Sim, logicamente é um clichê dizer que a maternidade transforma uma mulher, mas, no caso de Rafa Brites, essa mudança ocorreu em frente aos olhos do público. Desde o nascimento de Rocco, que completa um ano e quatro meses neste fim de semana, nada mais é como antes. De um momento para o outro, as noites a sós com o marido, Felipe Andreoli, viraram plantões na madrugada. As fotos de biquíni nas redes sociais foram substituídas pelas da gravidez (quando diz que “enfiou o pé na jaca” na gestação e engordou 25 quilos) e depois por pés gordinhos de bebê. Os looks superproduzidos não deixaram de aparecer, mas os posts que mostram suas olheiras ou falam da dor de amamentar são os mais populares. Vida real, né, mores?
Com passagens por programas como SuperStar, Mais Você e Vídeo Show, a repórter da TV Globo conquistou quase 1,5 milhão de seguidores no Instagram com esse diálogo franco e direto. Seus insights sobre a criação do filho lhe renderam o convite para ser colunista na revista Crescer. Também o nascimento de Rocco a levou a pensar em como fazer sua parte por um mundo mais igualitário no futuro. Passou a estudar feminismo, faz reflexões sobre consumismo e está pesquisando autoconhecimento para escrever um livro – não raro, faz posts dando dicas de suas leituras, como O Músculo da Alma, de Nuno Cobra Jr, e Poder Sem Limites, de Tony Robbins. Aliás, neste fim de semana, ela está em Paris fazendo um curso sobre autoliderança.
Com 30 anos, formada em administração de empresas, esta gaúcha de Porto Alege, dona de uma personalidade extrovertida, mostra momentos da rotina em família e dá entrevistas com a mesma naturalidade de quem grava um Stories de pijama.
Você parece ser ligada no 220V e está sempre fazendo mil coisas além da TV. O que move a Rafa fora do ar?
Tenho muitos projetos pessoais e profissionais. Adoro escrever, sempre fui do texto, lembro que, quando fiz vestibular, tirei 10 na redação. Estou escrevendo um livro. Hoje em dia a gente tem tantas plataformas para se expressar… Vou falar sobre autogestão, sobre como você se planeja para viver de acordo com os seus valores e seguir seus sonhos, chegar a seu objetivo de vida e seus valores. Vou fazer um curso na Oxford University sobre esse assunto, estou nessa vibe. Agora, estou estudando. Minha pilha de leitura está uma coisa gigantesca. Quando estava grávida, eu enjoava ao ler. E até o Rocco fazer um ano também não conseguia ler, por falta de tempo, então está acumulado.
Seu Instagram está com quase 1,5 milhão de seguidores, e são muito fiéis. A que você credita a identificação dos seus fãs?
Acho que muitas pessoas se identificam comigo porque sou sempre muito verdadeira. Estamos vivendo uma época em que as redes sociais dão uma falsa sensação de proximidade com as pessoas. A TV É mais distante. Só que essa proximidade também não é real. Ninguém ali posta suas brigas familiares, seus problemas… Eu tento, na medida do possível, mostrar meu lado cidadã. Me esforço para ser verdadeira. Falo sem filtros sobre a maternidade. Foi isso que chamou a atenção das pessoas. E não é desamor pelo filho, nada disso, é uma coisa que estava romantizada. Você não pode falar que está exausta por causa do filho? Vi que muitas mães se identificaram. Tem famosa toda maquiada na capa da Caras apresentando o bebê. E vou lá aparecendo com olheira, cansada ou dormindo... Escrevi sobre isso um dia, estava segurando o filho no colo, toalha, brinquedo, tudo ao mesmo tempo, me vi passando pelo espelho. Fiquei orgulhosa da mãe que eu me tornei.
Como surgiu a ideia de compartilhar seus momentos como mãe nas redes sociais?
Aconteceu ao acaso. Na minha gravidez, não falei muito do assunto. Meu primeiro post sobre o tema, um verdadeiro boom, foi o aquele em que contei que saí de casa com um elástico para o cabelo e veio a cartela do negócio todo junto. Fui para a consulta com a médica, revisar os pontos da cesariana e tal, até que notei que estava com um elástico preto e um verde e um rosa pendurados no cabelo. É uma coisa tão pequena, mas que representa tanto!
