"Não existe aposentadoria em termos de sexualidade" é a primeira frase que a psicóloga e terapeuta sexual Lúcia Pesca utiliza para começar essa conversa sobre como manter uma vida sexual ativa e interessante após os 60 anos. O que ocorre naturalmente a partir dessa idade são mudanças físicas e emocionais, explica a terapeuta, de forma que é preciso prestar atenção a elas e fazer uma espécie de recalibragem: é hora de diminuir as expectativas com relação à performance no sexo e aumentar o interesse e o tempo dedicado a conhecer novas regiões erógenas, intensidades e acessórios que podem ajudar na busca pelo prazer.
Para Lúcia, a grande virada de chave que ocorre nessa fase da vida é o processo de "desgenitalização", que quer dizer que o prazer não pode mais ficar centrado somente nos genitais feminino e masculino, e sim em todo o corpo. É também o momento de focar na intimidade com o parceiro fora da cama por meio de conversas, agrados e carícias no dia a dia que vão culminar em uma experiência sexual mais honesta e gostosa para os envolvidos.
— A partir dos 60 anos, o sexo beneficia muito pois aproxima as pessoas e melhora a autoestima. O corpo e a energia para ficar transando não são mais os mesmos da juventude, mas conseguir ter bons contatos eróticos e sexuais apesar destes fatores melhora o humor, a autoestima e até o sono. Quem no dia seguinte de uma boa transa não fica feliz? — afirma.
Tenha paciência e dedique-se às preliminares
Para as mulheres, as alterações hormonais motivadas pela menopausa têm impacto principalmente na lubrificação da vagina e na libido, o desejo sexual. Para os homens, o grande problema é a ereção, que fica mais lenta, requer um estímulo maior e dura menos tempo.
— Vai existir excitação e vai existir orgasmo, só que é tudo muito mais demorado. A mulher vai precisar de mais tempo de preliminares para ficar excitada, para poder chegar ao orgasmo. Já o homem nessa faixa etária, como pode estar com receio da disfunção erétil, quer partir direto para a penetração no momento em que consegue a ereção. Ele quer ser mais rápido e ela precisa que seja mais devagar: é nesse descompasso que moram os problemas — afirma Lúcia Pesca.
A dica das especialistas ouvidas por Donna é ter paciência, carinho e lembrar que, embora a penetração seja importante, todo o corpo é erotizável e pode dar prazer. Segundo a sexóloga, ginecologista e terapeuta de casais Michelli Osanai, as carícias preliminares, os toques, o cheiro, o beijo e os sussurros ao ouvido fazem parte de um contexto de sensações que despertam o desejo.
— A excitação em si é uma sensação prazerosa e necessária para chegar ao orgasmo, que é o clímax do prazer, mas não é o único prazer no encontro sexual e não garante satisfação. O contato pele-a-pele em si é prazeroso. O olho-no-olho é prazeroso. O abraço e o relaxamento depois do sexo são prazerosos. O prazer é ainda maior quando há conexão e a entrega para as inúmeras experiências sensoriais que o sexo proporciona. Investir e explorar diferentes estímulos ampliando as sensações agradáveis enriquece a relação — afirma Michelli.
Fortaleça a intimidade e a comunicação
Rotina é algo que não combina com desejo sexual, lembra Michelli. A paixão e o desejo requerem cuidado e investimento constante dos parceiros, que precisam fazer um esforço em alimentar a relação com pitadas de erotismo, sedução e aventura.
— A paixão e o desejo, mesmo numa relação longa, são nutridos através do estímulo diário, com o novo, o inesperado. Uma viagem ou passeio, um jantar a dois, um presentinho surpresa, uma massagem. Mensagens insinuantes, fotos sensuais, jogos sexuais, creminhos, óleos térmicos e perfumados, músicas românticas, vibradores e acessórios diversos disponíveis em sex shops — lista a terapeuta.
A intimidade quando permite o diálogo entre os parceiros favorece muito a vida sexual.
MICHELLI OSANAI
Sexóloga, ginecologista e terapeuta de casais
Um problema frequente observado pelas profissionais é a timidez e constrangimento para falar quando o assunto é sexo na terceira idade, desconforto causado em parte pelos preconceitos e tabus que rondam o tema. Mas, para conseguir trazer elementos novos para a relação, é preciso dialogar sem medo de julgamento.
— A intimidade quando permite o diálogo entre os parceiros favorece muito a vida sexual. Um canal de comunicação aberto permite colocar suas preferências e necessidades, não somente nas questões sexuais, mas também nas questões do dia-a-dia que impactam na sexualidade do casal — explica Michelli.
A conversa franca antes do sexo também ajuda a colocar para fora as inseguranças (medo de desconforto, de não estar lubrificada, de não ter ereção) e a despertar um senso de empatia no outro.
