Carol Spencer, de 86 anos, é provavelmente a estilista de moda mais influente da qual você nunca ouviu falar. Na metade da década de 60, ela criou uma saia lápis vermelha combinando com uma blusa sem mangas branca que tinha costura vermelha aparente e três botões da mesma cor na frente. Luvas curtas e brancas acompanhavam o modelo, que foi vendido aos milhares.
Nos anos 70, bastante consciente de que as regras de vestimenta e os costumes da contracultura que sugeriam mais liberdade tinham virado tendência, Spencer desenhou um vestido longo frente única com estampa de bandana vermelha e uma camisa casual para homens. Essas criações também se popularizaram.
Nos anos 1980 de Nancy Reagan, Spencer se voltou para a aparência sofisticada, concebendo um vestido de gala com um ombro apenas de jacquard azul com uma flor de organza aplicada na cintura bem marcada e uma capa. Um dos estilistas frequentados por Reagan concedeu pessoalmente a autorização para que fosse vendido com sua assinatura: "Oscar de la Renta para Barbie".
Spencer já produziu vestidos de noiva, saris, botas go-go e túnicas. Tudo em miniatura. De 1963 a 1999, ela foi a estilista da Barbie, uma carreira celebrada no novo livro que está lançando, chamado Dressing Barbie (Vestindo a Barbie).
Spencer também fazia suas próprias roupas e disse não ter tido dificuldades para trabalhar com as proporções pouco usuais da boneca porque eram parecidas com as suas.
– Encolhi, mas naquele tempo eu era alta e magra. Minha cintura tinha 40 centímetros e meu busto também tinha volume, tinha mesmo, mas as pernas da Barbie eram mais bonitas do que as minhas – relembrou.
Contudo, era outra parte do corpo que importava para o trabalho:
– Tenho mãos pequenas – disse, sentada em sua sala de jantar. Ela vestia uma blusa em um tom que só pode ser descrito como "rosa Barbie", um broche da Barbie e um relógio digital da Barbie que milhares de garotas provavelmente imploraram para ganhar de Natal nos anos 90.
Ao criar o guarda-roupa para a Barbie e a comitiva (Skipper, Ken, Midge, Big Jim, a irmãzinha Kelly, Cara, Stacey, Christie, P.J., Steffie e Miss América), Spencer fez parte de uma equipe que inspirou o trabalho de estilistas, incluindo Bob Mackie, Nicole Miller, Jeremy Scott e Jason Wu – este contou uma vez que costumava brincar com bonecas Barbie na infância.
Mesmo após aposentar-se, o tempo de Spencer é dedicado à Barbie. Tendo conquistado em 2017 um lugar no hall da fama que celebra mulheres da indústria dos brinquedos, produtos licenciados e entretenimento (o Women in Toys, Licensing & Entertainment Hall of Fame), ela passou seus anos dourados frequentando eventos de colecionadores da Barbie, fazendo pesquisas e reunindo artefatos.
Durante anos, trabalhou no livro Dressing Barbie, obra pensada para ser exibida em mesas de centro e cujo subtítulo é: "Uma celebração das roupas que marcaram a boneca fashion preferida dos Estados Unidos e a incrível mulher por trás delas". Para o projeto, recebeu ajuda da escritora e estilista Laurie Brookins.
Nascida em 1932 e criada em Minneapolis, Spencer rejeitava o destino "esposa e mãe" reservado às mulheres americanas da metade do século e, em vez disso, desenvolveu uma carreira.
– Realmente me apaixonei pela Barbie desde a primeira vez que criei roupas e acessórios para ela – confidencia no livro.
A Barbie tem sido o emblema de tudo que exerce má influência sobre meninas e jovens americanas. Vivendo em um mundo quase exclusivamente branco, a boneca tem seios desproporcionalmente grandes para o tamanho dos quadris, e os pés estão permanentemente em determinada posição, como se ela estivesse usando salto alto. O cabelo parece alvejado de tão loiro. Às vezes, ela se veste de médica ou política, mas não parece capaz de permanecer em um emprego. E tem a casa em Malibu. Ela veio de um fundo fiduciário ou do Ken?
Spencer, entretanto, gostaria de contra-atacar as críticas que Barbie recebe. Ela lembra das origens humildes da boneca, que teve as medidas modeladas a partir de bonecas de papel recortadas de jornais. Ela também defende a Barbie como uma alternativa saudável aos videogames; um motor da imaginação para meninas e meninos que podem projetar na boneca o que desejam ser.
– É uma brincadeira saudável – argumentou.
