Com cerca de 7% do total de armazenagem disponível no Sistema Interligado Nacional (SIN), os reservatórios de água para geração de energia na Região Sul operam com apenas 26,9% de seu potencial. Essa é a 14ª pior posição média na série histórica, desde 1931.
O cenário atual é determinante para que 11 das 15 usinas localizadas no Estado estejam com a produção hidráulica bastante abaixo do programado. É o caso de Foz do Chapecó (-39,45%), Itá (-19,78%) e Barra Grande (-4,18%), segundo dados do monitoramento diário em 3 de setembro.
A situação, todavia, é mais preocupante no subsistema Sudeste/Centro-Oeste, que responde por 70,1% das reservas do país. As bacias da região encontram-se com somente 20,88% da capacidade instalada, o pior nível em 91 anos. Os dados são do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), com base em 2 de setembro, e têm caído dia após dia com maior intensidade a partir de junho deste ano.
A boa notícia vem do Norte e do Nordeste, onde, respectivamente, os reservatórios estão com 69,86% e 48,76% de suas capacidades. Estas unidades exportam o excedente da produção de energia para o Sudeste e Sul e garantem o abastecimento no modelo integrado.
Para o sistema como um todo, entretanto, houve queda de 20% na capacidade máxima entre julho de 2020 (56,5%) e a mesma data deste ano (35,4%). Diante do cenário, o ONS revisou, em 27 de agosto, a nota técnica sobre a atual situação e as projeções futuras até novembro de 2021. O motivo foi o agravamento da estiagem, justamente, nas bacias do subsistema Sul.
"Como o total de chuva previsto considerado no último estudo não se confirmou, e o volume de água observado em 2021 foi inferior àquele verificado em 2020, em especial nas bacias do Sul, as afluências ficaram abaixo daquelas consideradas na prospecção anterior", diz o texto.
A estiagem, segundo a nota, gerou queda de 10 pontos percentuais nos níveis dos reservatórios por aqui. Isso também orienta nova estimativa de 2 mil megawatts (MW) médios a menos na chamada Energia Natural Afluente (ENA) do SIN até novembro.
O professor Guilherme Fernandes Marques, coordenador do Núcleo de Pesquisa em Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos (Gespla) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), garante que o cenário exposto pela nota técnica é de piora no que se refere ao percentual da chamada MLT (Média de Longo Termo). Trata-se de um indicador das vazões naturais que chegam aos reservatórios.
— A tendência indica o esvaziamento do sistema, com menos água armazenada até que sejam retomados os regimes de chuvas nas bacias — analisa.
Balanço
Marques explica que a água que sai dos reservatórios pode passar pelas turbinas e gerar energia ou ser liberada para diferentes usos, como a captação em cidades e a irrigação, entre outros. Neste momento, como o balanço hídrico não é favorável, ele diz que o ONS tenta reduzir a vazão liberada para garantir o armazenamento por mais tempo e diminuir o ritmo da queda nos reservatórios.
— Se cair muito rápido, sairá do ponto ideal de operação energética e existe o risco de paralisar a geração, porque com uma quantidade de água muito baixa, a turbina terá de ser desligada — pontua.
Por essa razão, uma série de medidas foram tomadas. Entre elas, o acionamento das usinas térmicas é o principal fator de elevação nas tarifas de energia elétrica ao consumidor. Com isso, a meta é poupar água até o início do período chuvoso na região Sudeste, entre outubro e março.
— Quando ocorrerem as chuvas, as vazões afluentes sobem, o balanço hídrico inverte a tendência e o sistema é normalizado — afirma o professor da UFRGS.
Tendência de redução
Enquanto prossegue a escassez de precipitações, a tendência é de continuidade do rebaixamento no nível dos reservatórios. Paulo de Tarso Pinheiro Machado, economista e ex-presidente do Grupo CEEE explica que, dentro dos reservatórios do Sul, as bacias do Jacuí e Uruguai respondem por 44,5% da capacidade de armazenamento de energia do subsistema. No início de setembro, Jacuí operava em 15,6% da capacidade, e Uruguai, com 29%.
Existem ainda outros quatro reservatórios: Passo Fundo, Machadinho e Barra Grande (localizado na divisa entre o RS e Santa Catarina) e Campos Novos, com 30,4% da capacidade no momento. Na soma, comenta Machado, o volume dos seis reservatórios do Estado e de SC correspondem a 40% do subsistema Sul, que, por sua vez, representa somente 6,86% do sistema nacional.
— A situação ainda é confortável, porque considerando que o sistema Sul tem outros subsistemas e que só Rio Grande do Sul e Santa Catarina representam 40% do volume útil, ainda temos uma contribuição para o armazenamento e a geração de energia — sustenta.
Intercâmbio
Como o modelo de operações é o Sistema Interligado Nacional, quando uma determinada região está com baixo estoque, a geração é concentrada em outra com maior disponibilidade. Assim, é feito o intercâmbio de energia entre regiões, com o uso das linhas de transmissão que conectam o país.
Para se ter uma ideia, em 2019, o Rio Grande do Sul consumiu 88,7 gigawatts por hora (GWh) e produziu 136 GWh. Mesmo que o sistema seja integrado, até este momento, a relação era superavitária. Em janeiro deste ano, o subsistema Sul passou a importar 686 MW médios da rede integrada. A região conta com 14% da população brasileira, mas utiliza 17% da energia disponível no país.