O faturamento do setor cooperativista gaúcho em 2018 (último dado disponível) foi de R$ 48,2 bilhões. Representa aumento de 12,3% na comparação com o ano anterior. Só para se ter uma ideia do bom desempenho, a economia gaúcha teve tímido crescimento de 1,2% no mesmo período. Mas nem mesmo os constantes resultados positivos têm acomodado as cooperativas. A busca por inovação, novas tecnologias e aperfeiçoamento têm sido um mantra dessas entidades.
O setor cooperativista organizou a chamada Missão Vale do Silício. As entidades de saúde foram as primeiras a viajar 10,5 mil quilômetros — entre os dias 29 de abril e 3 de maio — em busca de novidades no ramo que possam ser aplicadas no país e proporcionar o bem-estar aos pacientes. Mais recentemente, viajaram representantes de cooperativas agropecuárias.
A imersão no mundo tecnológico foi organizada pela Escoop – Faculdade de Tecnologia do Cooperativismo.
— As mudanças tecnológicas e comportamentais que a gente vem observando na sociedade têm impactado todas as áreas. E as cooperativas também fazem parte desse contexto. Entendemos que a inovação é um caminho para que a gente consiga manter as cooperativas operantes e crescendo — destaca Carlos Alberto Oliveira de Oliveira, professor e coordenador da instituição.
Engenheiro agrônomo, com mestrado em Agronegócios e doutorando na área de administração com foco em inovação, tecnologia e sustentabilidade, Oliveira conta que a missão começou a ser pensada ainda no ano passado. Para ele, mesmo diante dos constantes resultados positivos, o futuro do setor precisa ser projetado.
— A sustentabilidade das cooperativas vem sendo tratada por meio da inovação — defende.
Para o professor, a missão superou as expectativas do grupo.
— Além de sensibilizar os participantes, nós já observamos iniciativas e ações que foram incentivadas a partir desse momento da missão. A gente vê o processo de intercooperação, que é um dos princípios que temos no cooperativismo, sendo incentivado por meio da inovação — conclui Oliveira.
Missão Saúde
Participaram da primeira missão médicos cooperados da Unimed e dentistas associados à Uniodonto, os dois maiores sistemas cooperativistas do ramo no Rio Grande do Sul. O setor de saúde possui 58 cooperativas, 23,7 mil associados e 10,6 mil empregados em solo gaúcho.
O cardiologista Aldo Pricladnitzki, presidente da Unimed Vales do Taquari e Rio Pardo, foi um dos que participaram da missão. Ele comanda uma equipe responsável por atender 236 mil usuários.
— Já faz um bom tempo que eu venho muito interessado nessa área de inovação. E está faltando no nosso sistema cooperativo Unimed do Rio Grande do Sul uma forma de ter acesso melhor, mais direto a respeito do que está acontecendo nesse mundo que envolve startup, inteligência artificial e biotecnologia — destaca.
Para o médico, foi uma grande oportunidade para ver in loco os avanços da tecnologia.
— Tudo que nós vimos lá, sem nenhuma exceção, mexeu com a nossa cabeça. Nós viemos de lá com uma forma diferente de pensar. E com uma missão forte que nós somos hoje os agentes, dentro do sistema Unimed, responsáveis pelo futuro do que vai acontecer — ressalta.
O doutor em Medicina e Ciências da Saúde e professor na Escola de Medicina da PUCRS Salvador Gullo Neto foi responsável por ciceronear a missão brasileira na área de saúde ao Vale do Silício.
— O sistema cooperativo como um todo não está preparado para esse novo mindset (mentalidade) que a gente vê que está inundando os diversos setores da economia. Existe toda uma outra forma de pensar, de fazer gestão — disse o médico, que atualmente faz pós-doutorado nos Estados Unidos e mora em San Diego.
Salvador foi diretor da Unimed Porto Alegre até decidir viajar para os Estados Unidos para fazer o seu pós-doutorado, que tem como foco a segurança do paciente. Ele, inclusive, é CEO do aplicativo Dr. Rafael, pioneiro no mundo, segundo ele, em que o paciente ou seu familiar avaliam as condições dos hospitais, pelo celular ou tablet, sem a necessidade de preencher formulários e com fácil utilização.
O aperfeiçoamento nos tratamentos da saúde bucal também estava entre os objetivos da Missão Vale do Silício. Para o diretor do ramo saúde do sistema Ocergs/Sescoop e presidente da Federação das Uniodontos do Rio Grande do Sul, Irno Augusto Pretto, a concorrência é mais um item que impulsiona a busca pelo novo.
— Estão começando a entrar multinacionais na área da saúde. Tanto odontológica, quanto médica. E com valores muito baixos. Então, o desafio nosso era saber com quem vamos lidar no futuro — sustenta o dentista.
Segundo Irno, os dentistas ficaram deslumbrados com o que viram de novas tecnologias.
— Uma coisa impressionante. Desconstrói toda a tua linha de pensamento — conta.
Júlio Cesar Cordova Maciel, presidente da Uniodonto Porto Alegre, diz que o Rio Grande do Sul também possui uma série de startups e é celeiro de inovação, mas ainda distante do que existe em território americano.
— O que a gente ouviu lá é a necessidade do que a gente precisa. Tem que ter conhecimento da necessidade. Se a gente não tem, a gente vai ficar correndo atrás do rabo sempre.
Para Maciel, já há como aplicar no país algumas das tecnologias utilizadas no setor de odontologia, como "as relativas à inteligência artificial".
— Através de uma foto é possível fazer o pré-diagnóstico de uma lesão maligna.
Missão Agropecuária
Na semana que passou, também em busca de inovação e novas tecnologias, representantes de 25 cooperativas agropecuárias viajaram ao Vale do Silício. Esse setor possui 128 entidades no Estado, 350 mil associados e 36,6 mil empregados.
— Foi gratificante participar dessa missão ao Vale do Silício. Tivemos o privilégio de ver muito empreendedorismo em um mundo de muita riqueza, mas ao mesmo tempo de tanta simplicidade — destaca Ana Marlize Schreiner, da Cooperativa Cotribá.
Para Martim Fernando Brackmann, da Cooperativa Languiru, o conhecimento adquirido durante a missão é "plenamente aplicável no contexto das atividades já realizadas pelas cooperativas do Rio Grande do Sul".
— Logicamente, tudo em sua devida proporção de tempo e espaço, mas o legado mais importante deixado pela missão é que existem muitas oportunidades no mercado e que inovar é preciso. E que as empresas que não acompanharem estas transformações terão num futuro próximo grandes dificuldades de se viabilizar economicamente — destaca.
Próxima missão
No dia 28 de setembro, representantes de cooperativas de crédito viajam para a última missão deste ano para o Vale do Silício. O setor possui 86 entidades no Rio Grande do Sul, dois milhões de associados e 10,7 mil empregados.