Vou contar uma história que já foi contada várias vezes pela própria protagonista — busque no Google para escutar com as palavras dela, mais exatas. Irei me apropriar, usando as minhas.
Trata-se da querida atriz Mônica Martelli, que passou muitos anos da sua vida profissional fazendo papéis minúsculos em novelas e programas de humor, sem oportunidade para decolar. Recebendo apenas uma fala, ou duas, mantinha-se despercebida, mesmo sendo linda e medindo mais de um metro e 80. Já não era uma adolescente, e sim uma balzaquiana a caminho dos 40 anos, e começou a ficar aflita: será que nunca vou ter a chance de mostrar o meu talento?
Até que um dia, durante um desabafo com a mãe, recebeu o conselho que mudaria sua vida: "Minha filha, não fique esperando que alguém faça algo por você. Levante-se desse sofá, coloque um caixote no meio da praça, suba nele e dê o seu recado".
Mônica não perdeu tempo. Voltou para casa, abriu o computador, escreveu um texto para teatro baseado em suas desventuras amorosas, batalhou por uma pequena sala de teatro, pediu ajuda aos amigos na divulgação e estreou um monólogo enxuto chamado Os Homens São de Marte e é Pra Lá Que Eu Vou. Fico tentada a terminar este parágrafo com a frase "nascia uma estrela", mas a Mônica não merece um clichê tão preguiçoso.
Preguiça é um bom assunto para este início de ano. Depois de um 2023 em que o mar bateu em portaria de prédios, bairros afundaram, enchentes invadiram casas e o calor matou em meio a um show, depois de um 2023 com guerras insanas lá fora e com milicianos barbarizando aqui dentro, depois de um 2023 em que a estupidez atingiu o seu apogeu, banalizando-se entre estranhos, chegamos aqui emocionalmente exaustos. Sem estímulo, sem esperança. Começar 2024 por onde?
Fico tentada, de novo, a dizer o óbvio: comece pelo caixote e ignore um pouco a caixinha eletrônica que virou extensão do seu braço e com a qual persegue-se likes, sem se levantar do sofá. Subir em um caixote é um movimento radical, interrompe o fluxo da multidão que caminha com a cabeça abaixada. É um obstáculo que as pessoas serão obrigadas a contornar, enquanto te xingam: "está pensando que é quem?". No entanto, algumas delas pararão para ouvir quem você pensa que é. O caixote é a superação da sua vergonha, da sua descrença em si mesmo, daquilo que você até ontem chamava de "pagar mico".
Estava na cara que este texto daria nisso, na exaltação de uma atitude que promova guinadas, que nos salve da letargia diante de um mundo que parece sem conserto. Mas o caixote vem na sequência da história, antes dele aconteceu algo que realmente transformou tudo.
Afinal, começar por onde, em 2024? Escute quem te ama.