Hoje, depois de viver a maternidade na pele, quais conselhos você daria para aquela mulher inexperiente e cheia de idealizações? Neste Dia das Mães, a Revista Donna convidou cinco leitoras para fazer esse exercício: escrever uma carta pensando no início da sua caminhada, quando ainda carregavam seus bebês dentro da barriga. Naquela época, elas não faziam ideia do que viria pela frente – do susto da gravidez de gêmeas a um filho com autismo, da solidão do pós-parto ao medo de esquecer do lado mulher, profissional e de tantas outras facetas. A seguir, leia o relato sincero de Andrea da Silva Crespo Bosio. E prepare-se: já deixe o lenço à mão, porque a chance de você se identificar e se emocionar é gigante. Feliz Dia das Mães!
"Sabe o que mais vai doer? A sociedade não estar preparada para o seu menino"
"Siga seu instinto, você não está maluca. Por mais que todos digam que é ‘coisa da sua cabeça’, seu filho precisa de ajuda. Não desista. Serão dezenas de consultas em pediatras, neurologistas, psicólogos, quase dois anos de busca por respostas. Por que o Bruno está regredindo na fala? Por que parece não prestar mais atenção quando falo com ele? Nesse longo caminho, você se sentirá extremamente sozinha e vai cair no choro. E ainda precisará ouvir comentários do tipo ‘ele não tem nada, você que quer dar remédio para a criança ficar mais calma’ e ‘para de querer achar coisa onde não tem’. Mas, por mais que esteja decidida a encontrar um diagnóstico, não se engane: quando o médico disser com todas as letras que ele está no espectro autista, você vai baquear. Vai sair zonza do consultório do milésimo pediatra com aquele papel na mão e respirar várias vezes para se acalmar antes de entrar no carro. No fundo, será uma sentença de que seu filho pode não alcançar as expectativas que você criou para ele ainda na gestação. E isso dói. Você já tinha definido que ele seria fluente em inglês, tocaria piano e iria para a aula de escultura. E agora?
Não olhe para trás procurando motivos para ele ser do jeito que é. Foque no futuro. Será difícil, mas você terá gratas surpresas pelo caminho.
Ao mesmo tempo que está cheia de dúvidas sobre o futuro, vai se sentir aliviada. Finalmente o Bruno terá um tratamento adequado. E, mais do que nunca, precisará de você. Não se culpe em optar por trabalhar meio período para acompanhar o Bruno nas terapias, será realmente uma gincana semanal de especialistas. Não olhe para trás procurando motivos para ele ser do jeito que é. Foque no futuro. Será difícil, mas você terá gratas surpresas pelo caminho. Ele vai te abraçar preocupado com o seu nariz vermelho de rinite, pensando que você ‘está triste’. Ele vai fazer aula de bateria e se apresentar com a turma da escola tocando bongô de forma espetacular, deixando todos boquiabertos. Ele vai se jogar no chão para acalmar o outro colega autista que está em uma crise de fúria e não consegue controlar seus sentimentos. Ele vai ser o seu grande parceiro de viagens, de aventura e vai te desafiar a se superar para acompanhá-lo no arvorismo.
Sabe o que mais vai doer no fim das contas? A sociedade não estar preparada para o seu menino. A negativa de meia dúzia de escolas que, ao saber que Bruno é autista, cancelarão a matrícula. Os olhares na praça de alimentação do shopping enquanto ele almoça e mostra certa ansiedade para engolir a comida. Muitos o julgarão como mal-educado, e você como péssima mãe. Você ficará calejada. E já fica o aviso: vai doer mil vezes mais quando ele perceber que está sendo excluído. E quando isso acontecer, quem estará ali para abraçá-lo e consolá-lo será você. Serão vocês dois contra o mundo, sempre".
Andrea da Silva Crespo Bosio, 42 anos, fisioterapeuta, de Porto Alegre, mãe do Bruno, 14 anos.