Redes sociais. Venho percebendo que minha estafa vem também desse lugar. O cansaço não é proveniente apenas do excesso de compromissos, mas do movimento de uma única parte do meu corpo: o dedo indicador que conduz, na vertical, a rolagem das postagens do feed, e na horizontal, a sequência de stories. Um único dedo promovendo a anarquia destrutiva dos sentidos. Em um minuto sinto compaixão, e no outro, cobiça. Um minuto de informação, e no seguinte, espanto. Sentimentos fragmentados pelo vício em consumir tudo sem sentir o gosto.
É o fim da experiência completa. Apenas caquinhos de um universo craquelado. O domínio sobre o aparelho em nossas mãos tornou-se ilusório diante da ansiedade crônica: queremos mais e mais deste quase nada com filtro.
Pílulas de sabedoria, edição de programas, pedaços de podcasts, frases soltas, conhecimento mastigado. Tudo muito prático, uma bandeja de aperitivos. A integralidade ruiu. A vida rarefeita vai passando pela janela do celular em rapidez supersônica, como as cenas do clássico Koyaanisqatsi, filme que há 40 anos já denunciava o nosso colapso diante da pressa.
Alta velocidade gera adrenalina, mas também desespero: a que momento surgirá o muro contra o qual nos chocaremos? O medo se mistura ao desejo de que esse muro exista mesmo e nos pare. Suplica-se por uma via de escape dessa ciranda frenética. De repente, a vontade é de não mais saber, não mais conhecer, não ser encontrado pelos sites de venda – interrupção do fluxo contínuo. Abandonar as redes seria uma opção de livramento, mas um suicídio metafórico: o sujeito desconectado será ainda considerado um ser vivo?
Olhos esbugalhados, sem piscar, para não perder nada do que acontece: me veio agora a cena aflitiva de outro clássico do cinema, Laranja Mecânica, em que o personagem Alex é impedido, por pinças metálicas, de fechar os olhos. O objetivo é fazê-lo se acostumar com o que ele não pediu para ver, até que ele perca o senso crítico e a profundidade, tornando-se mais um objeto a serviço dos interesses de quem detém o poder. E o poder tem nome. Dinheiro.
A impaciência tem sido um dos efeitos colaterais desse frenesi. Interrompemos a fala dos outros, amamos e odiamos por impulso e não conseguimos assistir a um reels até o fim. E assim, humilhados pela nossa própria inquietação, seguimos fazendo de conta que é possível se tornar mais sábio e atualizado, apenas acelerando o dedo indicador, enquanto reduzimos a zero nossa concentração. Quantos livros você leu este ano?
Sem coragem para desembarcar deste trem-bala, mantenho meus perfis operantes, já que a tecnologia facilita a divulgação do meu trabalho. Mas contra o esgotamento da alma, só a nostalgia me ampara.