Grampo da Polícia Federal (PF), na Operação Carne Fraca, flagrou o funcionário da Seara/JBS, Flávio Cassou, conversando com o fiscal Eraldo Cavalcanti Sobrinho, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, sobre "oito certificados" necessários para uma exportação para a China. Em relatório, a Federal apontou para "descumprimento de normas".
No diálogo capturado pela Carne Fraca, Flávio Cassou diz a Eraldo que tem "oito certificados aqui navio para embarcar".
– Pra China? – questiona o fiscal.
– Pra China, daí eu pensei o seguinte: que tal nós arriscar (sic) carcar o seu. Daí embarcar vai, se tiver que voltar nós trocamos, que você acha? – propõe Cassou.
– Lá no Ministério não tem ninguém habilitado? – procura saber Eraldo.
– Não tem mais ninguém. A Maria tá viajando; tem a Marcia, mas a Marcia eu já cansei de fazer dessa de mandar e voltar, o dela também não tá aprovado né – explica o homem da JBS na Carne Fraca. – Eu tava pensando dentro daquele troço que os caras tão fazendo, numa dessa nós mandamos, a empresa tá consciente. Vou mandar com o risco de voltar e ter que ser trocado; a empresa topa.
– Mas chega lá não dá problema, Cassou? – pergunta Eraldo.
– Não, não vai dar problema, porque eles não recebem, a empresa traz de volta, refaz e faz de volta com outros, anula aquele e faz um novo. Só que não perde o embarque né – afirma Flávio Cassou.
O fiscal responde.
– Pois é, vamos pregar fogo né.
– Vamos pregar fogo. Daí, amanhã, eu mando pra você. Você me diz a hora que é bom, eu mando bater aqui, tem mais um ou dois aí eu já mando junto daí – diz o funcionário da JBS.
– Vou de manhã lá no Ministério, Cassou, acho que depois do almoço aqui né – afirma o fiscal.
Flávio propõe.
– Uma hora duas horas na tua casa.
– Uma e meia, duas horas – diz o fiscal.
– Então não se assuste que vou mandar oito China pra você – afirma Flávio.
– Manda … assinamos aí – diz o fiscal.
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Em manifestação ao juiz Marcos Josegrei, da 14ª Vara Federal, em Curitiba, a PF se refere ao diálogo e aponta para o descumprimento de normas.
"Fica claro, portanto, o descumprimento das normas do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento que, frise-se, não se tratam de mera burocracia, mas controles para garantir o consumo de alimentos sadios. Infelizmente, nem os fiscais, nem as empresas tem essa preocupação", destaca a investigação da Carne Fraca.
Na decisão que mandou deflagrar a Carne Fraca, em 17 de março, o juiz também destacou trechos do diálogo entre Flávio Cassou e o fiscal Eraldo. Segundo o magistrado, "a emissão de certificados pelos servidores competentes do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento deve cercar-se de prévio e rígido controle e verificação dos produtos a serem regularizados para venda/exportação".
"Nos casos de exportação, o responsável pela emissão deve acompanhar o carregamento dos contentores de exportação. Infelizmente, não é o que se observou até o momento", observou Marcos Josegrei.
O juiz apontou para o "modus operandi".
"Quanto às exportações, a emissão de Certificado Sanitário Internacional também era feita de maneira puramente formal, havendo empresas, como a Seara, representada por Flávio Evers Cassou, que aceita até arriscar o não embarque da carga, devido à assinatura de certificados por fiscal não autorizado a tanto", anotou o magistrado.
A reportagem entrou em contato com o Ministério da Agricultura e deixou o espaço aberto para manifestação.
Pelo lado da JBS, a companhia informou que opera de acordo com a legislação e mantém rígidos padrões e processos para garantir a qualidade dos seus produtos. A empresa disse ainda que não compactua com qualquer desvio de conduta de seus funcionários e tomará as medidas cabíveis.
*Estadão Conteúdo