Na ficção, ela já deu vida à mocinha da novela de época, à garota sensual e até a uma sereia. Mas, na vida real, o papel preferido de Isis Valverde é o de mãe do pequeno Rael, que completa dois anos no final do mês.
– Para me sentir feliz e potente, era importante conciliar as duas coisas. Não me vejo abrindo mão de uma delas – defende a atriz.
Nas redes sociais, Isis é pura inspiração. Quem faz parte dos mais de 24 milhões de seguidores da mineira sabe bem: ela é a pessoa que acorda cedinho para praticar ioga (muitas vezes, com a participação de Rael). Vai fazer você querer largar tudo para passar uns dias em contato com a natureza. Mas também não titubeia ao dividir os dilemas da maternidade. Que, faz questão de dizer, não quer que seja perfeita.
– Temos que entender cada vez mais o que é a maternidade possível. Esse ideal construído não passa disso, um ideal, algo inalcançável – reforça.
Após a licença-maternidade, seu primeiro desafio foi interpretar a enfermeira Betina de Amor de Mãe. Na trama da TV Globo, que teve as gravações paralisadas no início do ano em razão da pandemia, a personagem de Isis enfrentou um relacionamento abusivo, tema que permeia o debate dentro e fora das redes sociais. Prevista para ir ao ar em 2021, a segunda fase do folhetim vai mostrar a profissional de saúde na linha de frente do combate à covid-19 – uma homenagem, revela a atriz, que exigiu preparação redobrada.
Enquanto as histórias de Amor de Mãe não retornam à TV, o público pode rever Isis como a Ritinha da novela A Força do Querer, que voltou a ser transmitida na faixa das 21h. No bate-papo com Donna, Isis recorda suas personagens e divide um pouco de suas inspirações.
Como foi retomar as gravações da novela? Lembrou, de certa forma, a volta da licença-maternidade?
Não tinha parado para pensar dessa maneira, mas é um pouco isso, já que ficamos grudados durante o isolamento. Desta vez, ele já está maior e temos outra relação. Sinto saudade de estar com ele, mas também amo trabalhar. É importante para o meu equilíbrio como mulher, é dar atenção ao que me faz bem. Sou uma mãe melhor por isso, por poder trabalhar, fazer o que gosto, conseguir conciliar tudo. A retomada das gravações foi boa. É especial rever os amigos, mesmo que agora não possamos estar todos juntos de uma vez como antes.
Você vive uma profissional de saúde na ficção, que estará na linha de frente do combate ao coronavírus. Como se preparou para essa fase da Betina?
Vai ser uma homenagem e um desafio. Esses profissionais estão na linha de frente, arriscando suas vidas para nos protegerem. Queremos exaltar esse trabalho. Tive contato tanto com pessoas que enfrentaram a doença quanto com profissionais que atuam na linha de frente para me ajudar na composição desse momento da Betina na história. Na novela, Betina sofreu com a agressão do ex-marido, realidade de muitas mulheres no Brasil, que têm medo de denunciar. Mulheres que passam pela mesma situação são sobreviventes. Betina sofria com um relacionamento abusivo, mas não queria contar para ninguém. E não dá para julgar. Quando a gente olha de fora, pode acabar julgando, falando que a mulher deveria denunciar, romper com essa situação. Mas não é assim tão simples. Para chegar na agressão física, normalmente, a vítima passou pela agressão psicológica e está fragilizada. Não é uma situação fácil. Foi importante levar essa questão para a tela porque o silêncio mata. Às vítimas de violência, o que eu digo (e a história da personagem também) é que elas não estão sozinhas, que há maneiras de se defender dessa situação e de sair dela.
Você está no ar em A Força do Querer. Como está sendo rever esse momento da carreira? Ritinha é bem diferente da Betina. Duas mulheres fortes, mas com personalidades distintas. Ritinha é uma sereia, dona de suas vontades, de sua verdade, uma mulher que age pelo instinto e que é sempre muito leal a si mesma. Betina é mais pé no chão, sempre cuidou da família, vivia um relacionamento abusivo. Aos poucos, vemos ela se tornar mais segura de quem é e de suas vontades. Na primeira exibição da novela, o público tinha uma relação meio passional com a Ritinha, justamente por seu jeito livre (risos). Muitas coisas mudaram, então tenho curiosidade para ver como essa relação se estabelece agora.
Conciliar maternidade e carreira é sempre um desafio para as mães. Como tem sido isso para você?
Tanto a maternidade quanto a carreira fazem parte de quem sou. Para me sentir feliz e potente, era importante conciliar as duas coisas. Não me vejo abrindo mão de uma delas. A experiência da maternidade é extremamente singular, cada mulher vive da sua maneira. Para mim, passa por conciliar maternidade e trabalho. Isso não quer dizer que tenha sido fácil no começo. Ficava preocupada, sentia saudade. Mas não era algo que me paralisava, que me fazia pensar em escolher entre estar com ele e a profissão. Depois da adaptação, recriamos nossa rotina para que tudo fluísse. Deu muito certo!