E aí depois disso você seguiu contando sobre dificuldade de amamentar, dormir...
Sim, de tudo. E tem o que eu chamo de “amor escatológico”. Por exemplo, eu sempre fui muito de ver vômito e ficar enjoada, mas agora sou aquela que troca a fralda e depois já está limpando o nariz com a mão. Tenho mais nojo de coisas minhas do que de bebê (risos).
Conta um pouco para a gente como foi o seu parto?
Esperei romper a bolsa e entrei em trabalho de parto. Depois de 20 horas tentando que o Rocco saísse, ele já estava quase coroado, mas não passava, estava meio na transversal. Então fiz uma cesariana, por segurança. Não foi um drama, tudo é válido. É válida aquela corrente que engravida e marca cesariana, a que quer comer placenta… Acho que “parto humanizado” é o que deixa a mãe confortável. Há muito julgamento em cima das mães.
A mulher tem que ter a liberdade de escolher. Claro que existe o que é mais saudável ou não, mas não é justo a gente querer mandar no corpo das outras. Cada um, cada um. Nosso mundo está muito nichado e polarizado, as pessoas cada vez mais se fecham com isso. Tem toda uma cobrança, como a mãe cujo leite secou se sentir menos mãe.
Antes de ser mãe, você disse que pensava várias coisas diferentes do que pensa agora.
Muitas, muitas mesmo… Eu já fiz um texto com desculpas retroativas. Porque é muito fácil falar das atitudes alheias quando você não é mãe. Via no restaurante criancinha com celular e tablet para ela parar quieta, aí eu pensava: “Nossa, o que custa dar atenção ao bebê?”. Mas um dia você é mãe e quer apenas tomar um cafezinho, não dá para tomar café frio, então vai lá e na hora da sobremesa deixa o filho se distrair com o telefone um pouco. Apoia no saleiro da mesa e tem festa de galinha, de palhaços... Cada um sabe o que faz, vamos ajudar mais e julgar menos.
Por falar em ajuda, também se fala bastante de que o marido não tem que “ajudar” e, sim, “dividir” a criação. Como é essa divisão com Felipe em casa?
Não existe uma divisão combinada, eu sempre falo isso. A gente tem esse pensamento de que pai que troca fralda é o paizão, mas não. Está fazendo o básico. Tem que ser orgânica a coisa. Temos um comportamento muito machista na sociedade que é atrelar a educação somente às mulheres. “Tua mãe não te deu educação.” Isso também acontece quando alguém fala que a mãe precisa criar seu filho homem para não ser machista. São os pais que criam os filhos. É também maravilhoso para os homens que conquistam um lugar de sentimento e afeto. O pai precisa poder chegar no trabalho dele e dizer que o filho está com febre. Também precisa ter uma licença-paternidade maior, é pouco o que se tem. A melhor forma de ensinar é pelo exemplo.
Na sua família, como era quando você era criança nesse aspecto?
Meus pais vivem aí em Porto Alegre, estão juntos há 50 anos (Potiguara, 71 anos, e Maria do Hoto, 64). Meu pai era uma exceção para a época. Minha mãe era advogada e abriu mão da carreira para cuidar dos filhos. Eu tento não falar em “pai participativo” porque ninguém fala “mãe participativa” ou “minha mulher me ajuda muito”. Eu tento mudar isso, para não repetir os padrões, para mudar o mindset. Mas é louco pensar que meu pai foi um pai presente quando eu era criança. Sempre foi um paizão, mas também viajou muito a trabalho. Nunca tive conflito com meus pais, sempre fui uma filha tranquila.
Sua relação com seus pais mudou depois que seu filho nasceu?
