Vastos campos tingidos de roxo e o perfume da lavanda pairando no ar, em uma paisagem digna de cartão postal. Em um primeiro momento, a cena descrita pode remeter à região de Provence, na França, mas ela tem se tornado cada vez mais comum no Rio Grande do Sul, especialmente em Morro Reuter. O pequeno município do Vale do Sinos, de 6,5 mil habitantes, passou a apostar no cultivo da planta nos últimos anos e hoje é o maior produtor em escala comercial do país.
A Emater estima que, atualmente, há 22 famílias dedicadas ao cultivo da lavanda em Morro Reuter e a área chega a 12 hectares. Com pelo menos duas safras ao ano, a cultura rende em torno de 84 toneladas a cada ciclo. O segundo corte de 2020 está na reta final e deverá ser finalizado na próxima semana. Responsável por prestar assistência técnica aos agricultores, o extensionista Evandro Knob ressalta que o potencial produtivo deverá seguir aumentando.
— A tendencia é a produção aumentar no decorrer dos anos. Já temos produtores expandindo a área e outros começando a plantar para o próximo ano — destaca.
O avanço da lavanda nas propriedades rurais de Morro Reuter tem relação com a estrutura local, que abrange todos os elos da cadeia produtiva. O município tem um viveiro de mudas de lavanda, assistência técnica e uma empresa que extrai o óleo essencial da planta. Com isso, o agricultor tem fácil acesso a insumos e mercado garantido para a colheita.
A adaptação da lavanda é fruto de tentativas, acertos e erros ao longo do tempo. Para viabilizar o cultivo, Knob buscou referências no Exterior. Foi em cima de análises de solo da França que ele fez adaptações para o manejo em Morro Reuter. Algumas variedades da planta foram cultivadas e apenas uma se consolidou até o momento, a dentata. Essa é a lavanda que hoje domina as lavouras do município, suportando bem o frio intenso do inverno e o calor do verão. O único ponto fraco é o excesso de umidade, que pode afetar a produtividade.
Geração de renda
Com dois hectares de lavanda, Ari Closs é hoje o maior produtor no município. Até o início do ano, ele trabalhava como motorista em uma fábrica de calçados da região. Com a crise do coronavírus, perdeu o emprego e passou a se dedicar exclusivamente à lavanda. Até teve proposta para retornar à antiga função, mas recusou.
— Em um ano dá para tirar com a lavanda o que eu demorava quatro ou cinco anos na fábrica. Tenho 22 mil pés plantados e até o final do ano devo chegar a 40 mil. Estamos muito animados — diz.
Closs também adquiriu o maquinário necessário para extrair o óleo essencial, proveniente da massa verde (caule e folhas) e da flor da lavanda, e comercializa a produção para uma empresa de Santa Maria. Na região central, o líquido é envasado e transformado em produtos de aromaterapia.
Além da renda gerada com a venda para a extração de óleo essencial, a lavanda também fomenta o turismo. Com criação de cabras e produção derivados do leite, Toni Pilatti decidiu abrir um café colonial na propriedade rural. Para chamar a atenção de quem passa pela região, decidiu plantar lavandas no local. A aposta deu certo. Com dois anos de existência, o Café do Capril fica lotado aos finais de semana. Crianças e adultos se encantam com a plantação, que é alvo das selfies e até mesmo palco de books de casais e aniversariantes.
— A lavanda é um imã para turistas. É impressionante a curiosidade que a plantação desperta — relata Pilatti, que conduz a propriedade com a esposa, Isabel, e conta com o envolvimento da filha Bianca, de oito anos.
Mas as lavandas não estão no Café do Capril só para enfeite. A flor roxa é utilizada em receitas do café colonial, como pudim, branquinho e limonada. Além disso, a família Pilatti comercializa a produção para a empresa do município que fabrica óleos essenciais, sabonetes e cosméticos.
Lei municipal incentiva cultivo
A produção de lavanda em Morro Reuter começou a tomar forma no final da década de 1990. Na ocasião, ao visitar o local, o paisagista francês Renê Bessi fez um desenho do município tomado por campos de lavanda. Maravilhado com o projeto, o então prefeito Wilson Rheinheimer decidiu colocar em prática a ideia.
Nos anos 2000, algumas tentativas foram realizadas para viabilizar o plantio em escala, mas pouco se avançou. A situação começou a mudar a partir de 2014, com a criação de uma lei municipal de incentivo à produção, e se consolidou em 2016 com a instalação da Naturoils, empresa que extrai o óleo essencial da lavanda. Em meio a esse contexto, a Emater garante assistência técnica aos interessados no plantio.
— A prefeitura é parceira ao fornecer serviços de máquinas e o transporte da lavanda da propriedade até a empresa que extrai o óleo — relata Sônia Feldmann, secretária municipal de Agricultura, Indústria, Comércio, Turismo e Desporto.
A Naturoils absorve a produção da maioria dos produtores de lavanda de Morro Reuter. Criada em 2009 pela química Yamara Eichner, a empresa foi atraída ao município justamente pela perspectiva de ter lavanda fresca à disposição. Durante o período de safra, costuma beneficiar 50 quilos da planta por dia, o que rende entre cem e 130 mililitros de óleo essencial. O líquido é utilizado em produtos de aromaterapia, sabonetes e cosméticos, entre outros itens.
— A lavanda é nosso carro-chefe, reponde por metade da nossa produção — salienta Yamara.
A empresa remunera os produtores conforme a quantidade de óleo que é extraído da lavanda e comercializa os produtos para todo o país.