Eu estava dentro do avião e na fila de trás havia um cara que estava sendo muito bem tratado pela tripulação. Ligeiramente mais bem tratado do que os outros passageiros. O pessoal sentado no fundo da aeronave ia ao banheiro e, ao retornar pelo corredor, passava por ele, dava um tapinha leve em seu ombro e fazia joinha com a mão. Fiquei encasquetada. Olhei bem dentro dos olhos dele. Nem ideia. Devia ser algum jogador de futebol.
Quando atravessei o portão de desembarque, o motorista que segurava uma plaquinha com meu nome estava visivelmente contrariado por não estar aguardando o passageiro VIP que desembarcava junto comigo. Não resisti. Depois de me apresentar, indaguei a ele: quem é afinal aquele moço? O motorista me olhou como se eu estivesse chegando de Marte. Ué. O Durval.
Durval? Durval, Durval... Não estou associando o nome à pessoa.
O Durval Lélys!! Claro, o Durval Lélys. Coloquei minha mão na testa como quem pede desculpas por ser tão matusquela, mas o fato é que continuava sem a menor ideia de quem fosse, e devo ter dado bandeira da minha ignorância, pois o motorista resolveu dar uma ajudinha. É o Durval Lélys, do Asa de Águia. Aaaaaahh, tá. Obrigada. Agora está esclarecido.
Estávamos já dentro do carro quando o motorista, simpático, fez algum comentário sobre a alta temperatura daquela tarde e logo deu prosseguimento ao assunto. O Durval veio para o Fortal. Ai, meu santo padroeiro, aquilo não ia acabar nunca. O Fortal, sei, sei.
O Fortal está fazendo 25 anos! 25!!! Dá pra acreditar? – disse ele tão entusiasmado que quase deu uma palmada na minha coxa esquerda, a mais próxima dele.
Já desembarquei em Abu Dhabi, Bangcoc, Tóquio e nunca senti desamparo semelhante. O senhor vai me desculpar, venho de muito longe, de um lugar chamado Porto Alegre, o senhor poderia ser mais específico? Fortal é o quê? Ele deu uma risadinha orgulhosa. É o nosso festival de música. Ok, eu não era obrigada a saber. Entendi. Um festival de música patrocinado, provavelmente, por esse medicamento, o Fortal. Devia ser algum energético, uma vitamina. Fortal em drágeas, Fortal em gotas, sei lá eu.
Cheguei, finalmente, ao hotel. Entrei no quarto. Larguei minha mala. Fui até a janela e abri as cortinas. Vi aquele mar espetacular à minha frente. Suspirei. Eu estava em Fortaleza.
Em Fortal.
Que estúpida. Óbvio! As pessoas trabalham em Sampa. Passam férias em Floripa. A mulher do Carpinejar é de Beagá. E nós vivemos em Poa. Cidades têm apelidos. Na hora, não me dei conta. Por que deveria? Só porque havia acabado de chegar ao Ceará? Tá bom, me humilhe. Diga agora que sabe de cor todas as músicas do Asa de Águia e que reconheceria o Durval a quilômetros de distância.