A abertura de empresas segue aquecida no Rio Grande do Sul, superando o total de fechamentos nos primeiros quatro meses do ano. De janeiro a abril, o total de negócios constituídos no Estado cresceu 54,06% ante o mesmo período do ano passado, segundo levantamento da Junta Comercial, Industrial e Serviços do Rio Grande do Sul (JucisRS).
Os dados do órgão mostram que 83,9 mil empresas foram criadas no Estado no primeiro quadrimestre deste ano. Esse montante ficou em 54,4 mil no mesmo intervalo de tempo no ano passado. Separando a abertura por tipo de empresa, os microempreendedores individuais (MEIs) seguem liderando a braçadas largas. Essa categoria representa 82,19% do total de empreendimentos registrados no Estado no período (veja mais abaixo).
Esse movimento não é novo. Olhando a série histórica da JucisRS é possível observar que os MEIs vêm ganhando protagonismo desde a instituição desse tipo de negócio, em 2009. O processo de abertura de MEIs é centralizado pelo governo federal.
A presidente da JucisRS, Lauren Momback, afirma que a elevação no número de empresas no Estado, sem contar os MEIs, ocorre em razão de ações do governo estadual, como a isenção temporária de taxas de constituição para alguns tipos de empresa. A diretora também cita gratuidades oferecidas pelo órgão aos empresários:
— Outra ação que a Junta Comercial adotou neste ano foi a implantação das assinaturas avançadas, proporcionando ao empreendedor formas gratuitas de assinar documento digital no nosso portal.
Em relação aos MEIs, a presidente da JucisRS afirma que esse tipo de negócio muitas vezes é usado pelas pessoas na busca por renda ou complementação de verba diante da instabilidade econômica, que foi impulsionada pela pandemia de coronavírus.
O diretor-superintendente do Sebrae-RS, André Vanoni de Godoy, também avalia que o crescimento maior na abertura de empresas no Estado ocorre na esteira da necessidade de conseguir renda em um cenário de incerteza na economia. Segundo o diretor, a abertura do próprio negócio, principalmente no caso dos MEIs, é uma alternativa para a pessoa legalizar o seu trabalho e ter mais oportunidades no mercado formal.
— Isso indica de fato que as pessoas estão procurando alternativas de geração de renda em negócios próprios, porque não encontram ocupação formal em outras empresas. Como alternativa, sobra abrir sua própria empresa, seu próprio negócio, considerando que o MEI se constitui por uma pessoa, com no máximo um empregado — afirma.
Godoy destaca que as pessoas também enxergam no MEI uma oportunidade de ter acesso a proteções, como contribuição ao INSS, e a alguns mecanismos, como emissão de notas ficais, o que permite a prestação de serviços para outras empresas.
O superintendente afirma que as pessoas que pensam em empreender precisam pesquisar o mercado no qual pretendem atuar e estudar o básico de gestão, como formação de preço de mercadoria e gerenciamento de fluxo de caixa.
A economista Maria Carolina Gullo, professora da Universidade de Caxias do Sul (UCS), afirma que o mercado de trabalho está mudando rapidamente, impulsionado pelo momento de crise econômica. Ela destaca que o crescimento na abertura de empresas é um movimento que já vinha ocorrendo a partir da reforma trabalhista, mas que ganhou corpo.
Nesse contexto, as grandes empresas fizeram ajustes na mão de obra, gerando demissões, principalmente dos funcionários com mais idade e maiores salários, segundo a especialista. Esse é um dos fatores que ajudam a explicar esse fenômeno no entendimento da professora.
— Muitas pessoas que se encontram nessa situação, de terem sido demitidas, não conseguirem voltar para o mercado de trabalho formal e possuírem alguma habilidade, acabam abrindo uma empresa, registrando-se como MEI, principalmente, para poder prestar serviços. Inclusive, até mesmo para essas companhias que um dia demitiram elas — observa a economista.
No primeiro quadrimestre, o fechamento de empresas também avançou no Estado na comparação com o ano anterior, mas em ritmo mais lento, crescendo 35,59%.
Expectativa para o segundo semestre
Ao projetar como a abertura de novos negócios deve se comportar no Estado nos próximos meses, os especialistas traçam cenários diferentes em razão das incertezas. No entanto, o entendimento de que o reaquecimento da economia e, consequentemente do mercado de trabalho, depende do avanço da vacinação é praticamente unânime.
Maria Carolina afirma que esse movimento mais acentuado de abertura de empresas deve continuar nos próximos meses, pois a tendência de terceirização continua contribuindo para esse cenário. A dificuldade de garantir vaga para a maior parte da população desempregada também é outro ingrediente nesse processo, segundo a especialista.
— A gente tem uma taxa de desemprego ainda muito alta. Dificilmente vai conseguir colocar toda essa mão de obra para dentro. Acredito que muita gente ainda vai buscar trabalhar por conta na medida em que conseguir se estimular, se sentir incentivada e segura — pontua a professora da UCS.
Godoy estima que a abertura de empresas deve continuar aquecida no Estado no segundo semestre, mas em ritmo menor em relação ao observado no início do ano. No entendimento do diretor do Sebrae, o avanço da vacinação e a recuperação gradual da economia vão criar ambiente mais propício para uma retomada no mercado de trabalho.
— Com o reaquecimento da economia, as empresas deverão reiniciar as contratações. Portanto, aquelas pessoas que abrem empresa por necessidade, tendem a voltar para o emprego formal. Aquelas que empreendem por oportunidade, devem continuar buscando espaço como empreendedores — projeta Godoy.
A presidente da JucisRS também projeta que o aumento de abertura de micro e pequenas empresas deve seguir nos próximos meses, em um cenário com mais otimismo e incentivos estaduais. No entanto, ela salienta que a incerteza em relação ao cenário econômico permanece.