Em ano de crise provocada pela pandemia, jovens empresas ligadas à área de inovação ganham musculatura no Rio Grande do Sul. Em 2020, o Estado soma 945 startups até a última quinta-feira, o que representa alta de 2,9% na comparação com o final do ano passado.
A marca sustenta os gaúchos na terceira posição do ranking nacional. Em termos absolutos, apenas Minas Gerais e São Paulo concentram mais negócios do gênero. As estimativas integram mapeamento da Associação Brasileira de Startups (Abstartups). Mesmo com a chegada do coronavírus, os dados reforçam a tendência de expansão vista nos últimos anos.
Em 2015, por exemplo, o Rio Grande do Sul tinha 183 startups contabilizadas pela entidade, menos de um quinto do número preliminar de 2020. De forma geral, essas empresas buscam desenvolver negócios inovadores, com potencial de crescimento. O uso de tecnologia é um dos diferenciais.
Coordenadora estadual de start-ups do Sebrae-RS, Débora Chagas atribui o avanço nos últimos anos ao "amadurecimento do ecossistema". Segundo ela, um dos estímulos no Estado é a rede formada por instituições e empreendedores. Os parques tecnológicos de universidades ilustram essa situação.
Para auxiliar negócios em fase inicial, o Sebrae desenvolve o programa StartupRS. Conforme Débora, a iniciativa deu suporte a 40 empresas em 2015, o primeiro ano da iniciativa. Em 2020, alcançou cerca de 150 startups, o maior número já registrado até agora.
– Há crescimento em setores como o agronegócio e na área de saúde no Estado. As startups precisam resolver problemas reais. Muitas vezes, o empreendedor se apaixona por uma ideia, mas não consegue encontrar alguém que pague pelo serviço – pondera.
Inserida no agronegócio, a Digifarmz é uma das empresas em crescimento. Desenhada entre 2017 e 2018, a startup aposta em plataforma com dados fitossanitários para reduzir perdas causadas por pragas em lavouras de soja. Atende clientes no Brasil e em vizinhos como o Paraguai. Em outubro, venceu concurso nacional de startups, o Sebrae Like a Boss + Get in the Ring.
– No país, o agro não sofreu durante a pandemia como os setores da indústria e do comércio. Então, seguimos em movimento crescente – conta Alexandre Chequim, CEO e cofundador da DigiFarmz.
Flexibilidade
Presidente da Associação Gaúcha de Startups (AGS), Wagner Bergozza ressalta que incertezas fazem parte do modelo de empresas que buscam inovar – não há garantia de que os negócios irão prosperar.
Por outro lado, menciona o dirigente, startups tendem a apresentar maior flexibilidade para ajustar seu modelo de atuação, e isso joga a favor em períodos de turbulência. No jargão de empreendedores, a decisão de realinhar o negócio é chamada de pivotar.
– Por terem base tecnológica, startups podem fazer pequenos ajustes para se adaptarem ao mercado. É um mecanismo de defesa. A pandemia acelerou a digitalização – diz Bergozza.
Segundo a Abstartups, o Brasil reúne 13,3 mil empresas do gênero. Ao longo de 2020, houve acréscimo de 4,7%. Em setembro, fundos investiram US$ 843 milhões em startups brasileiras, divididos em 37 aportes.
É o maior volume já registrado no período, conforme balanço da Distrito, que acompanha o mercado. A empresa acrescenta que cem fusões e aquisições de startups foram contabilizadas de janeiro a setembro, "o que reforça o ano de 2020 como o maior em número de movimentações deste tipo".
Secretário estadual de Inovação, Ciência e Tecnologia, Luís Lamb descreve o Rio Grande do Sul como "polo de empreendedores". Conforme Lamb, o desafio é mostrar a investidores a existência desses talentos. Para isso, o governo vem realizando programas voltados a startups, como o Startup Lab, afirma o secretário:
– Entre os atrativos, temos potencial humano e uma rede de parques tecnológicos. Inovação é nosso recurso natural.
Mudança digital acelerada
Negócios de variados setores e tamanhos tiveram de acelerar processos de digitalização na pandemia. E essa mudança virtual acabou estimulando startups, destaca Gustavo Comeli, gerente regional da Distrito. A empresa acompanha movimentos no setor de inovação:
– Com a crise, é claro, houve um ajuste que matou algumas startups em segmentos como turismo e eventos. Mas muitas pivotaram, ou seja, mudaram o modelo de negócio. A pandemia forçou a transformação digital. Em termos gerais, para as startups, temos uma análise positiva neste ano.
A Sqed, de Porto Alegre, está entre as empresas de tecnologia que começaram a operar na pandemia. A entrada no mercado ocorreu em maio. À época, a startup lançou aplicativo em que usuários reúnem lembretes variados do dia a dia.
É possível salvar na plataforma desde compromissos de trabalho até avisos sobre atividades de lazer, como assistir a um jogo de futebol. A ideia é integrar na ferramenta o turbilhão de informações presente na rotina das pessoas.
A Sqed já fechou parceria com clientes como Internacional e Grêmio Náutico União, relata Luís Fernando Saraiva, cofundador da startup. Quem contrata a plataforma pode usar a tecnologia para comunicação com seus públicos, diz o empreendedor. Os responsáveis pela Sqed investiram cerca de R$ 800 mil no projeto.
– Com a pandemia, estamos vivendo novos tempos. E novos tempos precisam de novas soluções. O home office, por exemplo, mostra que as coisas estão misturadas. Posso estar trabalhando em casa com meu filho ao lado fazendo seu dever da escola. Trazemos uma solução que busca respeitar isso, e não separar os fatos – diz Saraiva.
Conforme a Abstartups, Porto Alegre abriga 562 empresas do gênero – quase 60% do total no Estado. É o quarto município com mais empresas do setor no país.