“Você pode ser um presidente, pode ser o que for, mas sempre será uma pessoa como outra qualquer”, diz Pepe Mujica no excelente livro O Horizonte, que reproduz quatro longas conversas entre ele e Julio Sanguinetti, também ex-governante do Uruguai.
Sei, é uma obviedade, não merece um “extra! extra!”. Entre mim e Julia Roberts, por exemplo, a diferença é apenas alguns milhões no banco e um rostinho bonito (não preciso dizer a favor de quem). No mais, somos duas mulheres que trabalham, têm filhos, se angustiam, se divertem, se atrapalham, envelhecem, resmungam e refletem sobre o sentido da vida. Existe alguma grande diferença entre mim e ela, e entre nós todos?
Pareço forçar a barra ao destacar uma frase banal como se fosse uma descoberta bombástica, mas o fato é que as pessoas esqueceram mesmo desse pequeno detalhe: somos todos insignificantes, poeira cósmica. Não há razão para se apresentar aos outros dando palestra sobre os próprios feitos. A quem considera que temos alguma especificidade e nos elogia publicamente, agradecemos, muito obrigada, mas é reconhecendo o que há de mundano em nós que minimizamos o vexame de se achar mais e melhor que os outros.
Não é preciso ser tão franciscano como Mujica, que se isolou num sítio e dirige um fusquinha. Somos todos frutos da sociedade de consumo e da era digital. Satisfazemos nossas necessidades, não só as básicas, mas também as supérfluas, e procuramos fugir da invisibilidade, valorizando nosso trabalho a fim de vendê-lo, óbvio, e reafirmando nossa identidade de tempos em tempos, seja através do convívio social ou de postagens virtuais. O que nos falta, então? Moderação.
Perdeu-se o senso crítico. Estamos em meio a um massacre egoico. “Eu sou mais eu”, “eu posso tudo”, “eu sou gostosa”, “eu sou fodão”, declarados em caixa alta por pessoas independentes e empoderadas, que, por um lado, ajudam outras pessoas a reconhecerem o próprio valor. No entanto, a vaidade excessiva encobre frustrações e faz um barulho estridente.
Conexões silenciosas surtem mais efeito. O silêncio da respiração, da escuta, da leitura. O silêncio da meditação, da reza, do mantra, da humildade. A suavidade da voz que pergunta mais do que responde, que incentiva mais do que critica. O som da música, o som das folhas nas árvores e da correnteza do rio, o som camuflado dos suspiros. O som da paz, em detrimento dos alto-falantes. É outro tipo de vaidade: satisfazer-se com o eu mínimo, que é enorme. Credenciais, cargos, títulos e prêmios são penduricalhos, guizos que chamam a atenção para o lado de fora de nós. Atraem, mas não nos diferenciam.
Extra, extra! Pessoas como outras quaisquer, é o que somos. Sem motivo para entrar em pânico: ainda assim, continuamos únicos.