Quando caminho pelas ruas da cidade, ou mesmo quando circulo de carro, reparo em pequenos pontos comerciais em reforma e penso: tomara que seja uma livraria, tomara que seja uma papelaria, tomara que seja uma galeria de arte, tomara que seja um bistrô, tomara que seja uma floricultura. Vou acompanhando a obra com expectativa, até que um dia os tapumes são retirados e, lógico: é mais uma farmácia.
Os laboratórios movimentam fortunas e estimulam o consumo de medicamentos de forma impulsiva e muitas vezes desnecessária. Remédio não é sorvete, não é banana, não é pãozinho. Mas o povo se acostumou a ingerir goela abaixo o que é sugerido sem receita e sem critério, e a indústria farmacêutica prospera.
Conversava outro dia com uma amiga endocrinologista e falávamos justamente sobre como tantas doenças poderiam ser prevenidas através da simples mudança de hábitos. Ninguém nega a importância de uma campanha de prevenção contra o uso do drogas, por exemplo, mas há um número ainda maior de pessoas se viciando em gordura, evitando legumes, se entupindo de refrigerante, não investindo em produtos orgânicos, abusando do sal, do açúcar e das frituras.
Esse é só um exemplo de como a falta de qualidade de vida pode adoecer e até matar. A causa de óbitos geralmente é infarto, câncer, infecção generalizada, falência múltipla de órgãos, mas algumas dessas doenças tendem a iniciar décadas antes, por meio de uma rotina de muito stress, ansiedade, angústia emocional e neuroses não tratadas. Negativismo, raiva, frustração, nada disso colabora com nosso metabolismo. É aí que pequenas atitudes podem fazer diferença, como praticar atividades físicas, buscar recursos para relaxamento (ioga, meditação, massagem), cultivar amigos, dormir bastante, usar filtro solar, cuidar da postura, beber muita água, controlar o peso, não fumar, não beber em excesso, fazer check ups periódicos - e não se drogar, lógico. Os médicos têm batido nessa tecla com insistência, mas ainda há quem considere esse blábláblá improdutivo ou politicamente correto demais.
Tem nada a ver com politicamente correto, e sim com inteligência. E inteligência não se vende em frascos.
Farmácias comercializam produtos de primeira necessidade. Sem elas, não teríamos acesso a medicamentos fundamentais para nossa saúde mental e física, devidamente prescritos, mas precisamos de tantas? Creio que teríamos uma sociedade bem mais saudável se a população contasse com muito mais pontos de venda de livros, sucos, flores, livros, discos, bicicletas, livros, frutas, bolas de futebol, raquetes de frescobol, instrumentos musicais, gravuras, livros, livros e, claro, livros.
**A colunista está em férias. Este texto foi originalmente publicado em 6 de fevereiro de 2011.