Apresentado como opção para aliviar as contas de União, Estados e municípios, o megaleilão do pré-sal teve arrecadação 34,5% menor do que a esperada. Realizado na manhã desta quarta-feira (6), o certame gerou R$ 69,9 bilhões em bônus de assinatura, com falta de concorrência internacional e amplo domínio da Petrobras. A previsão inicial era de que a operação alcançasse até R$ 106,6 bilhões, mas duas das quatro áreas oferecidas não receberam propostas.
Mesmo com a frustração da estimativa, o leilão teve a maior arrecadação da história dos certames promovidos pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Nesta quinta-feira (7), o apetite de investidores estrangeiros será testado outra vez, já que haverá nova disputa por outros cinco blocos do pré-sal. Caso todas as áreas despertem interesse, poderão gerar R$ 7,8 bilhões aos cofres do governo federal — valor bem inferior ao do certame desta quarta.
Previamente fixado, o bônus de assinatura é pago por companhias para ter direito a explorar petróleo e gás natural. Nos leilões, os lances são avaliados conforme o excedente em óleo que é oferecido à União (óleo-lucro). Ou seja, vence quem propõe o maior percentual de ganho futuro ao governo.
No megaleilão, a falta de concorrência com a Petrobras chamou atenção e deixou analistas em alerta. Ao lado das chinesas CNODC e CNOOC, a estatal brasileira formou consórcio e levou a área de Búzios, a maior em disputa. O óleo-lucro oferecido foi de 23,24%, o mínimo necessário. Já o bônus de assinatura para esse bloco estava fixado em R$ 68,19 bilhões. No consórcio, a participação da Petrobras é de 90%. As chinesas têm 5% cada.
A estatal brasileira ainda arrematou, sozinha, o bloco de Itapu. O percentual de óleo-lucro oferecido foi de 18,15%, também o mínimo necessário. O bônus de assinatura para essa área era de R$ 1,76 bilhão. Os blocos de Sépia e Atapu não tiveram interessados.
— O pequeno interesse pelas áreas ofertadas indica que o pacote ficou caro a investidores estrangeiros. O bônus de assinatura talvez tenha sido muito alto. Parece que isso não foi equacionado pelo governo. As empresas estrangeiras também teriam de pagar indenizações à Petrobras pelo que já foi investido na exploração das áreas. Mesmo assim, o resultado não é o fim do mundo. A grande questão é ver como será a disputa de amanhã (quinta-feira) — aponta o analista Walter de Vitto, da Tendências Consultoria.
Os blocos contemplados pelo megaleilão correspondem aos excedentes da cessão onerosa, negociada pelo governo com a Petrobras em 2010. À época, o Planalto cedeu à companhia, sem licitação, o direito de produzir 5 bilhões de barris de óleo equivalente (petróleo e gás natural) em áreas inexploradas do pré-sal, na Bacia de Santos. Em troca, recebeu novas ações da estatal. Com o passar dos anos, levantamentos indicaram que as reservas existentes são superiores aos 5 bilhões de barris, podendo alcançar de 6 bilhões a 15 bilhões.
— A arrecadação frustrou um pouco, porque grandes empresas internacionais não entraram na disputa. Mas o leilão é um sucesso do ponto de vista de que teve regras claras, novos empregos podem ser gerados, e quase R$ 70 bilhões não representam valor pequeno — diz o sócio-fundador da consultoria MaxiQuim, João Luiz Zuñeda.
O bônus de assinatura será repartido entre União, Petrobras, Estados e municípios. Os dois últimos deverão usar os repasses para despesas previdenciárias e investimentos. Se a arrecadação tivesse alcançado R$ 106,6 bilhões, o Rio Grande do Sul deveria receber cerca de R$ 450 milhões. Agora, a projeção é de que o valor caia a R$ 225 milhões.
O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, sinalizou que as áreas de Sépia e Atapu, não arrematadas, devem ser oferecidas novamente a investidores em 2020. O ministro indicou que poderá rever a metodologia das próximas rodadas.
"Sem entrar nos aspectos do negócio do ponto de vista da Petrobras, podemos dizer que o leilão da cessão onerosa deixou muito a desejar por falta de demanda de estrangeiros pelos campos em disputa. Não por acaso, o dólar hoje sobe fortemente", afirmou, em nota, o economista-chefe da Necton Investimentos, André Perfeito.
Crítico às condições do certame, o presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras, Felipe Coutinho, afirmou em nota que o resultado foi "o menos pior" possível. "Considero que o leilão não deveria ser realizado porque é inoportuno e lesivo ao interesse nacional. Acelera o ciclo extrativo e primário exportador, do tipo colonial, do petróleo cru do Brasil. Os critérios prejudicam o interesse nacional", acrescentou.
O resultado do leilão
Bloco de Búzios
- Consórcio vencedor: Petrobras (90%) com as chinesas CNODC Brasil (5%) e CNOOC Petroleum (5%)
- Percentual de óleo-lucro oferecido: 23,24%
- Bônus de assinatura: R$ 68,194 bilhões
Bloco de Itapu
- Vencedor: Petrobras (100%)
- Percentual de óleo-lucro oferecido: 18,15%
- Bônus de assinatura: R$ 1,766 bilhão
Bloco de Sépia
- Sem interessados
Bloco de Atapu
- Sem interessados
Tire suas dúvidas
Por que realizar dois leilões do pré-sal em sequência?
Porque cada um contempla áreas com características diferentes. Os lotes oferecidos nesta quarta-feira são excedentes da cessão onerosa – Búzios, Itapu, Sépia e Atapu. Nessas áreas, existem atividades que indicam a existência de grandes reservas de petróleo e gás natural. Além disso, são blocos em que a Petrobras já investiu, porque antes tinha autorização. O leilão de quinta-feira engloba cinco áreas (Aram, Bumerangue, Cruzeiro do Sul, Sudoeste de Sagitário e Norte de Brava). Nessas, as empresas precisarão fazer estudos para confirmar a existência de petróleo e gás natural em escala comercial. Embora a província do pré-sal seja promissora, há maior risco. Isso explica o valor menor de bônus de assinatura (R$ 7,8 bilhões).
O governo indicou na terça-feira que, em 15 anos, pretende distribuir até R$ 500 bilhões a Estados e municípios em recursos do pré-sal. Essa projeção muda diante do resultado do megaleilão?
Não. O megaleilão teve frustração na estimativa de arrecadação com bônus de assinatura, que poderia ter alcançado R$ 106,6 bilhões. Esse é o valor pago pelas companhias para ter permissão de explorar petróleo e gás natural. A quantia que pode chegar a R$ 500 bilhões é referente a repasses posteriores, quando a produção já estiver em andamento.
O que acontecerá com as duas áreas da cessão onerosa que não foram arrematadas?
Os blocos de Sépia e Atapu deverão ir a leilão outra vez em 2020. Ainda não há data definida para o novo certame. O Ministério de Minas e Energia ainda cogita rever as regras para atrair investidores estrangeiros.