Em entrevistas após o nascimento do Rael, você falou sobre a diminuição da libido, a dificuldade de equilibrar sua vida conjugal após a chegada do bebê. Hoje, como está essa balança?
No começo, é mais difícil. Quando nasce um bebê, nasce uma mãe junto, e, às vezes, esquecem de olhar para essa mulher que está renascendo. Os hormônios estão uma loucura, vem o puerpério e todas as fases do começo da maternidade. As coisas não vão se encaixar no dia seguinte. É preciso tempo para assimilar as mudanças e se encontrar diante delas. Afinal, sou mãe e continuo sendo uma mulher com vontades, sonhos e desejos. Precisava entender como continuaria sendo eu mesma. Mas passou. Está tudo bem!
Você recebeu críticas quando viajou para um desfile e muitas pessoas questionaram sobre seu bebê ter ficado em casa, com seu marido. Como você percebe essa discussão sobre a divisão de tarefas hoje?
Me impressionou ainda haver cobrança do tipo: “Você está viajando e seu filho está com quem?”. Estava com o pai, que é quem divide comigo a responsabilidade de criá-lo. É importante rever essa ideia de que só cabe à mãe cuidar do filho, que só ela é provedora. O pai é tão quanto. É preciso também deixar que os pais sejam pais. Às vezes, a mulher acaba interferindo porque vê o pai agindo de uma maneira que ela não agiria, fazendo algo diferente da maneira que ela está acostumada. Isso só quer dizer que ele age diferente. É preciso criar espaços para os pais serem pais, entenderem que são tão responsáveis quanto as mães.
Você já falou também sobre o sentimento da “mãe cansada”. Como lida com isso?
Exercendo a maternidade que é possível, buscando equilibrar todos os pratos da melhor maneira, evitando me cobrar e me comparar. É um exercício diário de acolher o meu limite e entender que estou dando o meu melhor em tudo.
Você é referenciada como uma mulher de beleza natural. Mas já foi alvo de críticas por conta do tamanho de seus seios.
Gosto do meu corpo como ele é. Não acho que haja nada de errado. E, se quisesse mudar algo, não teria problema nenhum em fazê-lo. A liberdade está na possibilidade de escolha de ser como a gente quer, de buscar o que nos faz bem. Sendo algo que se queira, está tudo certo.
Você já falou que ganhou estrias após amamentar. A maternidade mudou a forma de aceitar o corpo?
As estrias fazem parte de mim, da minha história. Não tenho problema com isso. Estamos falando mais sobre as imperfeições que nos tornam quem somos. Estria, celulite... Tudo isso faz parte do nosso corpo. Não precisamos ter vergonha, ter que esconder. Aceitar o meu corpo veio com a maturidade, com o processo de me acolher e de aceitar o que me compõe. Não acordo todo dia me achando linda. Mas, nesses dias, acolho, entendo e deixo que passe. Um dia de cada vez.
Sou uma mãe melhor por poder trabalhar, fazer o que gosto, conciliar tudo.
ISIS VALVERDE
atriz
Ano passado, uma foto sua amamentando Rael virou notícia em um portal com uma chamada sexualizada. Você cogitou apagar a imagem, mas desistiu após receber apoio. Como percebe esse momento de união feminina?
Muito positivo e extremamente importante. Somos mais potentes juntas. Cada mulher tem seu espaço. Não precisamos competir. Podemos sair desse lugar que somos ensinadas a normalizar desde a infância.
O caso acabou tornando-se um incentivo à amamentação.
Fiquei tão chocada que não via como tirar algo positivo. Mas aí tantas mulheres me apoiaram, falaram que a amamentação é algo natural. Que precisamos parar com essa sexualização do corpo da mulher. Essa é a potência da união: a possibilidade da troca e da mudança.
No livro de poemas lançado no ano passado, Camélias em mim, você versa sobre temas como a gestação. Como foi mostrar essa outra versão sua?
É uma coletânea de poemas que escrevi ao longo de 10 anos. A paixão pelas palavras é quase uma herança de família. Para mim, se tornou uma maneira de dar sentido às coisas ao meu redor. Sempre me deu um frio na barriga pensar em mostrar essa parte tão íntima para o público. Mas chegou o momento em que quis dividir. O público me abraçou, me acolheu.
A maternidade também foi inspiração para seus poemas?
É uma experiência transformadora. Não havia a possibilidade de vivê-la e continuar sendo a mesma pessoa. Também não deixei completamente de ser quem eu era. Em muitos aspectos, continuo a mesma. Mas, em outros tantos, estou diferente. É um sentimento complexo, construído dia a dia com meu filho e também com as pessoas ao meu redor. Porque passamos a ter uma dinâmica diferente até com os outros. A maternidade não é estática. É uma experiência que vai mudando a cada fase da vida. Estou tentando aprender a ter paciência – sou uma pessoa ansiosa – e estar presente para aproveitar cada momento.