Spencer é uma colecionadora ávida, sempre de olho em preciosidades num mundo em que tudo é jogado fora. Um dia, no escritório da Mattel, quando este ainda estava localizado na cidade californiana de Hawthorne, ela percebeu que alguém estava prestes a mandar para o lixo uma peça importante do universo Barbie.
– Era o protótipo do buggy para dunas da Barbie. Eles estavam jogando fora e eu disse: 'Vocês poderiam me dar?'– contou.
Durante a Segunda Guerra Mundial, tudo era escasso e me lembro da família comprando o jornal de domingo. Quando meus pais terminavam de lê-lo, me davam a página dos quadrinhos para que eu pudesse cortar as bonecas de papel".
CAROL SPENCER
estilista de moda
Ela aprendeu a economizar e reutilizar coisas ainda quando criança.
– Durante a Segunda Guerra Mundial, tudo era escasso e me lembro da família comprando o jornal de domingo. Quando meus pais terminavam de lê-lo, me davam a página dos quadrinhos para que eu pudesse cortar as bonecas de papel – lembrou-se.
Ela começou a elaborar roupa de papel para essas bonecas, mas ser uma estilista de moda não parecia um objetivo realista naquele tempo, como ela recorda:
– Você podia ser professora, enfermeira, secretária ou atendente de banco. Mas ser esposa e mãe eram os maiores objetivos.
Ela chegou a ficar noiva de um estudante de medicina, mas, quando percebeu que esperavam que ela trabalhasse para ajudar a pagar pelos estudos e que depois deveria se demitir para virar "a esposa de um médico", terminou o compromisso. Então se matriculou na Faculdade de Arte e Design de Minneapolis, onde conquistou seu diploma em belas-artes com especialização em moda.
No fim de 1962, Spencer viu um anúncio no jornal de moda "Women's Wear Daily". "Uma fabricante nacional líder da indústria, com vendas anuais acima dos 50 milhões de dólares, procura uma estilista de moda que faça boa gestão de custos para trabalhar na instalação de Los Angeles." Ela enviou um currículo, mas não obteve resposta. Mesmo assim, sentindo que aquele emprego misterioso era seu destino, atravessou o país de carro com uma tia até a Califórnia.
Em abril de 1963, ela viu um anúncio na publicação de moda "California Apparel News" para a mesma vaga e, dessa vez, sua candidatura recebeu uma resposta. Era da Mattel, a fabricante de brinquedos já conhecida pela Barbie.
Spencer foi à sede da empresa para fazer uma entrevista e lhe foi solicitado que criasse uma série de modelos para essa criatura. Ela fez um biquíni de peça única com top frente única e parte de baixo estilo shortinho em tom rosa alaranjado. Acompanhavam o modelito uma saída de praia e uma saia tipo envelope. Ela conseguiu o emprego.
Naquela época, a Mattel elaborava 125 roupas ao ano para a boneca e o departamento de moda, dirigido por Charlotte Johnson, podia ser voraz.
– Charlotte tinha uma teoria – começou a explicar. –Se há quatro designers, você os posiciona em quatro cantos. Era sempre competitivo e você sempre tinha de vender seu produto. Por vezes, a competição chegava a ser suja.
Como? Ela não diz.
– Não faço mais parte disso, estou aposentada, aproveitando a vida, só digo isso – esquivou-se.
Alguns de seus primeiros sucessos, todos catalogados, incluem as edições Country Clube Dance (um vestido longo de festa branco com listras douradas), From Nine to Five (um vestido midi azul que vinha com um colete e um lenço para o cabelo bordados) e Debutante Ball (um vestido de debutante verde-água com uma estola de pele).
Spencer se inspirava na cultura que a rodeava. Quando os exercícios de ginástica de Jane Fonda viraram mania nos anos 1980, Barbie ganhou um collant roxo e polainas. Quando as missões do ônibus especial da Nasa estavam a todo o vapor, Barbie virou astronauta.
Os estímulos também vinham de sua própria vida. Quando precisou de uma biópsia no seio, Spencer ficou hipnotizada pelos jalecos brancos usados pelos médicos. O resultado da biópsia foi negativo, mas, para a moda, foi positivo. Adivinhe quem virou, mesmo que por um breve instante, uma cirurgiã?
Há centenas e centenas de modelos originais de Carol Spencer, mas apenas uma pequena parcela levou seu nome. Até a metade da década de 90, a Mattel não divulgava o nome do estilista na embalagem da boneca.
Spencer, no entanto, se lembra de cada uma de suas criações e muitas delas estão em sua casa. Mas, apesar de Spencer não passear tanto hoje em dia e de depender de um andador para dar pouco mais do que alguns passos, ela garante estar cercada de boas companhias.
– Você nunca está sozinha quando janta em minha casa. A Barbie está sempre com você – concluiu.
Por Katherine Rosman