— Às vezes, com o passar do tempo, não se consegue mais falar sobre sexo, as pessoas ficam constrangidas pelas dificuldades. É por isso que tem que haver uma redefinição da intimidade. Se antes quando iam transar partiam direto para tocar com a mão lá embaixo ou para a penetração, hoje a intimidade tem que ocorrer primeiro e principalmente fora da cama, com mais abraço, mais beijo, mais conversa, mais elogio, tudo fora do sexo — afirma Lúcia.
Use lubrificantes e brinquedos sexuais
Mesmo quem passou os primeiros 60 anos da vida sem usar lubrificantes deveria dar uma chance para a substância, que é uma aliada do prazer principalmente nesta fase em que a pele da região genital tende a ficar mais ressecada e menos sensível ao toque. Quando usado sem exageros, na quantidade certa, o produto aquece, relaxa e ajuda a deslizar na hora de uma massagem ou da relação mesmo:
— Pode ocorrer uma diminuição da sensibilidade ao toque na região genital e, na mulher, por exemplo, a excitação e o orgasmo podem ser mais demorados. O uso de lubrificantes na penetração e de vibradores principalmente sobre a região do clitóris podem incrementar o estímulo sexual e facilitar muito a resposta sexual — explica Michelli.
As médicas lembram que comprar e usar brinquedos sexuais — que podem ser bons aliados na estimulação sexual de homens e mulheres — ainda é visto com uma grande carga de preconceito, mas que vale a pena driblá-lo e permitir-se experimentar as sensações que alguns acessórios podem trazer, seja na relação a dois ou individual. Segundo Lúcia, a dica para as mulheres é dar preferência para os vibradores ou aparelhos de sucção mais focados no clitóris, sempre aliado ao uso de lubrificante.
— Os melhores brinquedos para as mulheres nessa faixa de idade não são os dildos, e sim os aparelhos para o clitóris, de vibração e de sucção. Esses vibradores pequenos e intensos podem e devem ser usados na região toda. Para os homens, os aneis penianos são uma boa ideia para aumentar o prazer. Ficam vibrando na base do pênis e ajudam na estimulação e na concentração do sangue no local — afirma Lúcia.
Ative lembranças sexuais positivas
Uma das melhores características dessa fase da vida, observa Lúcia Pesca, é que o pensamento fica menos distraído, mais focado em uma ação de cada vez, o que é importante para que haja mais prazer e atenção na relação. Mas, se mesmo conectado, o par estiver com alguma dificuldade ou receio diante da transa, a terapeuta recomenda a estratégia de trazer à imaginação momentos sexuais agradáveis vividos anteriormente, preferencialmente com aquele mesmo parceiro.
— Ativar vivências muito boas sexualmente funciona muito. No momento em que estamos tendo dificuldade e produzindo pensamentos como "não estou ficando excitada", "não estou conseguindo ereção", "não está dando certo", ficar focando só no problema pode piorar a situação. Por isso, ajuda muito ativar a memória erótica, trazer do nosso reservatório algumas lembranças positivas sexuais. Com isso, na hora da transa, tu começa a lembrar dessas situações, começa e se excitar mais e fica com menos medo — aconselha.
Fazer exercícios para o fortalecimento dos músculos da região pélvica é uma estratégia para melhorar as sensações na região genital, a excitação e o orgasmo. Michelli explica que alguns dos mais conhecidos são os chamados exercícios de Kegel, que foram originalmente desenvolvidos como um método para controlar a incontinência em mulheres.
Mas para além da saúde urogenital, esses exercícios promovem fortalecimento muscular, aumento da irrigação sanguínea, da consciência corporal e das sensações vaginais. Podem ser feitos sem uso de qualquer equipamento, mas a introdução de bolinhas de pompoarismo na vagina para contração voluntária da região também ajuda a fortalecer a musculatura.
— A vagina e o clitóris são cercados de músculos e, quando estes estão bem desenvolvidos e tonificados, as contrações musculares que ocorrem durante o orgasmo são mais intensas, potencializando as sensações prazerosas no clímax. Desta forma, tornam a mulher mais ativa e responsável pelo próprio prazer sexual e também proporcionam mais prazer ao parceiro — afirma Michelli.
Aposte na posição sexual que dá certo
É consenso entre as terapeutas que, após os 60 anos, a posição sexual mais recomendada é aquela mais confortável e prazerosa para os envolvidos. É importante observar os limites do corpo e eventuais desconfortos pois, se determinada posição estiver causando dor, será difícil focar nas sensações prazerosas. Também há como tornar as posições mais confortáveis usando travesseiros, almofadas e edredons.
— Se uma pessoa tem dor nos joelhos na posição de quatro, por exemplo, pode-se apoiar os joelhos em um travesseiro, ou até mesmo elevar o tronco sobre uma pilha de almofadas estabilizando o corpo. É uma dica que dou aos pacientes. A posição de lado, com um travesseiro entre as pernas também costuma ser mais confortável. Recomendo explorar e testar diferentes posições, o que permite experimentar novas sensações e estímulos, buscando ser criativo ao invés de fazer sempre do mesmo jeito. Aceite as mudanças vindas com a idade e adapte-se a elas — incentiva Michelli.