Foto: arquivo pessoal
Ana Kaminski, 38 anos, queria ser mãe. Mas a orientadora educacional não demorou a descobrir que ela e o marido, Fabiano de Souza, não conseguiriam ter um filho sem recorrer a uma clínica de fertilidade. Fizeram uma, duas, muitas tentativas. Então, decidiram investir em um sonho ainda mais antigo: adotar. A seguir, Ana conta como eles se tornaram pais de três irmãos, Stefany, cinco anos, Erica, 11, e Vitor, 12.
"Foi muito bom saber que agora ninguém separa esta família"
Cresci com minha mãe dizendo que gostaria de adotar uma criança. Com o passar dos anos, esse também foi sendo um sonho meu. Com o nascimento do meu primeiro afilhado, percebi que a hora de ser mãe estava chegando cada vez mais perto. Era muito amor por aquela criança, hoje com 15 anos. Naquela época, eu já tinha encontrado alguém que compartilhava comigo esse sonho e resolvemos que era hora de conversar sobre o assunto. Falávamos muito sobre paternidade e adoção. Éramos muito jovens ainda, mas descobrimos que, devido a uma deficiência genética, meu marido só poderia ser pai por meio de uma injeção intracitoplasmática de espermatozoides (ICSI). Nunca vou me esquecer de seu pedido de desculpas na sala de recuperação, ao fazer tal descoberta depois de uma pequena cirurgia. Foi um período muito difícil de nossas vidas. Resolvemos seguir com a ideia da adoção e entramos na fila em 2007.
Em 2008, mudamos para Santa Catarina em busca de uma vida melhor. Deixamos nossas famílias, nossos amigos, nosso afilhado/filho, mas precisávamos tentar. Por força do destino, conheci uma clínica de fertilização. Descobrimos que havia uma possibilidade para nós. Com a ajuda de nossos pais, fizemos a primeira tentativa. Foi com muita alegria que recebemos a notícia: sim, eu havia engravidado! Foi mágico! Sonhei, planejei, esperei e desmoronei na quarta semana. Tive cólicas horríveis e soube que alguma coisa estava errada. Fiz exames e, sim, houve um aborto. Como eu havia congelado meus embriões, mesmo sem fazer nenhum exame mais específico, tentamos mais uma vez, e mais outra, mais outra e nada... acabou o sonho e o dinheiro.
Passados quatro meses, resolvemos procurar outro médico e fiz uma bateria de exames. Descobri que tenho problemas na coagulação do sangue e, assim, tenho risco de eclampsia na gravidez. Usei a medicação adequada, fiz a fertilização dos óvulos, fiz a inseminação e tentei. Nada. Muito sofrimento, mas, desta vez, nós estávamos mais tranquilos, pois sabíamos que tínhamos tomado todas as precauções. Estávamos mais maduros e também conscientes de tudo o que tínhamos feito até ali.
E aí vem uma pergunta importante: onde ficou o sonho da adoção? Correndo em paralelo. Nunca abandonamos nosso desejo de construir nossa família e dar carinho e amor para quem, por motivos diferentes, não teve. Mas, e agora? Resolvemos rever nosso perfil e atualizar nosso cadastro. Fomos atrás de tudo que estava travando nossa adoção.
Recomeçamos. Em 2013, oficializamos nossa união, que já durava 14 anos, e fizemos disso o ponto de partida para novos planos. Reestruturamos nossa empresa, organizamos nosso lado emocional e viramos aquela página. Acreditamos que nada na vida acontece por acaso: ou te faz feliz ou te ensina.
Em 2014, conseguimos uma autorização para realizar o curso de adoção fora da nossa comarca e, nesse processo, conhecemos uma psicóloga especializada em adoção de crianças maiores. Acho que Deus a colocou nas nossas vidas. Na primeira reunião do grupo de apoio à adoção, nos conhecemos e construímos uma amizade sincera. Temos contato com alguns dos participantes até hoje - e praticamente todos já adotaram. No primeiro dia depois da reunião, de volta para casa, conversando com meu marido, avaliamos quais seriam nossas mudanças de vida se tivéssemos um bebê (nosso perfil na época). Naquele momento, começamos a pensar que talvez não fosse para isso que estávamos preparados. Conversamos muito, tivemos medo, contamos com o apoio da nossa família, em especial da minha mãe, que me escutava por horas diariamente.
Resolvemos ampliar nosso perfil e aceitar irmãos, dois a princípio com idades de zero a 13 anos. Tivemos receio, é claro, mas nunca deixamos de ter fé em Deus de que poderíamos contar com nossos amigos e familiares. Para nossa surpresa, ao final do curso, já tínhamos nos apaixonado por um trio, mas eles seriam encaminhados para São Paulo.
Três semanas depois, recebemos uma ligação dizendo que a família de São Paulo havia desistido por ser longe. Eles seriam separados, e a menina do meio já tinha pretendentes. Eram dois agora, e teríamos de manter contato entre eles. Aceitamos no ato! Fomos visitá-los, e foi diferente daquilo que eu imaginava. Estávamos nervosos, ansiosos, temerosos, mas muito felizes. Recebemos amor, carinho, mas, juro, não deu o estalo na hora. Aconteceu depois, com o tempo, depois da primeira visita, depois da primeira noite em casa, depois da primeira febre, da primeira birra. Aconteceu assim. Mas faltava alguma coisa. Faltava alguém. Faltava aquela menina grande que esperava a irmã menor sair do colo da mãe para pular no colo também. Faltava aquele olhar dizendo "me leva junto?". Eu morria cada vez que levava dois e deixava uma sozinha.
Até que um dia, depois de uma viagem, eu recebi a notícia. Ela não queria mais ser adotada pela outra família. Não tivemos dúvidas: pedimos a guarda dela também. Foi muito bom poder contar, abraçar e saber que agora ninguém separaria esta família. Passamos por muitos apertos depois disso, em função de todo o processo de destituição familiar que estava correndo em paralelo, mas contávamos com a ajuda de todo o pessoal da casa de acolhimento, assistente social, psicólogos, amigos, familiares e de nossa advogada. Todos foram muito importantes nesse caminho.
Temos pequenas vitórias hoje, dia após dia. Vamos aprendendo a ser pais, e eles, a terem uma família de verdade, onde precisam participar e colaborar para que tudo funcione e dê certo. Como eu sempre digo, somos um time que se ama, que precisa estar unido, mas que tem um treinador e um juiz.
Em maio, tivemos uma grande vitória. Recebemos a adoção e a certidão deles com nossos nomes, depois de dois anos e quatro meses. É bom demais poder escrever o nome deles e não lembrar do passado. Apesar de nunca termos escondido nada deles, é dolorido saber cada coisa por que passaram. Sei que dói neles também, mas a cada dia isso está sendo substituído por boas lembranças nossas. É o que vai ficar para sempre.
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