Caixa de fósforo vira pandeiro, as palmadinhas marcam o ritmo e dá vontade de se levantar. Eu, que nunca fui dessas cadências, de repente me ponho a mexer os quadris, desajeitada, feito uma gringa com vontade de chegar lá.
Da infância vem a memória de Benito de Paula, cantando triste e bonito, “ensaiei meu samba o ano inteiro, comprei surdo e tamborim, gastei tudo em fantasia, era só o que eu queria, e ela jurou desfilar pra mim”. Eram os retalhos de cetim de algum Carnaval que não terminou bem.
Da adolescência, uma lembrança clássica. São quatro da tarde e ainda não almoçamos. Atracamos de barco em uma pequena enseada catarinense e, de biquíni e calção de banho, entramos cantando Trem das Onze, de Adoniran Barbosa, em um restaurante de pescador. Somos 10 e o bloco é bem recebido, com a condição de não parar de cantar. Vieram os peixes, a cerveja e ficamos lá até a hora do jantar. “Faz caringundum, faz caringundum” – e eu ainda sou aquela foliã.
Como é que é, my friend, Charles? Oba, oba, lá vem ela, estou de olho nela. O que é que quero mais, se eu sei que a vida é breve e linda? Alegrando os meus dias com seu samba funk, ele ainda era apenas Jorge Ben. Benjor, só quando fiquei maior.
E o Rio de Janeiro continuava sendo, o Rio de Janeiro fevereiro e março, alô, alô, Realengo. Para contrabalançar o entusiasmo de Gil, eu abria alas para um Chico Buarque sussurrante: “eu faço samba e amor até mais tarde, e tenho muito sono de manhã”, mas acho que samba, mesmo, só havia no título da canção, ou também pode ser samba aquilo que não se dança?
O mestre da elegância: “eu sou assim, quem quiser gostar de mim, sou assim”. Na voz de outro, poderia soar besta, nunca na de Paulinho da Viola. Enquanto isso, uma turma alegre batucava em algum sítio baiano, “besta é tu, besta é tu” e eu achava a maior graça. Por que não viver, se não há outro mundo?
“Ela é meu treino de futebol, ela é meu domingão de sol, ela é meu esquema”. Ela quem? Virei uma adulta que ora sonhava em ser musa inspiradora, ora se compadecia com a dor de Luiz Melodia: “mais um Carnaval que passou, mais uma vez minha escola não ganhou”. E aí?
“E aí, a gente vai passear, e aí, a gente vai namorar, e depois...”. É Seu Jorge me seduzindo, me fazendo trair as guitarras. Não fosse os Beatles, teria sido eu uma cabrocha?
Ainda sou do rock e o samba é um infiltrado na minha playlist. O Cabide, de Mart´nalia, pergunta se tenho atitude e se vou encarar, e a resposta é o Amor em Jacumã, de Lucas Santtana, que me faz tentar mexer os quadris, outra vez, e chegar lá. Mas cheguei apenas até aqui, nesta tentativa acanhada de jogar confete no Brasil e de mostrar que não sou uma filha totalmente perdida: também acho, Caetano, que sem samba não dá. E salve Beth Carvalho.