Sim, com a minha mãe a relação mudou totalmente depois do Rocco, principalmente o sentimento de gratidão por tudo o que ela fez, a maneira como nos criou, a dedicação, a educação. É maravilhoso. Pena que a gente só tem filho quando é mais velho, porque seria demais se essa consciência viesse mais cedo. Meu filho ainda é muito pequeno, até agora só dormiu uma única noite inteira (risos). Ele é fofo, carinhoso. A gente quer o segundo filho, com certeza, mas ainda estamos curtindo o bebezinho. Sério, adoro ter irmãs, é uma das grandes alegrias da minha vida. Eu e o Felipe temos tanta atividade com nossos irmãos! Irmão é alguém para poder falar sobre seus pais, dividir atenção e também amor.
Como você define sua atuação no feminismo hoje?
A Tainá (Muller) me chamou pra entrar em um grupo em que estudamos o feminismo, a história da mulher… Lá, vemos várias coisas que a gente não percebe, então é quando começamos a tomar consciência de certas situações. Vejo que muitas pessoas têm preconceito com feminismo, dizem que é “a luta das mulheres contra os homens”, mas isso não tem nada a ver. É a luta pelos direitos iguais. Eu sou assim, sou uma ativista no sentido de que não deixo passar. As pessoas apenas repetem padrões, fazem comentários sem pensar no que isso acarreta na vida de todos. Nesse nosso grupo tem muitas mulheres, são atrizes, roteiristas etc. Nós nos encontramos uma vez por semana, tem a Márcia Tiburi e a Djamilla Ribeiro, uma fonte rica de conhecimento. São mulheres interessadas em saber mais sobre o assunto.
Sempre que você fala nesse assunto, aliás, seu Instagram bomba, né?
Sim, nos últimos tempos o que mais repercute é o conteúdo. O meu post do Dia da Mulher foi o de maior repercussão dos últimos tempos. Eu disse algo como: “Não precisamos que você pague a conta ou puxe a cadeira…” Meus textos têm mais curtidas do que foto de biquíni, isso é muito impressionante. Quando eu escrevo, tem três vezes mais repercussão do que uma foto. Isso me deixa muito feliz porque as pessoas que me seguem procuram muito o meu conteúdo, foi uma surpresa muito grata. E as fotos produzidas, por exemplo, faz as pessoas me verem com distanciamento. Meu público gosta de me ver ao natural. Nossas palavras vão atingir muitos milhões de pessoas, então tenho que ter responsabilidade.
Outro tema além do feminismo que você aborda é o consumismo, seu último post teve bastante repercussão. O que a motivou a falar disso?
O mundo tomou um rumo muito invertido. Ter uma pessoa bem-sucedida na família, tipo um primo que virou professor federal, ele não é considerado sucesso. A prima que é rica é considerada “sucesso” seja lá como ela chegou lá. O ser humano perdeu a noção das coisas. Entramos numa loucura de acumulação e ostentação, e a gente trabalha muito para sustentar esse padrão e quer trabalhar muito para ostentar o supérfluo. A pessoa trabalha para ter a bolsa para mostrar para o outro para, no fim das contas, ser amado. São as aparências. Há uns dias, fui no aniversário de uma amiga minha no Rio, estaria cheio de gente famosa, eu vi que não ia dar tempo de me arrumar. E todo mundo de paetê, era para ir arrumada... Estava de tênis, calça e camiseta. Fui mesmo assim.
Sim, o importante para você era ir e pronto...
Anos atrás, eu não iria ao encontro assim, pois ficaria insegura. Questiono essa necessidade que as pessoas têm de apresentar aos outros o que elas têm de posses, e não o que elas são. Lógico que trabalhar é importante, ganhar dinheiro é importante. O que eu já paguei em bolsa e sapato… Nossa, eu já paguei bolsa que podia ser um ano de escola! O que acontece é que, sim, a gente pode comprar marcas nacionais maravilhosas, bolsas e sapatos, inclusive os do RS são maravilhosos, e essas empresas contratam artistas para fazer suas campanhas. Mas aí essas celebridades não usam a bolsa brasileira, e sim a francesa. Tem que estar com etiqueta para se mostrar. O meu valor não está aí. Tem que pagar um preço justo pela coisa. Uma Birkin, uma Hermès, não precisa pagar 30 mil nisso. Com esse mercado do hiperluxo, a gente perde a noção da realidade. E a maternidade traz também essa lucidez, como ao ver uma criança pedindo dinheiro. A gente só pode ter vergonha de consumir o supérfluo de maneira tão inconsciente e com descaso. E sempre querendo ter mais. Não é por aí.
