A cada vez que estou fechando a porta de casa para ir ao aeroporto, dou uma espiada mais demorada para a sala e penso: será que voltarei?
Julho, mês de férias. Momento de se preparar para a melhor coisa do mundo: viajar.
Na verdade, as três melhores coisas do mundo são comer, dormir e transar (coloquei em ordem alfabética, não em ordem de preferência), mas é viajando que desfrutamos para valer desses três grandes prazeres da vida. Não há rotina, não há horários, ninguém está nos apressando. O que pode ser mais excitante?
Pois estava, dias desses, conversando com quatro mulheres que vivem em trânsito pelo mundo. Ainda que sejam contumazes viajantes, elas admitiram que, a cada vez que compram uma passagem, sentem um temor incômodo que não sabem de onde vem. Estranho, tendo elas tantas milhagens acumuladas, mas não me surpreendeu. Também fico meio aflita antes de embarcar para um destino longe demais do meu quintal. Por um motivo tosco, infantil: fico achando que vou morrer.
Uma amiga que mora no Rio tem esta mesma sensação. Já somos seis (as quatro mulheres da primeira conversa, minha amiga carioca e eu). Você também? Então está na hora de a gente formar um grupo de apoio e tentar entender o que acontece.
Não é um medo racional, um medo de que o avião caia, por exemplo. As chances de ele cair são mínimas. Neste exato instante há várias centenas de aviões cruzando os céus do planeta e nenhum deles estará na matéria de abertura do Fantástico neste domingo (uma madeira, pelo amor de Deus! - toc, toc, toc).
Trata-se de um desassossego, mais do que um medo. Viajar é abrir um parêntese na vida, escapar de um esquema já organizado, se predispor ao desconhecido - e se despedir de quem fica. A cada vez que estou fechando a porta de casa para ir ao aeroporto, dou uma espiada mais demorada para a sala e penso: será que voltarei? Nem preciso dizer o que sinto ao dar um beijo nos familiares e trocar mensagens com os amigos: por um fiapo de segundo me passa pela cabeça que é a última vez que estou falando com eles. Qual a razão dessa neura descabida, se algo tão maravilhoso está para acontecer?
Deve ser justamente isso. Dá a impressão de que não merecemos este algo tão maravilhoso, de que teremos que pagar por este extremo deleite, não em cash, mas em sofrimento.
Culpa, em outras palavras.
Já soube de gente que, ao chegar ao aeroporto, mudou de planos: deu meia-volta e retornou para casa. Ufa, me sinto menos louca diante desses casos perdidos. Eu embarco com inquietação e tudo, e assim que o avião aterrissa do outro lado, estou uma tonelada mais leve e completamente esquecida do que até então me perturbava. A inquietação se autoextravia.
Aliás, embarco hoje e volto para a coluna daqui a duas semanas. Sem despedidas, por favor.