O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse nesta sexta-feira (21) que a economia não gira em torno da Selic. Ao ouvir de um empresário na Lide Brazil Conference que o elevado patamar da taxa de juro atrapalha o Brasil a crescer, Campos Neto respondeu que só 20% do crédito é ligado à Selic e que o restante é relacionado a taxas longas.
— Obviamente, o Banco Central quer cair o juro — disse. — Se a gente não conseguir fazer um movimento na Selic com credibilidade, a taxa longa não cai — justificou.
— O que move o Brasil não é a taxa de juro de um dia, é a taxa de juro de três, cinco, 10 anos. Para fazer que a queda da Selic gere um movimento de queda prolongada de juros, precisa ter credibilidade. O Banco Central está esperando o melhor momento para fazer para que isso tenha um ganho real para as pessoas. A economia não gira na Selic.
Para justificar a necessidade de se manter a Selic no patamar em que se encontra, Campos Neto comparou a política monetária a uma tubulação de água que se encontra entupida. Ou seja, para se atingir o fluxo de água desejado numa tubulação entupida, e neste caso pelo elevado porcentual de crédito, o BC precisa elevar a pressão da água.
— Uma das coisas que explicam a tubulação de política monetária entupida é o elevado porcentual de crédito direcionado — disse, explicando que quando isso ocorre e a política monetária muda, o BC não tem influência sobre este porcentual.
Então, de acordo com ele, para se ter o efeito desejado o BC aumenta a pressão de juro na "tubulação congestionada".
— É o efeito que a gente chama também da meia-entrada. Se você tem a meia-entrada, a principal tem de ser mais cara para compensar — disse acrescentando que enquanto no Brasil há 40% de direcionamento de crédito, em outros países o índice é de, em média, 4%.
— Isso explica, em parte, o porquê de às vezes o nosso juro ser mais alto. É porque um componente de crédito subsidiado mais alto faz com que nossa política monetária tenha menos efeito.
Campos Neto insistiu que, estruturalmente, a taxa de juro tem de ser maior quando o componente de crédito subsidiado é também maior.
— Isso não é porque eu acho que A ou B é correto ou errado. Isso é um estudo que sai da relação entre potência da política monetária e o espaço que a gente tem — afirmou.
O presidente do Banco Central fez um discurso amparado em números, no qual defendeu com veemência o sistema de metas de inflação e a autonomia do BC.
— O anseio pela queda de juros é político, mas nosso trabalho é técnico — afirmou Campos Neto.
O dirigente lembrou que a Argentina aumentou sua meta e a taxa de juro caiu, mas a inflação disparou. Segundo Campos Neto, se o Banco Central não tivesse aumentado a taxa de juro na eleição, hoje a Selic seria de 18,75%.
— Quando a inflação sai do controle, as empresas e os ricos se adaptam, mas os pobres não. Inflação é desigualdade e aumento de pobreza. Quem tem menos recursos não consegue se proteger — afirmou.
O economista frisou que, se for feito um ajuste de juros "sem as condições", o resultado pode ser "desastroso" para o crédito.
— Países que abandonaram o sistema de meta entraram num sistema inflacionário muito alto — completou.