Neste 7 de agosto, a Lei Maria da Penha, um marco crucial por introduzir a qualificadora de "violência doméstica" nos casos de lesões corporais estabelecidas pelo Código Penal, completa 18 anos.
A relevância dessa legislação fica ainda mais evidente no contexto atual. Em 2022, por exemplo, o Brasil registrou 1,4 mil casos de mulheres vítimas de feminicídio, ressaltando a necessidade contínua da política.
Os dados do Monitor da Violência, do portal g1 e do Núcleo de Estudos da Violência da USP (NEV-USP), apontam que são uma morte a cada seis horas, em média. Esse número é o maior registrado no país desde que a lei de feminicídio entrou em vigor, em 2015.
Impacto das medidas
Para Mayra Cardozo, que trabalha com casos pro bono para o Instituto Maria da Penha, é importante entender que a Lei Maria da Penha não criou um crime de violência doméstica.
— Ela impulsionou a inclusão no Código Penal de um patamar de pena mais rígido nos casos de lesões corporais qualificadas por violência doméstica. Além disso, foi propulsora dos juizados especializados de violência doméstica contra a mulher e proibiu, em casos de violência doméstica, a sanção pecuniária. Instituiu as medidas protetivas e especificou as formas em que podem se dar a violência contra mulher — explica.
Relevância internacional
Para além da sua relevância em âmbito nacional, o caso Maria da Penha viabilizou a exposição da pauta da violência doméstica e familiar contra a mulher no Brasil também internacionalmente.
— A principal importância da lei pode ser traduzida em um conjunto de grandes marcos para o direito das mulheres. Tais quais: a criação de mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e as importantes alterações legislativas que tornaram possível a alteração das sanções relacionadas à violação aos direitos das mulheres também na esfera penal — comenta a advogada Poliane Almeida.
Abaixo, confira alguns mitos e verdades sobre a Lei Maria da Penha:
1. A Lei Maria da Penha não faz diferença
MITO. É crucial compreender que, desde sua criação, a lei desempenhou um papel importante no enfrentamento da violência doméstica, assegurando a segurança e o bem-estar das vítimas.
Além de fortalecer as penalidades para agressores, a legislação também estabelece medidas de salvaguarda, como a possibilidade de afastar o agressor do domicílio da vítima, a proibição de aproximação em relação à vítima e seus familiares, acesso garantido a apoio jurídico e assistência social para as vítimas.
Mayra Cardozo destaca que, apesar da necessidade de um contínuo esforço para eliminar a violência contra as mulheres, tal política não deixa de ter relevância.
— Embora ainda haja muito a ser feito para erradicar a violência contra as mulheres, a Lei Maria da Penha é um importante passo na direção de uma sociedade mais justa e igualitária — defende a profissional.
2. A lei já passou por mudanças conforme os anos
VERDADE. Desde 2017, a Lei Maria da Penha passou por relevantes modificações, incluindo a Lei 13.505, que estabelece a preferência pelo atendimento de mulheres em situação de violência doméstica e familiar por parte de policiais e peritos do sexo feminino. A Lei 13.641 também merece destaque, pois aborda a classificação do descumprimento das medidas protetivas de urgência como crime.
Recentemente, uma alteração foi implementada em relação às medidas protetivas de urgência, permitindo o afastamento do agressor do local de convívio com a vítima, mesmo sem autorização judicial.
3. A Lei Maria da Penha não se aplica para mulheres trans
MITO. Em 2022, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) emitiu um veredito determinando a aplicabilidade da Lei Maria da Penha a mulheres trans. O
Ministério Público Federal enfatizou o direito das mulheres transexuais à proteção conferida pelas medidas da Lei Maria da Penha, independentemente de terem ou não passado por cirurgia de transgenitalização. A relevância dessa decisão do STJ vai além da luta das mulheres trans, representando também um alinhamento do Brasil aos princípios internacionais dos direitos humanos.
— Além de representar uma vitória na luta dos direitos humanos, esse posicionamento representa um alinhamento do Brasil em relação às diretrizes jurisprudenciais internacionais com sistema regional de proteção dos direitos humanos — entende Mayra Cardozo.
4. A aplicação da lei ainda pode melhorar
VERDADE. Ainda que a Lei Maria da Penha represente um marco histórico indiscutível no progresso da luta pelos direitos das mulheres, subsiste um desafio substancial, de caráter estrutural e cultural, cuja solução completa a legislação não é capaz de proporcionar: a dificuldade que as vítimas enfrentam ao relatarem a violência que sofrem e ao identificarem seus agressores.
Isso ocorre devido a várias razões que envolvem o grande problema da subnotificação:
- O medo de retaliação
- O constrangimento
- A dependência econômica
- A falta de preparo dos profissionais
- O desmerecimento
- O descrédito da sociedade
— A Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006, é completa e potente para criar e assegurar mecanismos de proteção de mulheres que se encontram em contexto de violência doméstica. Entretanto, a estrutura social e patriarcal da sociedade ainda apresenta demandas que apenas a legislação não seria capaz de solucionar por si só — finaliza a advogada Poliane Almeida.