção pelo formato se justifica por permitir agilizar o processo de votação, uma vez que o substitutivo em questão só será concluído em janela mais próxima da apreciação da matéria em plenário, portanto, sem a necessidade de passar por comissões.
A ideia é avançar para a definição da data de apreciação da matéria em primeiro turno, o que acontecerá antes do recesso parlamentar, segundo declarações do próprio presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), reforçadas nesta terça-feira. Com isso, o foco recai sobre as articulações.
Programações no Rio Grande do Sul, durante as duas últimas semanas, dão amostra do que estará em jogo daqui para frente em Brasília. Entre as federações do setor produtivo no RS – entidades com poder de pressão no legislativo em suas estruturas nacionais – e as secretarias de Fazenda do Estado e da prefeitura de Porto Alegre existem divergências com aspectos do relatório.
O tema é complexo, envolve toda a base de arrecadação e a partilha dos tributos que incidem sobre o consumo de produtos e de serviços no país. Em síntese, dois aspectos formadores do DNA da proposta e seus efeitos práticos concentram as atenções.
No caso da Capital e do Estado, a autonomia na arrecadação do ISS desagrada a prefeitura. Já o governo entra nas discussões sobre quais seriam as fontes de financiamento de um Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), pensado para compensar perdas com o fim dos benefícios fiscais, extintos para a implantação do (IVA), nesse caso, o ISS (municipal) e o ICMS (estadual).
Já entre os setores produtivos, o ponto-chave é a eventual elevação do recolhimento para os serviços. Isso porque o segmento possui carga de 9% e passaria a alíquota única estipulada para o IBS (gerido por Estados e Municípios), prevista em cerca de 25%. Sobre o tema, o autor do relatório foi enfático ao declarar que “em nenhuma hipótese haverá aumento de carga tributária”.
O que o relator apresentou
A posição das entidades setoriais
Federação das Indústrias do RS (Fiergs)
A indústria é um dos setores beneficiados com a espinha dorsal do relatório. Isso porque está na primeira etapa da cadeia produtiva, na fabricação de bens de consumo e com a proposta será retirada a cumulatividade tributária (imposto em todas as etapas intermediárias da logística de um produto, desde a saída da indústria até o consumidor final), que, nos moldes de hoje, serve de barreira às exportações. Há também ganhos com o fim da guerra fiscal. O presidente da entidade, Gilberto Petry diz que a posição do setor é clara e envolve a sustentação da proposta:
Pagamos a maior carga tributária do país. Esse peso precisa ser redistribuído para que, ao reduzi-lo, nossos produtos se tornem competitivos. Transparência e a agilidade na restituição dos créditos tributários são outros ganhos.
De acordo com o presidente da entidade, agora, é necessário ficar de olho nas movimentações do Congresso, uma vez que o governo federal acaba de aprovar o arcabouço fiscal e isso demanda ampliar as bases da arrecadação nos próximos anos.
Federação da Agricultura do RS (Farsul)
O economista-chefe da entidade, Antônio da Luz, afirma que para fazer a reforma “primeiro é necessário não olhar somente para o próprio umbigo”. A frase sintetiza o embate de interesses setoriais e federativos. Para o agronegócio, o principal benefício é a geração de créditos tributários. O segmento conta com regime diferenciado, mas não acessa a restituição de valores relativos ao ICMS pago na compra de insumos como fertilizantes e máquinas e agrícolas, por exemplo. As mudanças também unificam 5,5 mil legislações municipais sobre o ISS, o que reduz a complexidade.
Se o agro olhar só para os seus interesses, os serviços, o comércio e a indústria para os seus, nada será feito. A questão é sair um pouco da nossa zona para enxergar o horizonte do país. É uma reforma de base ampla, com regras homogêneas, tributação no destino e que limpa tributos que pesam sobre a produção. Mas, é preciso que esteja escrito.
A crítica recai na condução da reforma, já que as leis complementares (que regram as alterações) ficarão para 2024 (e não votadas com o texto-base). Para Antônio da Luz, os setores não estão dispostos a conceder esse “cheque em branco” ao governo.
Federação do Comércio de Bens e de Serviços do RS (Fecomércio-RS)
O vice-presidente da entidade, Joel Dadda, sustenta que a implantação de um tributo sobre o consumo de base dual (uma para União, outro para estados e municípios) é uma pauta da entidade. Assim, a simplificação, em razão da junção de tributos, sem gerar custos adicionais, além de guias unificadas, são alguns dos elementos apontados como positivos. Outro destaque indicado por ele é o fim da guerra fiscal, pois isso manterá ativas as vocações regionais, sem sofrer a influência de uma “espécie de leilão” para oferecer vantagens para a instalação de empresas.
Em resumo, destacaria as quatro faixas de alíquotas, mais equilíbrio e simplificação, porque não há no mundo complexidade mais elevada do que a do sistema tributário brasileiro. Além disso, há mecanismos que travam as desonerações e favorecem a permanência das empresas dentro dos locais em que há mais confluência com as vocações regionais
A preocupação é com aspectos prejudicais aos serviços. Isso acontece porque a previsão de receber créditos na compra de insumos já tributados não beneficiaria o segmento que contrata muita mão de obra, mas consome menos produtos ao longo da cadeia produtiva.
A posição do Estado e a Capital
O que diz a Secretaria da Fazenda de Porto Alegre
O secretário da Fazenda da Capital, Rodrigo Fantinel, explica que Porto Alegre, assim como as demais capitais no âmbito da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), ainda prefere que seja usada a PEC 46 como referência do texto. A principal meta é manter a competência sobre a arrecadação do ISS, mas esse texto não foi considerado pelo GT. Outra preocupação, diz, é com o incentivo à “pejotização”, uma vez que, para receberem créditos tributários previstos, o setor de serviços possa preferir contratar empresas, e não mais pessoas físicas. Ele afirma que paira uma nuvem que não permite ver o funcionamento na prática.
O que diz a Secretaria da Fazenda do RS
Por nota, a titular da secretaria, Pricilla Santana, informa que participará de nova reunião do Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz) na sexta-feira (9). O governo defende simplificação que preserve autonomia de Estados e municípios, o que converge, segundo texto, com o IVA dual. A cobrança no destino, diz, também está em linha com os interesse. Sobre o FDR, a expectativa é por "equilíbrio" e "transição gradual" que evite perdas na alteração do princípio da origem para o destino.