VIDA EM FAMÍLIA
Casada desde 2011, Rafa volta e meia faz posts falando sobre como é necessário ter períodos a dois, apenas para namorar, sem cobrança.
– Acho importante o casal tirar um tempo para si, tanto para nutrir a relação quanto a da família como um todo.
Um dia, às vésperas de fazer a primeira viagem sem o filho, a jornalista fez uma enquete nas redes sociais sobre o assunto. Das 157 mil respostas à pergunta sobre as escapadinhas a dois, 98% das pessoas disseram que “sim”, era preciso.
– Confesso que isso me aliviou. Lembrei também dos meus pais, com três filhas, que estão há 50 anos juntos dando as escapadas de casal. No avião, na ida para a viagem, nós dois já planejamos a festinha de um ano do Rocco. E na chegada ao local, no táxi, já começamos a abrir as fotinhos pelo celular.
Rafa escreve...
...sobre carreira e maternidade
“Eu tenho tentado fazer das despedidas algo alegre e me esforço para não transferir para ele minhas questões de culpa (ainda estou trabalhando nisso, pessoal, é um processo!). Sempre falo sorrindo e alegre: ‘Filho, a mamãe está indo trabalhar. Olha que bacana, a mamãe adora trabalhar!’. De fato, é tudo verdade. Eu amo o que faço, apesar de ficar ainda dividida nessa minha escolha. Sim, é uma escolha. E hoje tenho a consciência do trabalhão que isso dá.”
...sobre o pai
“Confesso que, antes de ser mãe, eu tinha preconceito com as mulheres ou (que bacana poder dizer isso nos dias de hoje) homens que desistiam da carreira para cuidar dos filhos. A minha própria mãe fez isso. Lembro que um dia desses olhei para o meu pai (que é e sempre foi um paizão, mas também viajou muito e trabalhou fora) e falei: ‘Nossa! Eu achava que era você que dava duro nessa casa, mas agora entendi que quem ralou mesmo foi a mãe, cuidando das três filhas (risos). Te amo, papi’.
...sobre a mãe
“Lembro de estar sentada amamentando meu filho, nos primeiros dias de vida dele, observando minha mãe correndo pra lá e pra cá, me trazendo chá, prendendo meu cabelo com uma presilha. Olhei para ela como nunca havia olhado. Era quase como se eu tivesse que dizer: ‘Oi, prazer, agora sei quem é você’. E assim, diariamente, reconfiguro tudo e a todo instante.
Felipe Andreoli escreve...
...sobre Rafa
“Nunca entendi a supremacia dos homens em relação às mulheres. Lá em casa nunca foi assim. O jeito que aprendi a lidar com elas nunca foi com ar de superioridade. Talvez porque minha mãe educou brava e fortemente dois homens. Homens que respeitam as mulheres. Como seres humanos. Como iguais. A mulher da minha vida também é assim. Uma mulher que lidera e conduz nossa casa, nossa vida familiar. A profissional dedicada. Alguém de bem com a vida. Um ser humano incrível. Pessoas incríveis devem ser celebradas, homens ou mulheres. Como iguais.”
Rafa está escrevendo um livro e escolheu Porto Alegre para dar sua primeira palestra: no dia 30 de junho, às 15h, a gaúcha irá falar sobre “Transformando sonhos em realidade”, na Casa Camaleão (Giordano Bruno, 82).
Ela irá compartilhar suas experiências e ferramentas para ajudar as pessoas a estarem alinhadas com seu própósito de vida. Inscrições a R$ 100, com renda revertida para a ONG Projeto Camaleão. Faça sua reserva pelo e-mail contato@projetocamaleao.com.
Leia mais:
:: Pesquisa mostra como, para muitas mulheres, ainda é difícil conciliar filhos e metas profissionais