Depois do cataclismo econômico de 2020, a recuperação da economia mundial tem sido vigorosa, mas a escassez de produtos essenciais, a inflação e a situação sanitária provocada pela covid-19 trazem à tona os temores de uma desaceleração em 2022.
Da China aos Estados Unidos, da Europa à África, a pandemia paralisou as economias do mundo de maneira quase simultânea em março de 2020.
Dois anos e 5 milhões de mortes depois, a recuperação acontece de forma mais dispersa.
Os países ricos se beneficiaram do acesso privilegiado às vacinas: os Estados Unidos já deixaram para trás as marcas de sua pior recessão desde a Grande Depressão dos anos 1930 e a zona do euro poderia fazer o mesmo no fim deste ano. Contudo, o rápido aumento de uma nova onda epidêmica e a descoberta de uma nova variante acendem o sinal de alerta.
"A covid-19 continuará sendo uma ameaça", adverte a agência de classificação de risco Moody's em comunicado.
E essa ameaça já está se materializando em regiões com baixos índices de vacinação, como a África Subsaariana, onde apenas 2,5% da população estava vacinada em outubro e que, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), está condenada a uma recuperação econômica mais lenta.
Até 2024, é provável que a maioria dos países emergentes e em desenvolvimento não consiga alcançar as previsões de crescimento feitas antes da pandemia, de acordo com o FMI.
Muitos bancos centrais - como os de Brasil, Rússia e Coreia do Sul - aumentaram as taxas básicas de juros para tentar evitar uma inflação galopante, o que poderia atrapalhar a recuperação.
Inclusive na China, a locomotiva do crescimento mundial, a recuperação está desacelerando na medida em que se acumulam os riscos, advertiu recentemente o FMI.
Na potência asiática, o consumo luta por voltar aos níveis anteriores à pandemia, há temores pelas dificuldades da incorporadora Evergrande e os cortes de eletricidade prejudicam a atividade empresarial.
Inflação e escassez
"A maior surpresa de 2021 foi o aumento da inflação", escrevem os analistas do Goldman Sachs em suas previsões para 2022.
O aumento dos preços foi impulsionado pela desorganização das cadeias de suprimentos e pela escassez de produtos essenciais para o comércio internacional, como os semicondutores, uma consequência da explosão da demanda durante e depois da crise.
Mas, também, pelo desânimo de muitos atores do comércio mundial, como estivadores nos portos, motoristas de caminhão e caixas de supermercados que não voltaram ao trabalho após os confinamentos e provocaram escassez de mão de obra.
A inflação também se explica pelo aumento do preço das matérias-primas (madeira, cobre, aço) e da energia (gasolina, gás, eletricidade).
O aumento nos preços, considerado "temporário" pelos bancos centrais, preocupa as lideranças políticas, inclusive o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que assinalou em novembro que é "uma prioridade absoluta" inverter essa tendência.
— A questão é se realmente saímos da crise — disse à AFP Roel Beetsma, professor de economia da Universidade de Amsterdã.
Por ora, o FMI continua esperando um crescimento mundial de 4,9% para o próximo ano.
A questão climática
O equilíbrio entre crescimento econômico e clima está cada vez mais longe de ser alcançado, como mostraram as conclusões da COP26.
O acordo alcançado na conferência pede aos Estados que aumentem seus compromissos de redução das emissões de gases do efeito estufa a partir de 2022, mas não coloca o planeta no caminho para limitar o aquecimento a "bem abaixo" de 2 °C, como se estabeleceu no Acordo de Paris em 2015.
— Pensar no curto prazo é um fenômeno comum, especialmente entre os políticos — lamenta Roel Beetsma, que defende um imposto sobre o carbono que seja uniforme em todas as indústrias e com poder suficiente de dissuasão, o que está longe de ser o caso na atualidade.
A mudança climática e as catástrofes naturais associadas também poderiam afetar o custo dos alimentos.
Os preços mundiais já estão perto do recorde de 2011, segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO).
O trigo subiu quase 40% em um ano, os produtos lácteos 15% e os óleos vegetais estão batendo recordes.