Em uma reunião marcada por expectativas em razão das projeções de salto para a inflação no país e no planeta, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu elevar a taxa Selic em um ponto percentual. O aumento, confirmado nesta quarta-feira (16), é o nono verificado desde março do ano passado, quando teve início o novo ciclo de altas na taxa básica de juro da economia brasileira, agora fixada em 11,75% ao ano.
O nível da remarcação quebra com uma sequência de três elevações de 1,25 ponto percentual, mas recoloca a Selic no maior patamar desde abril de 2017. Como esse é o principal instrumento de política monetária para influenciar empréstimos, financiamentos e aplicações financeiras, quanto mais elevada, menor é a atividade econômica. Por consequência, a meta é que haja uma diminuição da pressão sobre os preços.
No comunicado do Copom, o colegiado destacou que antevê novo aumento de um ponto percentual — ou seja, para 12,75% — na próxima reunião, marcada para 3 e 4 de maio. O comitê ressaltou que o ambiente externo "se deteriorou substancialmente" com o conflito entre a Rússia e a Ucrânia e seu impacto nas commotidies. "O momento exige serenidade para avaliação da extensão e duração dos atuais choques. Caso esses se provem mais persistentes ou maiores que o antecipado, o Comitê estará pronto para ajustar o tamanho do ciclo de aperto monetário", ressalta o Copom, na nota.
Ao justificar a alta de um ponto percentual, o colegiado afirmou que "entende que essa decisão reflete a incerteza ao redor de seus cenários e um balanço de riscos com variância ainda maior do que a usual para a inflação prospectiva, e é compatível com a convergência da inflação para as metas ao longo do horizonte relevante, que inclui os anos-calendário de 2022 e, principalmente, o de 2023".
De acordo com a economista-chefe da Fecomércio-RS, Patrícia Palermo, caso a opção do BC fosse por um aumento ampliado, não haveria surpresa alguma. Isso porque, segundo ela, basta acompanhar as expectativas do Índice de preços ao consumidor (IPCA), sobretudo, em razão da elevação dos combustíveis, para perceber quão deteriorada está a inflação deste ano.
— Há uma semana se esperava que o IPCA de 2022 ficasse em 5,6%. Hoje já está em 6,46%. A meta é 3,5% (com o teto fixado em 5%), ou seja, flertamos como o dobro da meta e já convivemos há um bom tempo com ela acima de 10% (no acumulado de 12 meses). É de se esperar por ambiente mais contracionista na política monetária nacional para tentar conter inflação de 2022 e as expectativas para 2023 e 2024 — argumenta.
Por outro lado, a economista afirma que o cenário preocupa o orçamento das empresas. Muitas adotaram linhas de crédito destinadas a contornar a crise provocada pela pandemia. Neste caso, revela Patrícia, o aumento da Selic torna as parcelas mais caras do que o planejado, além de inibir o consumo, reduzir a atividade econômica e comprometer fatia maior das receitas com o endividamento.
Choque
O economista da UFRGS Marcelo Portugal comenta que a guerra provocou novo choque inflacionário em todo o planeta, em razão do preço dos commodities, principalmente o trigo e o petróleo, produzidos em larga escala na Rússia e na Ucrânia. Desta forma, afirma, o Brasil não ficará imune e o BC terá de responder com pulso firme a isso com novos aumentos nos juros.
— Se nesta reunião havia dúvida quanto ao tamanho da elevação, a partir de agora há uma certeza de que não será a última, porque o conflito amplia o desafio e faz com que o ciclo de duração das altas na Selic seja muito maior do que se imaginava. Antes, pensava-se que chegaria ao teto de 12,5%, agora, fica claro que passará com folga os 13%. Resta saber o ritmo, o quão lento ou rápido o BC pretende fazer isso — sustenta Portugal.
Recessão
O economista, professor do Insper e sócio da Siegen Consultoria, Fabio Astraukas, destaca que a quarta-feira demarca um dia raro no calendário, porque o Fomc (o Copom dos Estados Unidos) anunciou uma elevação de 0,25 pontos percentuais para os juros norte-americanos. O objetivo do Fed (BC dos Estado Unidos) com a primeira alta em três anos é diminuir a pressão da maior inflação em quatro décadas naquele país.
— O que pesaria para um aumento maior por aqui seria justamente a subida de juros nos EUA e uma sinalização de inflação persistentemente mais alta no mundo. Em contrapartida, já é sabido que apenas a elevação dos juros não conterá a inflação no Brasil. Assim, em algum momento breve, provavelmente a partir do segundo semestre, o BC começará a correr o risco de levar o país para uma recessão com inflação alta. Sim, porque juros muito altos derrubam ainda mais o crescimento já cambaleante da economia brasileira — explica.
Por outro lado, analisa Astraukas, a inflação mais alta irá aliviar as contas do governo e, caso ela persista no mundo todo, continuará a beneficiar as commodities brasileiras. Segundo o economista, essa será uma discussão interessante: defender um pouco mais de crescimento com uma política monetária mais frouxa ou subir fortemente os juros e criar um cenário de recessão.
— De qualquer modo, a camada de menor renda irá sofrer mais. Seja por conta da perda do poder aquisitivo que a inflação provoca, seja pela perda de emprego que uma recessão traria — lamenta.